Título: PT não soube lidar com a escassez
Autor: Daniela Dariano
Fonte: Jornal do Brasil, 16/01/2005, País, p. A2

Prefeito de Porto Alegre critica situação deixada por antecessores na cidade

A fala é pausada, em sintonia com o tom cauteloso das críticas à gestão anterior, que se somam lenta porém claramente. José Fogaça, 58 anos recém-completados, o responsável por desbancar o PT depois de 16 anos de administração do partido em Porto Alegre, é político ao comentar a situação que herdou na prefeitura da capital gaúcha, mas não se esquiva de censuras aos antecessores em termos de administração: ''O PT lidou bem com a bonança e não lidou bem com a escassez''. Evita, no entanto, palavras mais fortes. Enquanto diversos de seus secretários usam os termos ''sucateados'' e ''ambientes degradantes'', Fogaça pondera:

- Os secretários reclamaram na primeira reunião do estado geral físico das áreas ou ambientes de trabalho. Significa dizer não propriamente uma condenação à administração em geral, mas uma questão específica relativa ao aspecto externo, físico, dos locais de trabalho. Registramos algumas áreas de trabalho em que a manutenção deixa muito a desejar. Prefiro essas expressões inglesas à latina ''chocar''.

Nas entranhas da administração, no entanto, o prefeito, eleito pelo PPS, não encontrou cenário muito mais otimista. Financeiramente, afirma, a prefeitura ''bateu nos limites do volume da folha de pagamento, já há um endividamento da ordem de R$ 580 milhões, há uma necessidade de pagamento de amortizações de empréstimos''.

- A prefeitura não sofreu uma desestruturação financeira nos 16 anos do PT, mas também não a recebemos melhor do que esteve nos últimos 10 anos. Há 10 anos, a prefeitura era bem melhor financeiramente - resume, avaliando como ''difícil'' a situação da capital.

Não é tão grave, pondera, se comparada ao governo do Rio Grande do Sul. Embora Fogaça atribua as dificuldades do estado a ''razões estruturais e históricas'', deixa clara a contribuição do PT também para o problema enfrentado hoje por Germano Rigotto (PMDB). No município, conta que a equipe recém-chegada encontrou ''uma certa ausência de memória sobre o fluxo de caixa e folha de pagamento''.

- Os funcionários que detinham essas informações essenciais foram embora. Não há censo em lugar nenhum. Recebemos informações que nos permitiram assumir o governo. Estamos formulando um diagnóstico, que ainda vai levar 60 dias.

Na avaliação do prefeito, embora o PT tenha usado a longa gestão em Porto Alegre como bandeira de administração bem-sucedida, os sucessivos prefeitos do partido conseguiram gerir bem a cidade ''quando estava tudo muito favorável financeiramente''. ''Quando a situação financeira ficou um pouco mais apertada, aparentemente houve uma dificuldade de conduzir''. Segundo Fogaça, nos 10 primeiros anos do governo do PT, havia uma situação financeira extremamente favorável do ponto de vista tributário.

- De quatro anos para cá, houve um processo de deterioração financeira. A partir de 97, o PT assumiu a gestão plena da saúde e começou a assumir a responsabilidade pelo ensino fundamental e pela educação infantil. Coisas que não eram preocupação da prefeitura. A partir do momento em que ela assumiu esses custos, as estruturas começaram a apresentar sinais de dificuldade.

Fogaça diz ter consciência de que ''ninguém terá na Prefeitura de Porto Alegre aqueles maravilhosos anos 90, que não foram nem o produto da genialidade do governo nem do PT, mas de uma circunstância extremamente favorável''.

- O PT governou o estado e se viu que não havia nenhuma genialidade.

Da União, queixa-se da expansão excessiva da carga tributária, ''que tirou qualquer espaço por parte dos municípios e dos estados de mexerem em suas políticas de tributação''.

- O governo federal está carregando tão pesado em cima do setor produtivo que não restou nenhuma brecha, nenhum espaço mínimo para os municípios avançarem. Não há como aumentar tributos em nível municipal. A reforma tributária foi, na verdade, um grande aumento de tributos. E os impostos que foram aumentados não são divididos.

Absorvido pela rotina do Executivo - ''muitas pequenas decisões por minuto'' - depois de 24 anos como parlamentar - tomando ''grandes decisões em prazos médios'' - Fogaça pontua seus principais desafios: saúde com serviço mais amplo, pronto e qualificado; uma rede de educação e proteção à criança e ao adolescente desprotegidos; políticas próprias de atração de investimentos e empregos.

As pelo menos 12 horas diárias que tem voltado sua atenção para os problemas da cidade não impedem o ex-senador, ex-deputado estadual e federal, radialista, advogado, professor universitário e comunicador de se manter a par do que acontece com o seu partido. Fogaça é pelo compromisso do PPS com a governabilidade de Lula no Congresso - ''não necessariamente com cargo no governo'', mas ''no sentido de aprovar os projetos do presidente''. Para 2006, admite uma discussão interna no PPS sobre candidatura própria com o PDT. O prefeito de Porto Alegre não acredita na viabilidade da alternativa neste momento, ''hoje, 14 de janeiro'':

- Mas a política é como nuvem. A gente olha, está de um jeito. Daqui a pouco, olha de novo e está de outro.