Título: Espírito Santo expulsa a corrupção
Autor: Mazzini, Leandro
Fonte: Jornal do Brasil, 14/04/2008, País, p. A5

Má gestão do Estado deixou marcas, que, aos poucos, ficam no passado.

O governador do Espírito Santo tem pressa. De desenvolvimento. Aos 50 anos, Paulo Hartung passou os últimos cinco anos rearrumando a economia do Estado ¿ vítima de sucessivas administrações desastradas, entregues ao descaso. Hartung implantou um modelo de gestão que pôs em ordem as contas do Estado, reorganizou o organograma administrativo, e, principalmente, deu novos rumos a uma economia apontada como morta na região mais rica do país, o Sudoeste ¿ em que até pouco tempo atrás, Minas, São Paulo e Rio ofuscavam o Estado. As exportações aumentaram, os índices sociais melhoraram e o governador se cacifou no PMDB. Com a população, essencialmente, ressalta. Tanto que já prepara o caminho para o sucessor e tentará voltar ao Senado, em 2010.

Muito se fala da Região Sudeste a força motora da economia. No entanto, o Espírito Santo é sempre ofuscado por Minas, São Paulo e Rio. Como mudar isso?

¿ O Estado tem uma história muito peculiar. Com a chegada dos portugueses ao Brasil, nós tivemos, assim, praticamente 300 anos de muito pouca atividade econômica no Espírito Santo. Em algum momento dessa baixa atividade, uma relação direta com a proteção das riquezas de Minas Gerais. Depois o Estado recebeu uma leva de outros imigrantes europeus e praticamente nós tivemos uma coisa, assim, de 100 anos ¿ de 1840/50 ¿ onde você tinha uma predominância da produção do café. O Estado viveu basicamente da monocultura do café. Uma produção com muita quantidade, baixa qualidade, uma economia também muito atrasada. A diversificação econômica do Estado é muito recente.

O que mudou?

¿ A principal marca dessa diversificação vem da construção do Porto de Tubarão, já na década de 60. Ali que foi montado um terminal portuário para dar vazão ao minério das Minas Gerais, que até então era exportado em pequenas quantidades no porto do centro de Vitória. A partir daí o Estado evolui na agricultura, diversifica a sua agricultura com outras atividades e diversifica como provedor de serviços e também na sua atividade industrial.

Não foi incompetência dos governos anteriores?

¿ Eu sucedi um período difícil, em que o Estado viveu grandes dificuldades. De lá para cá a gente vem trabalhando para dar conta do recado. Nós instituímos um choque ético, com duras medidas, de combate à corrupção, aos desvios, à sonegação de impostos, que era muito grande no nosso Estado. Implantamos na máquina as ferramentas de gestão que são consagradas nas empresas privadas do mundo inteiro, o planejamento estratégico, toda a estrutura de acompanhamento de projetos prioritários, o foco, ou seja, você ter com clareza quais são seus objetivos, quais são as suas metas a serem perseguidas. Há muito para fazer, porque aqui nós temos que cuidar do presente com uma visão estratégica de futuro, mas nós temos um acerto de contas para fazer com o passado de desorganização que o Estado viveu. Temos que fazer e não adianta chorar.

O que ainda está pendente?

¿ Melhorar a saúde, a infra-estrutura, a educação, a segurança pública, os programas sociais do governo de uma forma geral e do sistema prisional. Não só cuidando das demandas do presente ¿ isso não basta ¿ mas acertando as contas com o passado em que o dinheiro que era para a saúde, para segurança pública, para educação, enfim, foi para o ralo do desvio. Aqui estamos andando para a frente, já demos muitos passos para a frente, e criamos base para continuar.

O Espírito Santo está passando a ser a nova Bolívia para o Brasil como fornecedor de gás?.

¿ Nós não podemos dispensar o fornecimento de gás da Bolívia. Nós temos que, diplomaticamente, manter essas relações e continuar sendo um consumidor importante de gás na produção do país vizinho. O que nós precisamos é somar o Espírito Santo à Bolívia. Somar essas novas descobertas de Santos ao Espírito Santo e à Bolívia porque é uma energia de boa qualidade.

O senhor estima então que o Espírito Santo bata essa produção da Bolívia nessa exportação de gás para outros Estados.

¿ A Bolívia está em 27 milhões de metros cúbicos/dia, e nós devemos chegar, no fim do ano que vem, a aproximadamente 20 milhões.

Mas necessariamente o Brasil depende do gás também do Espírito Santo.

¿ Nós estamos nos tornando o principal fornecedor do Brasil. O principal fornecedor interno vai se tornar o Espírito Santo nos próximos meses.

O Espírito Santo é o segundo maior produtor de petróleo do país. E nós esbarramos agora, na reforma tributária, nessa polêmica do recolhimento na origem, dos 2%. Qual é a sua posição a respeito? O senhor teme perder receitas?

¿ Nós somos a favor da reforma tributária. A estrutura legal que regula os tributos no país, na nossa visão, é uma estrutura arcaica, que precisa ser modernizada. Um país em desenvolvimento não pode ter a carga tributária que nós temos. Precisamos fazer agora é conversar muito, articular e conseguir apresentar ao Congresso Nacional um conjunto de emendas e é o que nós vamos fazer ¿ nós, o Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul. O projeto que está lá é inviável, por exemplo, para a economia do Espírito Santo. Nós perdemos mais de 20% da nossa receita de ICMS, mas eu não tenho nenhum susto com isso. Nenhum Estado, nenhum ente federado, tem capacidade de perder mais de 20% da sua receita e continuar de pé. Nós, governadores, entendemos que nós deveríamos depender o mínimo possível de um fundo de ressarcimento. E que esse ressarcimento fosse constitucionalizado, não ficasse como a Lei Kandir.

Ou seja, uma PEC.

¿ Dentro da PEC, tem uma emenda que trabalha essa questão. É por aí. Você me perguntou se os 2%, ou 4%, que não se sabe ainda, se o interestadual vai ser 2%, 3% ou 4%. Tem várias propostas pelo Brasil. São Paulo está propondo 4%, a gente gosta desse número. Mas não sabemos onde vamos chegar com a alíquota interestadual. Mas a proposta é que o que ficar incida sobre petróleo, que é uma proposta que o Rio de Janeiro fez e ela beneficia o Espírito Santo. Tem que olhar ¿ aí estou respondendo concretamente ¿ o conjunto, porque essa proposta pode isolar o Rio e o Espírito Santo nesse debate nacional. Então vamos procurar alguma coisa que ao mesmo tempo coloque os interesses dos Estados produtores de petróleo mas que não nos isole.

Esse fundo de compensação ainda é muito polêmico. O senhor acredita que pode dar certo?

¿ O que foi para o Congresso é muito frágil. O ministro (da Fazenda, Guido) Mantega reconheceu que precisa definir melhor, estabelecer com clareza o que vai ser esse fundo de ressarcimento e quais são os recursos que serão colocados lá. Hoje , naquela proposta que foi, você teria o dinheiro da Lei Kandir, que já é repassado para os Estados, então está fazendo uma coisa com chapéu não-próprio, e o dinheiro do IPI das exportações, que já é repassado para os Estados.

Quais são as principais obras do PAC programadas para o Espírito Santo?

¿ Hoje nós temos alguns gargalos ao nosso desenvolvimento. Logo no início do meu primeiro governo nós tínhamos um problema de fornecimento de energia. Nós éramos dependentes do linhão do Rio de Janeiro. Era um fornecimento único. O presidente Lula e a ministra Dilma (Rousseff, da Casa Civil), na época ministra de Minas e Energia, determinaram a construção desse linhão. Esse linhão já foi inaugurado. Foi um passo importante para o abastecimento de energia do nosso Estado, que era um problema crítico. Um outro problema crítico era a dragagem do porto de Vitória. Não está concluída, mas está praticamente toda realizada, vai ser feita a batimetria agora, e algumas obras complementares, e nós já vamos ter a instalação de um novo modelo de sinalização na entrada do canal de evolução do porto de Vitória. O aeroporto é uma obra que está muito atrasada. Nós temos mais dois problemas graves que estamos dialogando com o Ministério dos Transportes e também com o governo federal. Um é a BR-101. Com todo esse desenvolvimento que o Estado está vivendo agora, o tráfego, na BR-101, espa muito acima das suas possibilidades. Nós precisamos da duplicação ou pelo menos da ampliação da terceira pista em alguns trechos e assim por diante, não abaixo do razoável.

Como está a coalizão PT-PMDB no Espírito Santo?

¿ Aqui a parceria é antiga. Eu fui prefeito da capital, na época não tive o PT dentro do governo, mas tivemos um bom relacionamento. Fiz o meu sucessor, o Luiz Paulo Veloso Lucas, do PSDB, ficou oito anos na prefeitura, ele foi sucedido pelo PT, pelo João Carlos Coser, e desde a posse do João Carlos o trabalho da prefeitura e do governo é um trabalho que tem muito entrosamento, muita coordenação. O PT não participou da minha primeira campanha de governador, mas veio para o governo depois que eu tomei posse e participou desta segunda campanha e está no governo, tem secretaria no governo. Aqui nós temos um caso um pouco diferente do Brasil. Nos dois governos que eu tenho a honra de liderar, os dois têm quadros do PSDB, do PT e de outros partidos ¿ portanto, uma coligação ampla ¿ nos ajudando nessa tarefa de reestruturar o nosso Estado.

Essa coalizão pode se repetir em 2010

¿ Acho muito cedo para trabalhar 2010. É legítimo que o presidente queira fazer o sucessor. Acho que vamos ter como falar disso em algum momento no fim de 2009.