Título: Parcerias Público-Privadas ideais
Autor: Marcus Quintella
Fonte: Jornal do Brasil, 06/12/2004, Outras Opiniões, p. A-11

Quando adjetivamos algo como ideal, estamos, na verdade, desenvolvendo apenas uma idéia ou imaginando aquilo que seja fruto de nossas aspirações. No caso das Parcerias Público-Privadas, popularizadas pela sigla PPP, isto caberia como uma luva, já que o conceito vem sendo amplamente discutido nas esferas acadêmica e política e, até hoje, não há um consenso do modelo ideal. Na realidade, busca-se incessantemente uma legislação que possa viabilizar as PPP, de modo que todos os parceiros envolvidos possam participar dos projetos em condições favoráveis e com transparência, probidade administrativa e espírito público.

As PPPs são as fontes de recursos mais conclamadas como solução para resolver os graves problemas de infra-estrutura do país, principalmente nos setores de transporte, habitação, energia e saneamento. Da forma como vem sendo discutido, o lado privado das PPPs executaria projetos intrínsecos ao setor público, realizando os investimentos e assumindo a responsabilidade pelas fontes de financiamento. Em contrapartida, o lado público das PPPs garantiria o retorno do capital do setor privado, no futuro.

Não há duvida alguma que as PPPs são muito importantes para o setor privado, que deverá ser seduzido pelo modelo, desde que haja regras claras e garantias financeiras e políticas convincentes e atrativas. Cabe ressaltar que, nas PPPs, por definição, prevalecerá sempre o interesse público e poderá ou não haver qualquer fluxo de caixa para o projeto ou este não apresentar viabilidade econômica suficiente para sua implementação. Outrossim, os parceiros privados devem assumir total responsabilidade pela conclusão e operação do projeto, nos termos definidos pelo interesse público, independentemente do mercado que esteja envolvido. Ademais, as PPPs não devem ser confundidas com as privatizações, pois os ativos públicos não são transferidos para o setor privado.

Em suma, as regras em discussão prevêem que o setor privado deverá realizar os investimentos necessários para implementar os projetos prioritários do governo, com recursos próprios ou de terceiros, cujos retornos ocorrerão no futuro, durante a operação dos mesmos. Será que esta seria a parceria ideal, num país com histórico inflacionário, reconhecida instabilidade política, sistema tributário injusto, volátil e ambicioso, administração pública altamente burocratizada, credibilidade judiciária duvidosa e corrupção generalizada?

Entendo que uma PPP ideal deva conter contrapartidas mútuas, com reciprocidades concomitantes e com os lucros de cada parceiro definidos previamente. Se nenhum banco do mundo, inclusive o BNDES, empresta dinheiro sem contrapartida e sólidas garantias, porque o setor privado o faria?

Penso que o sucesso das PPPs esteja vinculado a regras que imponham ao Estado o financiamento de parte dos investimentos, com recursos do erário ou de empréstimos, e à iniciativa privada o financiamento do restante, com recursos próprios e/ou de terceiros. Ambos parceiros estarão, certamente, visando lucro, sendo que o Estado deverá almejar somente o lucro social, ou seja, os benefícios para a sociedade como um todo, e a iniciativa privada deverá perseguir o lucro financeiro, mais especificamente a geração de riqueza e a criação de valor para seus acionistas. Entretanto, para que seja um bom negócio para o setor privado, deverá haver um fluxo de caixa muito bem definido, para que possa ser vislumbrada a viabilidade eminentemente financeira dos projetos, em função dos custos de capitais aportados.

Desta forma, os parceiros privados terão como expectativas de retornos dos capitais investidos os fluxos de caixa futuros dos projetos, provenientes de receitas tarifárias e/ou de subsídios governamentais, caso existam. Ao mesmo tempo, os parceiros públicos deverão justificar seus investimentos com os fluxos de caixa de benefícios tangíveis e intangíveis, tais como a redução de acidentes, a diminuição dos níveis de poluição atmosférica, as economias energéticas, a melhoria da qualidade de vida e da saúde da população, entre outros.

Em última análise, sabemos que qualquer negócio para dar certo tem de ser bom para todas as partes envolvidas. No caso das PPPs, que é um negócio como outro qualquer, não poderá ser diferente.