Título: Chávez estaria ajudando arrozeiros
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 08/04/2008, País, p. A5

Ministro da Justiça confirma que operação não tem volta. Em Roraima, aumenta a tensão

Brasília

O ministro da Justiça, Tarso Genro, acabou colocando na pauta ontem um assunto que a Polícia Federal tem evitado nos preparativos da operação de retirada dos não índio da Reserva Raposa/Serra do Sol: a suposta colaboração do governo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, com os arrozeiros e índios que se recusam a deixar a área. Eles ameaçam enfrentar com armas agentes da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança, que esta semana devem atacar os focos de resistência dentro da reserva.

¿ Há notícias de que chegaram a manifestar publicamente que estavam buscando o apoio de Chávez para sustentar seus interesses. São essas pessoas que dizem estar defendendo o território nacional ¿ disse o ministro. Genro acha que a Polícia Federal evitará um conflito sangrento, afirma que a operação Upatakon III não será mais adiada e afirmou que, se necessário, o governo usará as Forças Armadas para limpar a área, embora o Exército tenha se recusado a participar.

Laços de amizade

Um eventual envolvimento indireto da Venezuela com o conflito com conseqüências na relação diplomática entre os dois países, não é uma hipótese tão improvável como imagina o ministro. O principal líder do movimento contra a reserva em área contínua, o prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero (PDT) tem ligações de amizade com políticos venezuelanos, aos quais recorre sempre que há suspeita de alguma ordem de prisão em Roraima. Localizada a poucos quilômetros de Pacaraima, seu refúgio são fazendas em Santa Helena, no lado venezuelano. Apoiado por militares da reserva brasileiros, Quartiero tem em Chávez seu principal suporte na luta contra a interferência dos Estados Unidos na Amazônia por intermédio de Organizações Não Governamentais (ONGs) estrangeiras que, há décadas, atuam na região. Segundo o prefeito, caso o conflito se agrave, o governo venezuelano não titubearia em cortar a energia elétrica de Roraima, um estado que depende, em mais de 95%, da linha de abastecimento ligada a Usina de Guri, na Venezuela.

Há ainda outros dois ingredientes que estão sendo avaliados pelo setor de inteligência da Polícia Federal: dezenas de funcionários que trabalham nas fazendas de Quartiero dentro da reserva são índios venezuelanos ¿ sobre os quais, até agora o governo sabe apenas a procedência ¿ e há indícios da presença de militares daquele país na confecção de bombas caseiras, coquetel molotov, armadilhas (miguelitos e explosivos que podem ser colocados ao longo das estradas que cortam a reserva) e demais táticas de guerrilha que os arrozeiros prometem adotar para resistir à operação da polícia.

Homens com explosivos

Ontem, à tarde, a polícia prendeu em Pacaraima dois manifestantes que carregavam explosivos para tentar explodir o prédio onde fica o posto da Polícia Federal na fronteira com a Venezuela, conhecido como BV-8, onde mais de 100 pessoas protestavam contra a retirada dos não-índios da reserva. No carro de um dos rapazes, estacionado próximo ao prédio da Receita Federal, os policiais encontravam várias bombas à base de dinamite, detonadores e outros artefatos. A polícia não divulgou os nomes dos suspeitos, mas confirmou que estão recolhidos na delegacia da Polícia Federal de Pacaraima, cidade de oito mil habitantes onde se concentra um dos principais focos de resistência.

Apesar dos indícios e do clima beligerante em vários pontos da reserva, o ministro Tarso Genro disse confiar nas medidas preventivas adotadas pela Polícia Federal para evitar um conflito sangrento. Ele comparou a operação Upatakon III às ações do governo Fernando Henrique para controlar a onda de assassinatos no Acre e disse que, da mesma forma, o Estado brasileiro vai entrar para ocupar definitivamente à reserva, afastando da região os interesses estrangeiros.

¿ A operação tem a ver com a soberania do país. A Raposa/Serra do Sol não é território livre. É território indígena e pertence à União ¿ disse o ministro.