Título: Novo partido em busca do velho PT
Autor: Bernardo Mello Franco
Fonte: Jornal do Brasil, 09/01/2005, País, p. A2

Além da bandeira vermelha na parede, em protesto contra as ''tropas imperialistas no Iraque'', quase nada diferencia o escritório do Partido Socialismo e Liberdade (P-SOL) do mar de salas comerciais no Centro do Rio. Lá, o sociólogo Jefferson Moura, de 31 anos, trabalha com dois funcionários na coordenação da sigla. Após passar pela corrente Convergência Socialista, expulsa do PT em 1994, e pelo PSTU, ele divide seu tempo entre a militância num movimento pela reforma agrária e as atividades no P-SOL.

- Os últimos três meses foram de dedicação integral à coleta de assinaturas para legalizar o partido - conta Jefferson, que carregou listas para universidades, sindicatos e encontros de esquerda pelo Brasil.

Após alcançar, em dezembro, os 438 mil nomes exigidos pela lei eleitoral, a legenda da senadora alagoana Heloisa Helena começa 2005 com uma nova missão: conquistar o eleitorado de esquerda insatisfeito com o governo Luiz Inácio Lula da Silva. Para isso, o partido prepara uma agenda intensa, a começar pelo encontro nacional em Porto Alegre no fim do mês, durante o Fórum Social Mundial.

- O P-SOL nasceu para resgatar bandeiras históricas do PT. Vamos nos aproximar dos movimentos sociais e ocupar espaços deixados pelo partido - sonha Jefferson.

Os militantes do P-SOL garimpam seu discurso em antigas palavras de ordem do partido de Lula, que expulsou Heloisa e três deputados radicais no fim de 2003, formando o núcleo original da nova sigla. O tratamento de companheiro, as críticas ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e a promessa de um governo para os trabalhadores lembram o PT antes do poder.

No alvo das ações do P-SOL, ele aponta setores tradicionalmente aliados ao PT: sindicalistas, trabalhadores do campo, ativistas de movimentos sociais e funcionários públicos.

- Durante a campanha pela legalização, recebemos lotes de assinaturas em envelopes surrupiados de repartições públicas - confidencia o ex-deputado petista Milton Temer, dirigente da nova sigla.

Dirigente do Sintsprev, que reúne servidores federais da saúde, trabalho e previdência, Osvaldo Mendes cita a frustração com o governo Lula pela falta de reajustes salariais para justificar a adesão de parte do funcionalismo ao P-SOL.

- Apostamos todas as fichas nele, mas estamos sendo tratados pior do que no governo Fernando Henrique - critica o sindicalista, de 54 anos.

Osvaldo torce para que o partido sirva como instrumento de pressão contra a reforma trabalhista proposta pelo governo e que abrace a defesa das minorias, como índios, e homossexuais.

Nos últimos meses, as bandeiras vermelhas do P-SOL também se multiplicaram em protestos estudantis pelo país.

- Na marcha contra a reforma universitária, em novembro, a maior coluna era a nossa - orgulha-se Jefferson Moura.

O carioca Luiz Guilherme Santos, de 24 anos, junta dinheiro para ir ao encontro do partido em Porto Alegre. Aluno de Ciências Sociais da UFRJ, ele ajudou a coletar assinaturas para a legalização da sigla entre colegas.

- A universidade tem caráter mais contestador. Além disso, sofremos a falta de investimento do governo no setor público - justifica.

Engajado nas discussões políticas da faculdade, o estudante torce para que o P-SOL não repita a tática de aparelhamento comum em centros acadêmicos usados para recrutar militantes partidários.

- O desafio de um partido novo é romper com velhas práticas da esquerda - conclui Jefferson Moura.