Título: Farc recusam assistência francesa
Autor: Minner, Cecilia
Fonte: Jornal do Brasil, 09/04/2008, Internacional, p. A21

Falta de negociação prejudica popularidade de Sarkozy, mas é boa notícia para Uribe

As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) recusaram ontem a iniciativa unilateral do governo francês de dar assistência médica aos reféns mantidos pelos rebeldes. O fato prejudica a imagem dos governos envolvidos nas negociações e pode levar Ingrid Betancourt à morte, se for confirmado que ela tem hepatite B e leishmaniose, como dizem pessoas que tiveram contato com a ex-senadora na selva.

O estado de saúde de Ingrid, há seis anos em cativeiro, foi o principal motivo do envio de assistência médica. Seu filho, Lorenzo Delloye, afirmou na semana passada ter recebido a notícia de que a mãe necessita de uma transfusão de sangue. No entanto, a mãe da refém disse na segunda-feira que há a suspeita também de que ela não tenha hepatite B mas uma amebíase forte.

Na semana passada, o governo francês enviou um avião a Bogotá, com a esperança de que a guerrilha permitiria a missão médica na região amazônica de Guaviare. Existem versões de que foi lá que a refém franco-colombiana, de 46 anos, recebeu recentemente, cuidados médicos pelo seu estado de saúde.

Em comunicado, divulgado pela Agência Bolivariana de Imprensa, o secretário do Comité Central das Farc declarou:

¿ A missão médica francesa não procede, ainda mais por não ter sido acordada previamente. ¿ Não agimos sobre chantagens nem sobre pressão de campanhas midiáticas. Se no começo do ano o presidente Uribe tivesse liberado Pradera e Florida por 45 dias, tanto a Ingrid como os militares e guerreiros tinham recuperado a liberdade.

Para muitos, o seqüestro de Ingrid é praticamente uma sentença de morte, pois ela estaria muito doente. E se ela morrer nas mãos dos guerrilheiros, as próprias Farc pagarão o preço, alerta o professor de ciências políticas da UnB, David Fleischer:

¿ Ingrid é o maior trunfo das Farc. Se morrer, a imagem do grupo irá se deteriorar. Serão vistos somente como grupo de resistência, terroristas.

A diplomacia entre os envolvidos já está enfraquecida e, possivelmente, vai piorar com a resistência das Farc. Os índices de aprovação dos governos sofrerão interferência.

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, precisa, a qualquer custo, aumentar sua aprovação popular. E por não ter conseguido sequer levar uma consulta médica à refém franco-colombiana vai agravar sua situação. O presidente venezuelano, Hugo Chávez, que ajudou no fim do ano passado nas negociações que acabaram não dando certo de imediato, também vê sua popularidade cair.

¿ Tem muita influência sobre as Farc, e diante desse acontecimento, ele se encolheu ¿ relata David Fleischer, que faz um contraponto com o governo colombiano. ¿ Álvaro Uribe se valerá da situação para aumentar sua popularidade. Poderá alegar que tentou negociações com as Farc e não teve sucesso.

Para o presidente da Associação de Estudos do Caribe e professor da Universidade de Western Ontario, de Londres, Anton Allahar, o conflito que envolve as Farc é ideológico-político. Uma parte tem interesse em mantê-lo. A outra quer acabar com ele.

¿ As Farc querem que o governo colombiano reconheça sua visão sobre o conceito de pobreza e atenda suas necessidades. Enquanto isso não acontece, utilizam a violência para chamar atenção do mundo. E não retomarão a negociação até perceberem que há incentivo da comunidade internacional.

Isolamento

A forte resistência das Farc está ligada à morte, em 1º de março, do porta-voz da guerrilha, Raúl Reys. Ele foi assassinado, junto a outras 25 pessoas, numa operação do Exército colombiano em território equatoriano. Desde então, os guerrilheiros se escondem na selva, sem qualquer contato com o mundo.

¿ Acho que nem Chávez conseguiria uma negociação com as Farc. Estão na defensiva.