Título: Sob a sombra de Reagan
Autor: Arthur Ituassu
Fonte: Jornal do Brasil, 20/01/2005, Internacional, p. A10

Bush toma posse hoje sob forte esquema de segurança e na esperança de escapar da maldição do segundo mandato

O 43° presidente dos Estados Unidos, George Walker Bush, toma posse hoje para mais um mandato de quatro anos no comando de uma administração mais que polêmica. Com uma aprovação no limite da maioria - em torno de 52% - Bush terá pela frente a famosa ''maldição do segundo mandato'', normalmente marcado por escândalos como o de Watergate, que transformou Richard Nixon no primeiro presidente americano a renunciar em meio de mandato, em agosto de 1974, ou como no caso Monica Lewinsky, que perseguiu Bill Clinton sem ser capaz de derrotar o presidente mais popular da história dos EUA, o único em anos que saiu do poder mais popular do que quando entrou.

Hoje, sob a neve de Washington, Bush dará o pontapé inicial do segundo mandato esperando tempos melhores. Com um presidente, no mínimo, pouco popular na maior parte do planeta, muitos analistas esperam que Bush siga os passos de Ronald Reagan e amanse a prática e o discurso nos últimos quatro anos que estiver no poder.

A analogia não é à toa. Além de ambos terem origem republicana, o vice-presidente Dick Cheney e o secretário de Defesa Donald Rumsfeld são apenas alguns do atual governo que estiveram na gestão Reagan. Ainda, George Bush (pai) foi o vice e sucessor do presidente que chamava a União Soviética de ''o império do mal'' no primeiro mandato e negociava com Mikhail Gorbachev acordos de desarmamento no segundo.

- O segundo mandato normalmente é marcado pelo fracasso. Agora é a hora de deixar o legado e manter o partido no poder. Isso muda um pouco a atitude dos governantes que no primeiro mandato estão somente preocupados com a reeleição - disse, ao JB, o professor de história americana Stephen Rabe, da Universidade do Texas, em Dallas. - Serão quatro anos em que a divisão vai se acirrar. Vamos ver brigas homéricas nas nomeações que o presidente terá que fazer para o Supremo. Acho que os democratas estarão com força para as eleições legislativas de 2006 - conclui.

Como escreveu a professora Barbara Farnham, na prestigiada revista Political Science Quartely, Reagan começou como um ''essencialista'', alguém que acreditava que a União Soviética ''era governada por uma ideologia que não colocava limites no que Moscou poderia, com justificativas, fazer em busca dos fins''. No entanto, terminou como um ''interacionista'', vendo o conflito com os soviéticos ''como um problema de percepção mútua nos dois lados''.

Ninguém espera que Bush passe a ver Osama Bin Laden com simpatia, como foi o caso de Reagan e Mikhail Gorbachev. No entanto, o sinal dado pela nova chefe da diplomacia americana, Condolezza Rice, de que os EUA precisam de ''mais diplomacia'', encaixa-se no ''padrão segundo mandato''.

''Pode o ceticismo de Bush com as Nações Unidas, da mesma forma que o ceticismo de Reagan sobre um acordo de desarmamento com os soviéticos, levar o presidente no caminho de favorecer uma nova ONU, mais forte e mais efetiva?'', pergunta a analista política Chris Suellentrop, em artigo recente.

Ao olhar para o futuro, o pior cenário que Bush pode ver é o da morte de milhares de soldados americanos no Iraque, o da teocratização do Estado árabe e o de um novo ataque terrorista em solo americano.

Ao mesmo tempo, atormenta o sono do presidente a possibilidade de um déficit público e comercial inadministrável, que o impossibilitaria de fazer os desejados cortes de impostos e de lidar com os problemas da Previdência e da Saúde, da forma como anseia.

No discurso de posse, Bush vai insistir na ''unidade nacional'', quando o melhor da democracia americana é a divisão de poderes.