Título: O presidente e a posteridade
Autor: Santayana , Mauro
Fonte: Jornal do Brasil, 27/04/2008, País, p. A2

O DISCURSO DO SENADOR Pedro Simon, sexta-feira, em que pede ao presidente Lula respeitar a Constituição ­ no caso da concessão da Floresta do Jamari à exploração privada ­ possibilitou àquela câmara alta um momento de seriedade, contrastando com a a mediocridade costumeira. O pronunciamento trata do desrespeito à Constituição por parte dos conselheiros do presidente, que o fizeram ignorar o artigo 49, inciso XVII, da Carta, que exige a aprovação prévia do Congresso Nacional à "alienação ou concessão" de terras de propriedade da União que excedam a 2.500 hectares. A lei, enviada ao Congresso, criando o Plano Anual de Outorga Florestal, não pedia essa autorização. Pedro Simon apresentou emenda, aprovada pelo Congresso, exigindo o cumprimento do mandamento constitucional. O presidente vetou o dispositivo. No meio tempo transitou, no juízo federal, pedido de liminar, do Ministério Público, contra a concessão. A desembargadora Selene Maria de Almeida, do TRF, em Brasília, concedeu a liminar, paralisando o processo de concessão da Floresta de Jamari. O presidente tem sido vítima de alguns de seus conselheiros. Amparados pela grande popularidade do chefe de governo, fundada nos êxitos de sua administração, eles têm caído na tentação centralizadora e neoliberal, ao aliar-se a uma oposição comprometida com as oligarquias conservadoras e interesses antinacionais. Com um Parlamento desacreditado (com as exceções que se contam nos dedos), o Poder Executivo tem desprezado a prudência em muitas questões. Uma delas é a da soberania nacional. Parte dos militantes do PT, recrutados nos pátios de produção das indústrias multinacionais de São Paulo, parece contaminada pelo espírito cosmopolita do maior Estado da Federação, que sempre teve mais contatos culturais e econômicos com o exterior do que com o resto do país. Daí sua preocupação menor com as fronteiras e com a Amazônia, sempre vista como um distante deserto verde. Essa posição não se limita à entrega de porções da floresta amazônica, por 40 anos renováveis, a empresas privadas que podem, pela lei, obter empréstimos internacionais oferecendo as florestas como garantia (o que transforma a concessão em alienação). Ela se revela também no desprezo ao pacto federativo. O fato de que as terras pertençam à União não retira o poder dos governos estaduais sobre o espaço geográfico de sua jurisdição. Daí o natural protesto do governo de Roraima contra a demarcação em área contínua da Reserva Raposa/Serra do Sol. Na mesma linha de centralismo autoritário, herdado do natural orgulho do poder econômico de São Paulo, a Executiva Nacional do PT decidiu vetar a aliança do partido com o PSB e o PSDB na disputa eleitoral de Belo Horizonte. Os petistas da cidade querem a coligação, como a querem os filiados do PSDB e do PSB. É um assunto municipal, que deve ser decidido pelos membros dos diretórios partidários do município. Mas, com base no argumento de que a aliança pode vir a favorecer um candidato mineiro à Presidência, a Executiva, sob o domínio de paulistas, pretendeu proibi-la. Nesse caso em particular, não se deve registrar só a presunção dos dirigentes nacionais do PT. Ele revela também comovente ingenuidade política. O veto, que fortalecerá mais ainda a aliança, poderá dificultar ao PT uma ocupação da chapa com seu candidato a vice-prefeito, mas não impedirá que a força política de Fernando Pimentel e de Aécio Neves prevaleça nas urnas. Nas eleições majoritárias, as personalidades costumam ser mais poderosas do que os partidos. O presidente Lula é homem moderado e curtido pela experiência política pessoal. Tem a consciência de que o PT nasceu de seu prestígio popular e cresceu sob sua sombra. Sabe ainda mais: que só uma política ampla de alianças, com um programa de centro democrático, lhe possibilitou chegar ao Planalto. Assim sendo, tanto no caso da Floresta Jamari como no da aliança tripartite de Belo Horizonte, atuará com prudência e habilidade. Ele tem um compromisso com o país e seu futuro. O menino do sertão sabe que não pode ser menor, diante da posteridade, do que foram os grandes construtores da pátria, que conquistaram e preservaram, com o sangue e a diplomacia, o país que temos.

O presidente tem sido vítima de alguns de seus conselheiros

ELEIÇÕES 2010

É pra valer?

Lula percorre o país ao lado de Dilma, a mãe do PAC. Sua possível candidatura não é consenso entre aliados Márcio Falcão BRASÍLIA A resistência a uma pré-can- didatura da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, à sucessão presidencial de 2010 é discreta entre os principais partidos da base aliada. A avaliação dos governistas é que o empenho do presidente em dar fôlego à ministra faz parte de uma estratégia para garantir espaço ao PT na disputa e, de quebra, incomodar a oposição. Para a base, no entanto, este é um projeto exclusivo do presidente e dos petistas e que não deve contar, necessariamente, com o aval dos 14 partidos alinhados com a atual gestão do Palácio do Planalto. Os líderes partidários da base não se posicionam contra uma aposta em Dilma, mas são tímidas as demonstrações de confiança de que a ministra poderá um dia receber a faixa presidencial. O principal argumento levantado é a união do perfil administrativo com a pouca desenvoltura nas negociações partidárias devido à mistura de temperamento explosivo e inabilidade política. ­ A ministra é uma figura política interessante, mas ainda precisa ter a imagem trabalhada. Para convencer o eleitor não basta ter domado o principal projeto de investimentos do governo - afirma o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), que no início do ano presenteou Dilma com um bambolê, uma referência para a ministra ter mais jogo de cintura. Ex-guerrilheira, Dilma evita mostrar intimidade com o presidente, embora ele a ouça e respeite. A ministra, mineira por nascimento, gaúcha por adoção, também não gosta de receber críticas, mas não mede as palavras na hora de analisar alguma situação. Por isto, não é unanimidade nem mesmo dentro do PT. Os petistas não reconhecem isto publicamente, mas pelos corredores do Congresso fica evidente que há desconforto de alguns correligionários em confirmar apoio a Dilma em 2010. A implicância é porque a ministra só se aproximou do presidente Lula em 1999, depois que o PDT deixou o governo gaúcho. A favor da ministra, no entanto, pesa o fato dela não ser ligada fortemente a nenhuma corrente do PT. ­ Em todo o partido cada um busca seu espaço. Agora, não podemos negar que a ministra Dilma está se tornando cada vez mais conhecida, mais popular ­ defende o líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE). ABr