Título: Mutirão para salvar o Bolsa Família
Autor: Karla Correia
Fonte: Jornal do Brasil, 21/01/2005, País, p. A3

Para evitar fraudes, Lula pede que Ministério Público, Tribunal de Contas e Corregedoria-Geral fiscalizem o programa

Diante da crise na área social, o Palácio do Planalto resolveu agir para salvar o programa Bolsa Família. Enquanto coleciona boas notícias na área econômica, o governo se esforça para limpar a imagem de um dos motes centrais da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República. Dois anos depois da posse, o programa vive uma incômoda imobilidade, agravada por denúncias de fraudes nos cadastros. Na tentativa de contornar essa situação, Lula decidiu criar um mutirão no governo para fiscalizar o Bolsa Família.

Além do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), integram o esforço federal a Rede Pública de Fiscalização do Bolsa Família, a Corregedoria Geral da União (CGU) e os Ministérios Públicos federal e estaduais, que estão diretamente ligados ao trabalho de fiscalização nos municípios beneficiados. A CGU cuidará do apoio logístico às equipes de fiscalização do ministério e conduzirá a apuração de eventuais denúncias de irregularidades no Cadastro Único.

O Ministérios Público se encarrega de fazer diligências periódicas pra investigar cadastrados e propor ações penais ou administrativas cabíveis às fraudes apuradas. Terceiro parceiro da rede pública de fiscalização do programa, o Tribunal de Contas da União (TCU) treinará equipes do ministério destacadas para o trabalho de fiscalização direta.

Sucessivos escândalos, sobretudo denúncias de pessoas que recebiam os benefícios do governo sem preencher os requisitos, e cizânias na administração do programa marcaram o noticiário sobre o Bolsa Família no ano passado. Somando-se ao noticiário negativo sobre o programa, auditoria realizada pelo TCU no ano passado concluiu que o Bolsa Família não consegue cumprir o objetivo de combater a pobreza e a exclusão social de forma consistente justo pela falta de mecanismos de controle. O presidente Lula admitiu ontem as dificuldades encontradas na implementação e no acompanhamento da execução do programa.

- Na verdade, nós não tínhamos cadastro no início do Bolsa Família. Tínhamos um monte de endereços, uma lista de nomes, e não sabíamos se aquelas pessoas precisavam ou não do benefício - reconheceu o presidente.

Para Lula, os órgãos agora conveniados com o programa servirão de ''avalistas'' do Bolsa Família.

- O papel de vocês, que têm acesso a cada município e a toda estrutura federativa do Brasil, será perceber o que está acontecendo de errado no programa e apontar soluções - disse o presidente aos representantes da CGU e dos Ministérios Públicos.

O ministro Patrus Ananias chamou a atenção para a complexidade geográfica do país entre os entraves encontrados na construção de um cadastro único para o Bolsa Família, que aglutinou, em 2003, os benefícios do Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás.

- Todos sabemos que normas jurídicas voltadas à transformação da realidade social, especialmente para beneficiar a população mais pobre, têm a maior dificuldade de implementação na prática - justificou Ananias.

O ministro afirmou que é preciso separar os tipos de falhas observadas no programa:

- Cumpre distinguir o erro doloso, intencional, que atingem diretamente o bem público, do erro material, de procedimentos que, porventura equivocados, não engordam o patrimônio de quem os praticou mas atravanca o andamento do programa, e o acesso da população carente aos recursos a que tem direito - argumentou.

A meta do governo é estender o benefício do programa a 11 milhões de famílias em 2006. O Planalto fechou o ano passado com cerca de 6,5 milhões de domicílios atendidos pelo Bolsa Família, com repasses que variam entre R$ 50 e R$ 95 mensais, e o Ministério do Desenvolvimento Social esteve entre os campeões de investimento de 2004, gastando 93,2% dos recursos destinados ao Bolsa Família. Para esse ano, o objetivo traçado é de 8,7 milhões de famílias atendidas pelo programa.