Título: À mercê dos bandidos
Autor: Gilberto Alves da Silva
Fonte: Jornal do Brasil, 14/01/2005, Opiniões, p. A11
O Estatuto do Desarmamento não diminuirá a violência. Ao contrário, aumentará
O Estatuto do Desarmamento, Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003, entrou em vigor no dia 23 de dezembro de 2003. A lei proíbe o porte de arma por civis, com exceção para casos onde há ameaça à vida da pessoa. Vivemos no Rio de Janeiro, onde se constata aumento do número de homicídios dolosos, latrocínios, roubos a pedestres e quase o dobro dos casos de assaltos em ônibus, segundo o Boletim Mensal de Monitoramento e Análise da Secretaria da Segurança Pública deste Estado. Portanto, a vida está sempre ameaçada.
Nos casos de homicídios o aumento foi de 4,2% em agosto (521 registros), quando comparado com agosto de 2003 (500). O índice de latrocínio aumentou 40%, passando de 10 para 14 casos de agosto de 2003 para agosto de 2004. Os registros de roubo a pedestres aumentaram 30,5%, sendo 1941 em agosto de 2003 e 1946 no mesmo mês em 2004, o mesmo aconteceu com roubos e furtos a ônibus que cresceram 85%, passando de 253 para 468. De acordo com a OAB/Rio, somente 2% dos homicídios são esclarecidos. O jornal britânico The Independent classificou o Rio como ''a cidade da cocaína e da carnificina'', exagerou no tom, mas retratou a realidade nua e crua.
A Associação Paulista de Defesa dos Direitos e das Liberdades Individuais (Apaddi) afirma que, hoje, existem cinco milhões de armas legais nos registros do Sistema nacional de Armas e Munições, o Sinarm. A Viva Rio diz que são mais de 20 milhões de armas no país, legais e ilegais. O recolhimento de 80 mil armas, meta inicial do Sinarm, significa tirar 1,6% do número de armas, no caso do Appadi e uma pequena quantidade, 0,004% no caso desta ONG.
Estes números representam o contrário do que Rede Globo vem alardeando, demonstra um total fracasso. Uma pesquisa da Viva Rio revela que esta campanha de desarmamento vem atingindo mais a classe média e os idosos e mostra que a maioria das armas recolhidas não estava registrada e nem tinha nota fiscal.
Segundo o jornal O Globo, entre as quase duas mil pessoas que , de julho a setembro, entregaram suas armas na sede da ONG, 42% têm 60 anos ou mais, 64% são homens e 68% têm renda familiar superior a R$ 1.300,00. Entre os que aderiram à iniciativa, 79% cursaram o ensino médio completo. A pesquisa também indica que a maioria das pessoas, 66%, entregou apenas uma arma e 89% das 2.281 armas entregues não eram registradas e 97% não tinha nota fiscal.
Apesar do recolhimento das armas, os crimes violentos no Rio e em São Paulo continuam com altas taxas o que demonstra que este processo não está sendo feito de uma maneira correta, isto é, não se está recolhendo armas de quem pratica os crimes.
O professor Gary A. Mauser do Institute for Urban Canadian Research Studies, no seu artigo A experiência fracassada, diz que ''as leis sobre armas de fogo, que devem evidenciar resultados em corte nos crimes violentos ou o controle sobre as armas, não passam de uma promessa vazia'' Ele examinou as tendências criminosas na Grã-Bretanha, na Austrália e no Canadá, países que recentemente introduziram regulamentos sobre armas de fogo, e fez comparações com os Estados Unidos, onde o sistema de justiça criminal é bastante diferente dos da Europa e dos citados países.
A maior diferença talvez seja aquela em que os cidadãos habilitados nos Estados Unidos, podem portar armas de mão para sua autodefesa. Em 2003, 35 estados neste país passaram a permitir que os cidadãos responsáveis obtenham porte de arma, o que resultou no declínio nas taxas de crime violento e de homicídios. Ficou comprovado no estudo do professor Mauser que quanto maior a restrição às armas maior é também a taxa de criminalidade.
Em contraste com a densidade de armas de mão dos Estados Unidos, onde a taxa de criminalidade vem caindo há mais de 20 anos, a taxa de homicídios na Inglaterra e no País de Gales, países onde as armas de mão foram banidas, tem crescido. Apenas nos anos 90 a taxa de homicídios subiu em 50%, indo de 10 por milhão de habitante em 1990, para 15 por milhão em 2000.
Ao nosso ver, o Estatuto do Desarmamento não diminuirá a violência. Pelo contrário, aumentará, pois os que circularam armados, os bandidos, continuarão com os seus arsenais, enquanto os cidadãos, os homens de bem, os chefes de família não terão como se defender e não poderão, muitas das vezes, contar com o auxílio da polícia, principalmente aqueles que têm oportunidade de aproveitar o fim de semana para seus descansos em suas casas de praia ou de montanha.
A medida adotada pelo governo em desarmar o cidadão honesto, o trabalhador, só gerará medidas positivas se houver um Sistema de Segurança confiável e um Judiciário rígido. Milhares de pessoas de boa fé atenderão à medida entregando suas armas pensando que com este ato estarão ajudando a diminuir a criminalidade, enquanto isso, as verdadeiras ações de repressão ao crime continuarão, sem as suas efetivas implementações, relegadas a segundo plano.
Gilberto Alves foi subsecretário de Ciência & Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro