Título: Depois da Palestina, o Iraque
Autor: Arthur Ituassu
Fonte: Jornal do Brasil, 12/01/2005, Internacional, p. A7

Passadas as eleições palestinas, cujo bom andamento trouxe uma atmosfera positiva ao Oriente Médio, as atenções se voltam agora para o pleito no Iraque, previsto para o fim de um mês no qual a democracia vem sendo o assunto principal. Por trás dos fatos, está em jogo a idéia de que povos livres preferem a paz.

E se assim for, o desafio será certamente maior no Iraque. Uma equipe que organizava as eleições na província de Anbar, por exemplo, anunciou ontem que resolveu abandonar a missão depois de receber ameaças de morte.

A Comissão Independente Eleitoral nega que haja uma renúncia em massa de autoridades eleitorais em províncias sunitas, onde insurgentes estão determinados a prejudicar o pleito de 30 de janeiro. A Comissão confirma que houve renúncias, mas diz que substituiu os que desistiram.

Em partes do país, autoridades recebem telefonemas e e-mails de ameaça de morte. Até agora, sete funcionários foram mortos, quatro foram assassinados à luz do dia.

Em Washington, o presidente George Bush frisou ao premier iraquiano, Iyad Allawi, a necessidade de se manter o processo eleitoral, apesar da violência. Bush e Allawi conversaram ontem, por telefone, por 10 minutos. O premier reconheceu que em partes do Iraque a violência impede que o pleito ocorra.

Até por causa disso, a Organização Internacional para as Migrações (OIM) apresentou ontem, em Paris, um programa eleitoral com o objetivo de permitir a 1 milhão de iraquianos que moram no exterior que participem das eleições gerais no Iraque.

- Queremos garantir que um número máximo de iraquianos vote - afirmou, ao JB, de Amã, na Jordânia, Monique De Groot, porta-voz da OIM para o projeto ''Voto fora do país''. - Será a maior operação deste tipo da história.

A comunidade de iraquianos no mundo é estimada em algo próximo de 4 milhões de pessoas e espera-se que 1 milhão participe do pleito. A OIM tem mandato da Comissão Independente Eleitoral para o Iraque e receberá mais de US$ 90 milhões para pôr o pleno em prática.

- Essa é uma maneira clara de garantir uma participação que dê legitimidade às eleições, em face ao problema da violência no país - afirmou Nizar Messari, professor de Relações Internacionais na PUC-Rio.

Além da França, outros 13 países participam do programa: Alemanha, Dinamarca, Grã-Bretanha, Holanda, Suécia, Canadá, Estados Unidos, Emirados Árabes, Irã, Jordânia, Síria, Turquia e Austrália.

A OIM já fez projetos semelhantes na Bósnia, no Kosovo, em Timor Leste e no Afeganistão. Como os exilados iraquianos são normalmente xiitas ou curdos, que fugiram da repressão do Partido Baath (sunita), de Saddam Hussein, a previsão é a de que os votos de fora acompanhem a tendência local, onde os sunitas prometem boicotar e os xiitas, que são 60% da população, garantem ampla participação.

- 'Voto fora do país' é um projeto que segue o modelo europeu e apresenta uma discussão interessante e atual, onde a cidadania está deslocada do território - analisa Messari. - Mas não reflete o estado da democracia iraquiana.