Título: Novo fórum para a América Latina
Autor: Marcelo Ambrosio
Fonte: Jornal do Brasil, 19/01/2005, País, p. A2

O convite colombiano ao presidente Lula, para que apague o incêndio entre Bogotá e Caracas, realça a necessidade de um novo fórum permanente sobre crises na América Latina. A Organização dos Estados Americanos nunca esteve tão esvaziada e o momento é delicado. Vale lembrar, o último secretário-geral eleito para o organismo deixou o gabinete direto para a cadeia, sob acusação de corrupção. Hugo Chávez superou um golpe, esteve às voltas com greves, com a violência política e com uma oposição que tentou emparedá-lo. Agora descobriu, da pior forma, que a ''guerra total ao terror'' empenhada por Álvaro Uribe, logo ao lado, não só tem tentáculos longos como pode alcançá-lo no sofá de casa. O suposto seqüestro de Rodrigo Granda, o ''chanceler'' das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), por mercenários, em Caracas, se verdadeiro, é um passo novo e gravíssimo. Granda reapareceu algemado em Bogotá, e o governo Uribe chegou a admitir até ter pago por ele. Além disso, exortou os caça-recompensas de todo o mundo a desembarcarem no país para capturar guerrilheiros (só os de esquerda, diga-se de passagem).

Vincular a guerrilha ao terrorismo foi uma manobra americana. As Farc não são inocentes, mas estão longe de ser a Al Qaeda. Como esse tipo de gente não prima pelo respeito às leis, dá para imaginar o quão legais serão tais ações.

A estratégia de Uribe gera subprodutos perigosos, até porque o investimento bilionário dos EUA no Plano Patriota trouxe uma calma artificial à população. Afinal, as Farc continuam dominando a selva, o narcotráfico mantém as plantações de coca (resistentes ao herbicida lançado por aviões da CIA) e os paramilitares, cuja folha corrida era uma dor de cabeça, ganharam anistia disfarçada. Bandidos responsáveis por toda sorte de atrocidades não pagarão por seus crimes porque sua bandeira política é conveniente ao governo.

Se Hugo Chávez é um personagem quase caricato, com seu nacionalismo tacanho e tão ingênuo que é capaz de endossar politicamente as Farc (hoje uma quadrilha de traficantes), Uribe não fica atrás. O que os separa é o verniz Made in USA do segundo e a impressão de que seus assessores em Washington o fizeram crer que as fronteiras foram abolidas.