Título: Aval para transpor águas
Autor: Karla Correia
Fonte: Jornal do Brasil, 18/01/2005, País, p. A5

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) deu ontem seu aval à transposição das águas do Rio São Francisco. Por 36 votos a dois, mais 10 abstenções, o órgão aprovou, em regime de urgência, parecer da Agência Nacional de Águas (ANA) afirmando haver quantidade suficiente de água no rio para a integração com outras bacias hidrográficas do Nordeste setentrional.

A aprovação abre caminho para a concessão de licença ambiental ao projeto, promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O custo do empreendimento, sob o comando do Ministério da Integração Nacional, é estimado em R$ 4,5 bilhões. O projeto já conta com verba de R$ 635 milhões no Orçamento de 2005.

Segundo o ministro interino da pasta, Pedro Brito, a expectativa do governo é que o processo de licenciamento da obra seja concluído pelo Ibama até março.

Segundo ele, isso permitirá que a construção de dois canais que levarão a água do São Francisco à região da seca seja iniciada em abril. A ministra do Meio Ambiente e presidente do CNRH, Marina Silva, prefere ser mais cautelosa.

- Não vamos aprovar nada na transposição a toque de caixa - afirma.

O governo, contudo, tem pressa em iniciar o projeto. O Ministério da Integração iniciou no sábado, em Fortaleza (CE), a série de oito audiências públicas estaduais exigidas por lei para liberar a licitação da obra, mesmo sem ter começado o processo de licenciamento ambiental da transposição. A idéia é que as audiências sejam encerradas no início de fevereiro.

Essa rapidez serve de munição para os ataques dos opositores do governo ao projeto. O presidente da Frente Nacional de Defesa do Rio São Francisco Contra a Transposição, Luiz Fontes, promete acionar a Justiça para invalidar a decisão do CNRH e diz ter apoio dos estados ''doadores'' de água do São Francisco.

- O regime de urgência imposto à apreciação do conselho só serviu para que o projeto não fosse analisado o suficiente pelas câmaras técnicas do órgão. O governo conseguiu, dessa forma, minimizar o espaço de discussão sobre a obra - avaliou Fontes.

Na projeção do governo, os canais vão captar, em média, 1% do volume de água do São Francisco, o equivalente a 26 m³ de água por segundo. Esse montante será destinado a uso humano e animal da água. A outorga que será publicada pela ANA permite uma captação máxima de 61,3 m³ por segundo, embora os canais sejam projetados para ter capacidade instalada de 127 m³ por segundo, para suportar eventuais cheias.

Os opositores ao projeto vêem nessa diferença a prova de que o volume de água captada será maior do que o prometido. Outra crítica dessa ala é a de que o projeto cria um impasse federativo, já que deslocará recursos naturais de um estado para outro.

- É uma típica sobreposição do interesse federal sobre as questões estaduais. O conselho deixou hoje de ser um órgão nacional para se transformar em conselho federal de recursos hídricos - ironizou Fontes, na saída da reunião do CNRH.