Título: Justiça apura fraudes na Saúde
Autor: Florença Mazza
Fonte: Jornal do Brasil, 06/12/2004, Rio, p. A-12

O Ministério Público (MP) estadual, através da Segunda Promotoria da Cidadania da capital, determinou a abertura de inquérito civil para apurar o não pagamento, por parte da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), das empresas que fornecem refeições para pacientes, acompanhantes e funcionários das unidades hospitalares do município do Rio. O inquérito, instaurado no último dia 30, foi aberto depois que o Sindicato das Empresas de Refeições Coletivas enviou ao MP um pedido de providências acusando o secretário municipal de Saúde, Ronaldo Cezar Coelho, de improbidade administrativa. O sindicato, que congrega as 18 empresas fornecedoras de refeições para 28 unidades, entre hospitais e postos de atendimento médico, alega que a dívida da SMS se arrasta por seis meses e já chega a R$ 25 milhões. Na semana passada, a entidade conseguiu outra vitória na Justiça: a 1ª Vara da Fazenda Pública impetrou mandado de segurança determinando o envio das faturas para a Secretaria Municipal de Fazenda para imediato pagamento. No documento, assinado na quinta-feira, a juíza Valéria Pachá Bichara preocupa-se com a interrupção do fornecimento das refeições, o que pode vir a causar danos irreversíveis aos pacientes internados nos hospitais.

O presidente do sindicato, Edmundo Thomé, afirma que as empresas estão à beira da falência e correm risco de interromper os serviços devido às dívidas adquiridas.

- Recorrer à Justiça tornou-se indispensável - diz Thomé.

O advogado do sindicato, Bruno Rodrigues, acrescenta que desde outubro as empresas pararam de fornecer comida aos funcionários e acompanhantes, atendendo apenas os pacientes. Desde então, segundo Bruno, a SMS passou a comprar quentinhas de empresas que não são licitadas.

- O secretário passou a desviar o dinheiro para o pagamento avulso de quentinhas - declara o advogado.

O secretário Ronaldo Cezar Coelho afirma, entretanto, que as faturas estão sendo pagas, em média, três meses depois de emitidas. Segundo ele, a SMS está fazendo uma auditoria nas notas fiscais e o pagamento está sendo efetuado dentro do prazo previsto nos contratos.

- A secretaria está em constante negociação com as empresas. Tivemos problemas com uma ou duas, mas com as outras não há - alega.

Bruno afirma, porém, que o secretário está descumprindo os contratos e o artigo 40 da Lei 8.666, que determina que o pagamento seja feito em até 30 dias após a emissão das notas.

Ronaldo explica que desde que o fornecimento das refeições foi interrompido, os diretores de cada unidade hospitalar têm buscado soluções para manter a alimentação dos servidores. O presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Jorge Darze, afirma que muitos diretores estão usando o fundo rotativo - cerca de R$ 160 mil mensais destinados a compras emergenciais - para adquirir quentinhas.

- A situação é calamitosa. Eles usam a verba para comprar comida em detrimento de outras coisas. Falta tudo nos hospitais municipais - dispara Jorge.

Entretanto, um funcionário da emergência do Hospital Souza Aguiar disse ontem que os servidores estão há cerca de três meses sem receber as refeições. Ele contou que os funcionários estão comendo num restaurante self-service próximo do hospital, que cobra R$ 0,90 por 100 gramas.

Os acompanhantes dos pacientes também não recebem as refeições. Lúcia Maria Alves, 39, está dormindo com sua vizinha, uma senhora de 85 anos que quebrou o fêmur e está internada há duas semanas no Souza Aguiar. Como o hospital não permite a entrada de comida, ela fica das 20h às 8h do dia seguinte sem comer nada.

- Fico com fome mas sai muito caro lanchar todo dia na cantina - explica Lúcia.

A comerciante Maria José da Silva, 49, também reclama da falta de comida. Seu filho sofreu um acidente e está internado há nove dias. Só deve receber alta daqui a um mês.

- Estou gastando, em média, R$ 10 por dia com sanduíches. Graças a Deus eu posso, mas outro dia tive que comprar um pão para uma senhora que estava com fome e sem dinheiro para lanchar - revela Maria José.