Título: ''Vamos estimular novos produtos''
Autor: Samantha Lima
Fonte: Jornal do Brasil, 24/01/2005, Economia e Negócios, p. A20

A que se deve o crescimento do setor em 2004? - Primeiro é o crescimento da economia. Segundo é o avanço da produção de automóveis, que atingiu 2,1 milhões no ano passado. Como o brasileiro faz seguro de automóveis nos três primeiros anos do veículo, o volume de carro novo é muito importante para o setor. Outro ponto importante é o avanço da previdência privada. Foi um crescimento menor do que no ano passado, que fechou em 54%, mas ainda assim expressivo, na faixa de 32%. A projeção de R$ 110 bilhões só na área de previdência, hoje na faixa de R$ 81 bilhões, nos próximos três anos é muito viável.

- Qual é a participação do setor de seguros no PIB atualmente e qual é a projeção para os próximos anos?

- Somando a área de saúde, dá 3,8%. Com o crescimento do setor, teremos o equivalente a 6,5%, 7% do PIB nos próximos 3 ou 4 anos. Isso porque, com mais estabilidade, aumenta a demanda por seguros. Além disso, quanto mais confiança tem o consumidor, quando ele sabe que tem um órgão que zela pela supervisão do setor, pela transparência e solvência das instituições, o leque de negócios se amplia.

- Como foi o desempenho dos seguros populares de vida, lançados ano passado?

- Há uma tendência de crescimento do setor para os próximos anos, a exemplo do que ocorreu em outros países. No mundo, metade da produção de seguros é do ramo vida. No Brasil é 18%. Seguradoras que já lançaram o produto atingiram a marca de 3 milhões de apólices, em alguns casos a R$ 3,50. Neste ano, consolidaremos o seguro popular de automóveis, que ainda não saiu porque não conseguimos formatar ainda um modelo que tenha pouca contestação judicial. Espero que até março tenhamos isso pronto. Tenho quase certeza de que, a exemplo da experiência internacional, dobre o número de carros segurados, num universo de 36 milhões.

- Existe algum setor que ainda possa ser alvo de uma ação de seguro popular?

- Sim, o de garantia estendida, que tem um potencial enorme. Hoje, esse produto já tem uma dimensão econômica e um nível de adesão que a gente tem condições de caracterizar como seguro. Mas como é um produto novo, ele vai se aperfeiçoando até que se tenha uma dimensão legal para caracterizá-lo. Estamos dando prazo de adaptação para as empresas, para evitar que haja multas. É necessário para que o mercado se organize e tenha condições de adaptar seus produtos às cláusulas de um seguro.

- Além da popularização, outra bandeira sua era a auto-regulação do setor. Como está isso?

- É um ponto frustrante. O estado brasileiro sempre teve presença forte. Em outros países, existe uma co-responsabilidade entre os reguladores e os regulados, criando códigos de ética e procedimentos. No Brasil, como o estado era forte, ele inibiu isso. O excesso de norma gera uma tentativa do mercado de ter produtos padronizados para evitar ações judiciais.

- O mercado tem medo de diversificar?

- Eu acho que, no Brasil, sim. Eu gostaria de estimular produtos novos, mais competitivos, mas há grande dificuldade. Minha frustração é ter avançado muito pouco. Em compensação, as ouvidorias são um sucesso. Cerca de 60% do mercado já tem uma ouvidoria constituída. Isso cria mecanismos de mediação de conflitos, de solução de dúvidas com seguradoras, fortalece a imagem das seguradoras.

- Se o mercado estivesse 100% coberto pelas ouvidorias, as seguradoras teriam menos medo de oferecer produtos menos padronizados?

- Sim, e a ouvidoria tem uma vantagem, que é de ser uma grande auditora dos processos internos das seguradoras, porque ela vai identificar os processos corretos, os contratos que têm mais problemas.

- Qual é a participação de empresas estrangeiras no mercado segurador brasileiro?

- A participação de estrangeiras corresponde a 28% dos prêmios emitidos. É pouco se compararmos a países da América Latina. Eles são importantes porque trazem novas tecnologias e permitem que haja diversificação maior de produtos. Na área de seguros de automóveis, propriedade, poderia haver produtos mais sofisticados. Poderiam existir seguros envolvendo queda de renda e responsabilidade civil para gestores de companhia, por exemplo.

- Como a Susep vem se preparando para abertura do setor de resseguro?

- A Susep se preparou em 2002 e 2003 para abertura e fiscalização do setor de resseguro. Foi criada uma gerência no período para receber a fiscalização do resseguro. Quatro pessoas foram treinadas, então já temos gente qualificada e até com expertise para a fiscalização.

- Qual é a vantagem da abertura?

- O resseguro vai agregar mais competição ao mercado. E também pode permitir aumento da qualidade de produtos ofertados no país e também pode promover redução de custos.

- Essa redução nos custos chega ao consumidor?

- Com certeza. Na área de seguros industriais, o impacto é imediato. Nos seguros massificados (os que chegam à população), demora um pouco porque vai haver necessidade de carteiras maiores de seguro para serem resseguradas. O efeito da abertura é que permitirá operações de tamanhos maiores, e, com elas, pode haver uma redução dos preços e, ainda, um aumento no leque de novos negócios.

O mercado abriu porque aumenta a oferta local, a qualidade dos produtos e pode reduzir custos e, assim, aumenta a eficiência de alguns setores da economia num médio e longo prazo.

- As Parcerias Público-Privadas podem trazer novos negócios ao setor?

- No mundo, os seguros-garantia foram amplamente utilizados nas PPPs. Se é assim no mundo, se reproduzirá no Brasil. As dificuldades são os seguros novos e a dificuldade de vender o conceito. Uma vez superadas essas barreiras, pode se tornar um segmento expressivo. Mas como o setor é pequeno, pode crescer 100% no período de obras.

- Quanto as PPPs devem gerar em negócios?

- O volume de prêmios do seguro-garantia, que é de R$ 120 milhões, pode até dobrar.

- No caso das PPPs é possível a criação de um seguro que garanta as receitas dos investidores?

- Se for oferecido um seguro financeiro com cláusula de stop loss, sim. É uma modalidade sofisticada mas é possível, com operações de resseguro.

- O governo Lula tem sido criticado por tentar reduzir a independência das agências. Isso acontece com a Susep?

- No caso da Susep, não somos uma agência reguladora como a Aneel ou a Anatel. Os projetos que temos são exaustivamente discutidos com a Fazenda. Acho que o mercado de seguros nunca teve um foco tão positivo do governo como agora. A redução do IOF na área do seguro de vida é um sinal positivo que a fazenda está dando de que esse é um setor que tem relevância e apelo especial. O segredo da regulação é criar um ambiente no qual o mercado se comporte como você gostaria que ele se comportasse. Você ganha pela persuasão, não pela coibição. Coibir atos, de forma a levar a sanção, não é uma forma ideal de regulação.