Título: PF decide retirar arrozeiros de reserva indígena em RR
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 02/04/2008, País, p. A3

Exército se recusa a dar apoio. Risco de conflito é considerado alto

Brasília

Sem o apoio do Exército e dentro de um clima de tensão, a Polícia Federal decidiu deflagrar, nos próximos dias, a operação de retirada de cinco grandes empresários rurais plantadores de arroz e 55 famílias de pequenos produtores que ainda se encontram dentro da reserva de 1,7 milhão de hectares da Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima.

Cerca de 150 agentes já estão em Boa Vista aguardando a chegada de outros 350 homens - entre eles pelo menos 100 integrantes da Força Nacional de Segurança - para iniciar uma ação, a primeira do gênero, que terá a duração de dois meses e só deverá se encerrar com a saída do último não índio da reserva em área contínua, onde vivem aproximadamente 15 mil índios das etnias macuxi, wapixana, ingarikó, taurepag e patamona.

O próprio delegado que chefia a Operação Pakamon, Fernando Segóvia, não esconde o clima de tensão gerado pela resistência imposta pelo líder dos arrozeiros, o pefeito de Pacaraima, Paulo Cesar Quartiero (PDT), que foi preso e depois solto, anteontem, durante confronto com os federais numa rodovia próximo a Boa Vista.

- Se precisar usar força, ela vai ser usada. Estamos preparados para o pior, mas vamos tentar resolver pelo que for melhor - disse o delegado, ao explicar que a polícia vai com sua tropa de choque e munida de armas e equipamentos adequadas para situações de distúrbios.

Segundo ele, a operação envolve pelo menos duas situações claras de risco: uma possível reação armada, com o uso de artefatos contra a Polícia Federal patrocinada por Quartiero e, caso a operação seja suspensa por uma "ordem judicial impensada", um conflito envolvendo os índios que são a favor da retirada contra brancos e índios contrários.

Segóvia alerta que cerca de dois mil guerreiros das cinco etnias estão de prontidão na reserva e dispostos a fazer a operação por conta própria caso a Polícia Federal não cumpra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que vigora desde junho do ano passado.

- Se a Polícia Federal não fizer a desocupação pode haver guerra e derramamento de sangue - disse Segóvia, que há mais de um ano vem buscando uma solução negociada para evitar o conflito.

Além da indenização financeira pela devolução da área indígena o governo, segundo ele, chegou a oferecer aos plantadores de arroz uma área titulada, de tamanho equivalente e com toda a infra-estrutura para produção, num local de livre escolha em Roraima.

Esquema perigoso

Segóvia diz que, além de inviabilizar as negociações, Quartiero organizou um perigoso esquema de resistência, montando barricadas em suas fazendas e contratando seguranças - entre eles supostos pistoleiros e índios trazidos da Venezuela -, num escancarado desafio ao governo, que é o fiador da operação. O delegado diz que Quartiero - apoiado pelos três senadores e sete dos oito deputados da bancada de Roraima no Congresso - quer criar um fato para conseguir na justiça a suspensão da operação.

Ele alerta, no entanto, que os riscos de um confronto sangrento seria ainda maior se a justiça interromper as ações. Todos os recursos jurídicos já foram julgados pelo STF. Um parecer do procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza esclarece que se o governo não cumprir a ordem o governo pode sofrer ação por crime de responsabilidade e se ver obrigado a pagar uma multa diária de R$ 600 mil.

- Há uma ordem do ministro da Justiça para desocupar e a decisão já tomada é pela execução. Quem não for índio ou não tiver autorização será retirado - afirmou.