Título: Estado insustentável
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/01/2005, Opinião, p. A10

Em reveladora entrevista ao repórter Rafael Rosas, na edição de segunda-feira deste Jornal do Brasil, o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, expôs com notável franqueza o dilema do atual governo: não se conseguiu, nos últimos dois anos, realizar um corte efetivo dos gastos públicos. Sem isso, admitiu Levy, foi preciso aumentar as receitas. Em português claro: mais impostos para uma já sufocante carga tributária - fórmula habitual para compensar o alto volume de despesas do setor público. O secretário demonstrou na entrevista o padrão de consciência de parcela relevante do governo: nos moldes atuais, o Estado brasileiro beira o insustentável. Sem conduzi-lo a um projeto permanente de reformas, acabará turvando todas as possibilidades de crescimento econômico desejadas pelo país. A persistência dos crônicos problemas fiscais brasileiros sugere uma profunda reestruturação dos gastos públicos, que deverá resultar numa redefinição das receitas tributárias e na alteração do próprio pacto federativo. Reafirme-se: a discussão exige a desvinculação das verbas orçamentárias e a reorganização do Estado, suas instituições e políticas fiscais.

A Constituição de 1988 estabeleceu direitos nas áreas de saúde, educação, previdenciária e trabalhista. Juntos, promoveram excessiva rigidez nas despesas. Tratou-se de uma generosidade tão bonita no papel quanto inviável na prática. Criou-se ali um monstrengo engessado por pesados gastos. Resultado: o ajuste fiscal implementado nos últimos anos foi obtido à base de sucessivos aumentos de receitas e não via corte de despesas. O aumento da carga tributária superou o pico, asfixiando o país, sem que a sociedade receba a contrapartida em serviços de qualidade - decorrência do dinheiro jogado no ralo dos enormes gastos públicos.

Enfrentar tal engessamento exige mais do que a consciência dos ocupantes dos gabinetes mais vistosos do Palácio do Planalto. Requer decisão política do Congresso de cortar a própria carne. Parlamentares, afinal, costumam ainda abusar das emendas de aumento de gastos no processo de elaboração do orçamento (meramente autorizativo), reestimando receitas pouco confiáveis e desfigurando o projeto original do Executivo. Se essas reformas forem debatidas e implementadas com regras claras e consensuais, o Estado ganhará em eficiência.