O Estado de S. Paulo, n. 47895, 04/12/2024. Política, p. A10
PF flagra diálogos de lobista com assessor de desembargador
Pepita Ortega
Fausto Macedo
Em meio às investigações da Operação Sisamnes, a Polícia Federal (PF) encontrou diálogos entre um suposto lobista de sentenças e o assessor de um desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) que citam uma contabilidade. Em uma conversa, o advogado Rodrigo Vechiato da Silveira, assessor do desembargador Sebastião de Moraes Filho – afastado sob suspeita de vender decisões judiciais, segundo a PF – faz uma conta: “60 chefe – 20 menino – 42 imposto. Sobra 127 pra gente”. Os investigadores suspeitam que a mensagem pode se referir a pagamento de propina.
Moraes Filho é alvo da Operação Sisamnes, aberta no último dia 26 no encalço de Andreson Gonçalves, suspeito de atuar como lobista de sentenças e preso por ordem do ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Quando foi afastado das funções, em agosto, Moraes Filho reagiu enfaticamente. Ele disse que “nunca teve sua ficha funcional maculada em quase 40 anos de atividade”. O Estadão buscou contato com Rodrigo
Vechiato, mas não havia obtido resposta até a noite de ontem. Andreson é apontado como o chefe de um “verdadeiro e ousado comércio” de sentenças que teria chegado a gabinetes de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Vechiato também foi alvo da operação: sua casa foi vasculhada por policiais federais. Ele está sob monitoramento eletrônico de tornozeleira, teve de entregar o passaporte, está proibido de acessar prédios do Judiciário e sofreu bloqueio de bens de até R$ 500 mil.
MENSAGENS. O diálogo destacado pela PF ao pedir a abertura da Operação Sisamnes ocorreu entre Vechiato e o advogado Roberto Zampieri. Apontado pelas investigações como “lobista dos tribunais”, Zampieri foi assassinado a tiros em dezembro do ano passado, na frente de seu escritório, em Cuiabá.
Vechiato Advogado está sob monitoramento eletrônico e teve de entregar o passaporte
A Polícia Civil de Mato Grosso suspeita que a atuação do advogado em um processo no qual foi questionada a “amizade íntima” entre Zampieri e o desembargador Moraes Filho tenha sido o pivô da execução.
A partir do celular de Zampieri os investigadores encontraram
mensagens que inquietam o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, o TJ de Mato Grosso do Sul e também o STJ.
Zampieri atuava junto de Andreson, o qual chamava de “rapaz de Brasília”. Mensagens mostram que ambos tentavam interceder junto a assessores de ministros do STJ em busca de decisões favoráveis na Corte.
As conversas entre Zampieri e Vechiato (mais informações nesta página) foram incluídas em uma das hipóteses criminais investigadas na Operação Sisamnes. Segundo os investigadores, diálogos dos dois, entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2023, teriam como “foco o pagamento de vantagens econômicas indevidas, havendo vários indicativos de supostos pagamentos de propinas que também beneficiariam o desembargador Sebastião”.
A PF narra que, segundo os diálogos, Zampieri procurou Vechiato, em março de 2021, para intermediar o julgamento de um processo que tramitava no gabinete do desembargador Moraes Filho.
‘POSSÍVEL ACERTO’. Os investigadores apontam que as mensagens “aludem a um possível acerto prévio” entre o lobista e o desembargador, mas “por alguma razão, apesar da suposta combinação”, o recurso de Zampieri no caso não teria sido acolhido.
Nas conversas, Rodrigo Vechiato orienta Zampieri a preparar um novo recurso e se oferece para “organizar” a decisão. Em seguida, o advogado informou ao então assessor de Moraes Filho sobre “honorários” do caso. Segundo a PF, o termo é usado para se referir a “contratos com clientes que buscam interferências judiciais” perante os desembargadores do TJ-MT.
Dias depois, Zampieri voltou a falar com Vechiato indicando que já tinha elaborado o novo recurso. Informou, ainda, que já teria “conversado com o chefe” – como o advogado tratava o desembargador –, que “disse que iria reconsiderar a decisão”. •