Título: O ambicioso projeto dos federais
Autor: Quadros , Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 13/04/2008, País, p. A3

PF quer se transformar em referência mundial no setor. E tem até preocupações ecológicas

Vasconcelo Quadros

Brasília

A investigação sobre o dossiê que chamuscou as pretensões políticas da chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, deixou a retórica política para se tornar um teste à independência da Polícia Federal de 2022 projetada pelo diretor-geral da instituição, delegado Luiz Fernando Corrêa. Ele assumiu o cargo em setembro do ano passado, com o desafio de manter o combate à corrupção e transformar o DPF numa instituição de Primeiro Mundo ¿ eficaz e moderna na repressão ao crime, imune às interferências políticas e cuidadosa com os direitos humanos. A meta é audaciosa: gestão profissionalizada e autônoma, aperfeiçoamento do aparelho e dos métodos de repressão, prevenção contra novas modalidades criminosas e uma política de descentralização para corrigir as distorções regionais provocadas pelo próprio Estado que, ao longo da história, criou dois Brasis ¿ o moderno e o arcaico.

¿ A Polícia Federal será uma referência mundial em segurança pública ¿ garante Corrêa.

O perfil atual da nova polícia já apagou os últimos vestígios do período em que a segurança pública era monopólio dos quartéis e onde as polícias estaduais e, especialmente, a PF, cumpriam ordens dos generais de plantão. A Polícia Federal ainda enfrenta desafios para se consolidar como instituição independente. Mas é inegável que rompeu com todos os vínculos do passado e caiu nas graças da população ¿ as pesquisas mais recentes apontam aprovação popular superior a 70% ¿ e ganhou capilaridade nacional. Hoje a corporação tem influência na política de segurança de 14 dos 27 Estados brasileiros, formando uma espécie de república dos federais. Cedendo seus delegados para ocupar os cargos de secretário de Segurança, a PF é cortejada até por governos eleitos por partidos de oposição ao Palácio do Planalto, entre eles os dos tucanos Teotônio Vilela Filho, em Alagoas, e Yeda Crusius, no Rio Grande do Sul. Nesses dois estados, as pastas foram ocupadas, respectivamente, pelos delegados Paulo Rubin e José Francisco Mallmann.

Três do PT

Só três dos 14 secretários estaduais que saíram dos quadros da Polícia Federal são comandados por governadores do PT: Sergipe, onde a segurança está nas mãos do delegado federal Kércio Pinto; Pará, com Geraldo José de Araújo; e, Bahia, onde o titular é Antonio César Fernandes Nunes. A Polícia Federal emprestou delegados para outros nove Estados, todos eles comandados por governadores dos mais diferentes partidos: Amapá (Aldo Alves Ferreira), Amazonas (Francisco Sá Cavalcante), Ceará (Roberto Chagas Monteiro), Mato Grosso (Diógenes Curado), Espírito Santo (Rodney Rocha Miranda), Mato Grosso do Sul (Wantuir Jacini), Pernambuco (Servilho Silva de Paiva), Piauí (Roberto Rios Magalhães) e no Rio de Janeiro, onde o governador Sérgio Cabral entregou sua política de segurança ao delegado federal José Mariano Beltrame.

Para percorrer o longo trajeto até atingir o estágio de excelência, a polícia quer primeiro fazer o dever de casa. Está descentralizando sua experiência no combate ao crime, transferindo know-how para os Estados e focando sua atuação em regiões como a Amazônia, onde a combinação de problemas sociais e ausência do Estado se transformaram em demanda reprimida em delitos de toda ordem. A ação começa pelo combate aos crimes ambientais, a biopirataria, o contrabando de ouro e pedras preciosas, o tráfico de drogas e armas. Numa outra linha, também investe no desmonte dos esquemas de pistolagem que se enraizaram na região e, por obra do descaso do poder público, resultaram numa série de assassinatos envolvendo religiosos como vítima nos últimos anos.

¿ Podemos evitar casos como o da Dorothy. Temos a possibilidade de prevenir alguns tipos de crime com a simples presença da polícia na região ¿ explica Corrêa, ao se referir ao assassinato da missionária americana Dorothy Stang, morta em fevereiro de 2005 em Anapu (PA).

A preocupação com o futuro contempla detalhes como a obrigatoriedade de plantio de árvores para substituir a vegetação que a própria Polícia Federal acaba destruindo para abrir frentes de obras destinadas para ampliar sua própria estrutura.