Título: Rio, luzes novas sem artificialismos
Autor: R. Saturnino Braga
Fonte: Jornal do Brasil, 18/01/2005, Outras opiniões, p. A11

O Rio tem motivos para abrir os olhos da esperança. Não, obviamente, para cultivar ilusões de volta ao tempo da bonança maravilhosa; a cidade, e todo o seu entorno, vão continuar inundados, durante muito tempo, por essa massa de brasileiros apartados da vida digna, que transformou as favelas de solução, que eram, em problema gigantesco sob o comando do tráfico. Mas este não é um desafio específico do Rio; é do Brasil, que precisa sacudir fora o jugo do mercado, do neoliberalismo, e reencontrar-se com o seu destino através de um projeto nacional de desenvolvimento.

Há, entretanto, no Rio, luzes novas no horizonte. Têm nomes, essas luzes: Lindberg Farias de Nova Iguaçu; Arthur Messias de Mesquita; Godofredo Pinto de Niterói; Rubens Bontempo de Petrópolis; Saudade Braga de Friburgo; Carlos Alberto Campista de Campos. Isso para falar somente dos faróis mais fortes, porque há de haver, nos municípios menores, líderes ainda pouco conhecidos mas da qualidade de um Alfredo Oliveira de Quatis.

São luzes que iluminam expectativas promissoras, depois de tanto tempo de vácuo de lideranças políticas expressivas que levou o nosso Estado ao ponto de desprestígio e descrença em que se encontra.

Lindberg deu exemplo: foi ao presidente e pediu investimentos, mas não apenas para Nova Iguaçu; pediu para toda a Baixada, a região mais densa em população carente de todo o estado. E pediu certo, pediu a construção urgente do anel rodoviário do Rio, que interliga todas as principais rodovias federais, corta toda a Baixada e desemboca no porto de Sepetiba que será o grande ponto de concentração e redistribuição de cargas, o colosso portuário de toda a América do Sul. Pediu a refinaria petroquímica de Itaguaí, que a Petrobrás acaba de projetar em parceria com um grupo privado nacional, e que será o marco inicial do pólo petroquímico, principal alavanca de crescimento da renda e da arrecadação do estado nas próximas décadas, que era para ter sido implantado já nos anos setenta. E pediu saneamento básico, investimentos em saneamento em toda a Baixada, com subsídio governamental, naturalmente, dado que a população maior que habita a região não tem nível de renda para pagar tarifas plenas de água e esgoto. Enfim, pediu coisas viáveis e absolutamente prioritárias, não só para Nova Iguaçu, mas para todo o Rio. Pediu muito bem.

Liderança política é fator decisivo no impulsionamento do processo econômico e social de uma região ou de um país, pelo poder de mobilização que tem sobre todos os demais fatores. E liderança tem sido, na verdade, fator escasso no Rio, por mais que se reconheça certa dimensão importante na figura do prefeito César Maia. Mas o simples fato de ele ser tido como a maior figura política do estado no momento dá bem a idéia da escassez desta qualidade estratégica de que estamos falando, na cidade que foi em passado não muito distante o principal foco político do país.

Esta a razão pela qual gente séria pensou em importar um líder do Ceará para preencher este vazio - gente séria que não pensou na vergonha que seria para este nosso sofrido Estado esta importação, sem nenhum demérito para a pessoa de Ciro Gomes, efetivamente um líder brasileiro de grande porte. O Rio tem tradição de acolhida a políticos de fora, mas políticos que façam a vida do Rio, que atuem aqui durante certo tempo e sejam incorporados á atividade política da cidade e do estado; não políticos artificialmente importados para serem lançados imediatamente como candidatos ao governo do Estado.

Houve gente séria, também, que pensou em outra solução esdrúxula: desfundir os dois estados de antes, separar novamente, depois de tudo o que foi feito com muito esforço e algum custo, separar novamente a Guanabara do Estado do Rio, pensando só na Capital (o interior que se virasse), na expectativa de recuperar as ricas receitas do tempo de Lacerda, Negrão e Chagas, e construir novos túneis e viadutos. Gente da Capital, evidentemente, que não é capaz de sentir solidariedade pelas pessoas da periferia que trabalham no Rio, geram receitas aqui mas moram na Baixada e lá, nas suas moradias, têm de ser atendidas nos serviços públicos essenciais. E gente que não é capaz de enxergar que o futuro econômico mais importante está justamente do outro lado da Baía, que foi ajudado e daqui para a frente ajudará a Capital a enfrentar seus gigantescos problemas. Afinal é no antigo Estado do Rio que está o petróleo e que estarão as indústrias a ele ligadas, a começar pela petroquímica, com o pólo de Itaguaí; é lá que está Sepetiba, o grande porto, a nova siderúrgica, e lá se encontra a parte maior da indústria naval que começa a ressurgir; isto é, de lá poderá vir um bom socorro em matéria de renda, emprego e arrecadação para a população da Guanabara.

De qualquer forma, mesmo sem considerar essas perspectivas futuras, o Estado hoje é um só, e a desfusão seria um artificialismo tão esdrúxulo como a importação de um líder de fora para preencher nosso vazio. Não é por aí, pelos artificialismos, mas pelo esforço de mobilizar e racionalizar a atuação das forças existentes que vamos enfrentar com eficácia as questões prementes que nos desafiam, acreditando, estimulando e ajudando especialmente as lideranças novas e promissoras que estão chegando para revitalizar e reforçar os quadros do Rio de hoje - capital e interior.