Título: Saudades do mata-mosquito
Autor: Sarney , José
Fonte: Jornal do Brasil, 11/04/2008, Opinião, p. A8

O Rio era no século 19 uma cidade insalubre, sujeita a epidemias que se repetiam com freqüência. Para piorar a situação, o porto recebia marinheiros contaminados, que traziam pestes.

O corpo diplomático não desejava residir nela, acompanhando Rio Branco, que, com medo de doença, morava em Petrópolis. O próprio presidente Rodrigues Alves vivia a maior parte do tempo em Guaratinguetá, sua cidade natal, também receoso das epidemias, o que não o defendeu de uma delas, a gripe espanhola da qual morreu em 1919. Afonso Arinos diz em sua biografia: "A morte reinava sobre a extensa capital (Rio) e ela aparecia à imaginação dos brasileiros e estrangeiros como uma enferma miserável, entendida em um luxuoso leito natural."

Rodrigues Alves fez tudo para torná-la saudável. Nomeou Pereira Passos prefeito, para fazer as obras urbanas, cais, canais coletores de alagados, avenidas que deram à cidade um aspecto aberto e agradável, e Oswaldo Cruz para comandar a política sanitária. Na palavra de Luis Edmundo, "a cidade chiqueiro foi transformada em cidade maravilhosa".

As epidemias que infestavam a cidade eram peste, cólera, varíola, febre amarela, malária e infecções intestinais pela poluição das águas potáveis.

Em 1909 Oswaldo Cruz zerou a morte por febre amarela. Em 1958 a Organização Panamericana de Saúde confirmou a erradicação do Aedes aegypti no Brasil, mas ele reapareceu em 67, no Pará, e chegou em 77 ao Rio. Tivemos uma primeira epidemia de dengue nessa nova fase em 1986-1987.

Em 1970 foi formada a Superintendência de Campanhas de Saúde (Sucam) que reorganizou os mata-mosquitos, criados e existentes desde o tempo de Rodrigues Alves (1903), espalhados pelo Brasil inteiro, visitando as residências, furando as latas, fazendo limpeza dos depósitos de água e borrifando as casas com inseticidas, para eliminar os focos de mosquitos.

Em 1990 a Sucam foi extinta. Por coincidência ou não, no mesmo ano os casos de dengue passaram de 100 mil, para atingir 360 mil em 98 e 430 mil o ano passado.

A epidemia do Rio está sendo mais visível porque é a mais importante cidade do Brasil e a taxa da mortalidade é grande. Mas o mesmo acontece no silêncio sofredor das capitais da Amazônia e do Nordeste.

Por que não voltar o mata-mosquito, um exército vitorioso? É saudosismo? Pode ser. Mas deu certo. Apresentei essa sugestão ao governador Sérgio Cabral e espero que o presidente Lula estude esta hipótese. Ela não será transitória nem só para este momento, mas permanente defesa da saúde do povo brasileiro.