Feridas e prejuízos causados pelo 8 de Janeiro

Correio Braziliense, n. 22575, 08/01/2025. Cidades, p. 13

Arthur de Souza
Maria Eduarda Lavocat


Os atos antidemocráticos ocorridos em 8 de janeiro de 2023 causaram prejuízos expressivos aos cofres públicos, com danos estimados em, aproximadamente, R$ 24 milhões, além de trazer uma sensação de insegurança ao brasiliense. Os vândalos invadiram as sedes dos Três Poderes e destruíram centenas de peças, obras de arte e objetos raros. Muitos foram roubados por extremistas que protestavam contra o resultado das eleições de 2022.

O Supremo Tribunal Federal (STF) foi a instituição mais afetada, com custos de recuperação avaliados em R$ 12 milhões. Desse valor, R$ 8,6 milhões referem-se a 951 itens furtados, quebrados ou completamente destruídos e R$ 3,4 milhões foram destinados à reconstrução do plenário, substituição de carpetes, vidros da fachada e reparos estruturais. Entre os bens perdidos, o STF teve 106 itens históricos, de valor inestimável, destruídos, incluindo esculturas e móveis que não podem ser restaurados ou substituídos. O Palácio do Planalto registrou a segunda maior conta, estimada em R$ 8 milhões. Peças, por exemplo, como o quadro As Mulatas, de Di Cavalcanti, foram atacadas e, nesta quarta-feira (8/1), estão de volta ao lugar de destaque no palácio.

Na Câmara dos Deputados, o prejuízo foi de R$ 2,7 milhões. Cerca de R$ 1,4 milhão foi destinado à restauração de 68 bens do acervo cultural, incluindo pinturas, esculturas e painéis, enquanto R$ 1,2 milhão foi utilizado para reparos em persianas, carpetes, sistemas elétricos e hidráulicos, vidros e o sistema de detecção de incêndios. No Senado Federal, os prejuízos chegaram a R$ 1,4 milhão. Desse total, R$ 483 mil foram aplicados na recuperação de bens do museu, como a tapeçaria de Burle Marx, e R$ 900 mil na recuperação do edifício-sede.

O Palácio do Planalto começou a receber, na segunda-feira (6/1), as obras restauradas após os ataques de 8 de janeiro. Ao todo, 21 peças danificadas pelos invasores passaram por um longo processo de recuperação e serão novamente expostas no local. Três delas foram entregues nesse carregamento: além de As Mulatas, uma escultura em madeira, feita pelo artista Frans Krajcberg; e a escultura O Flautista, de Bruno Giorgi.

Os itens foram restaurados por uma equipe da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em laboratório montado no subsolo do Palácio do Alvorada, residência oficial da Presidência da República.

Na segunda-feira (6/1), o Planalto recebeu o relógio histórico de Balthazar Martinot, quebrado durante a invasão. O objeto foi presenteado pela Corte Francesa a Dom João IV, rei de Portugal. O relógio foi enviado à Suíça e restaurado no país europeu. O governo apresentará oficialmente os itens durante uma cerimônia, nesta quarta-feira (8/1), em memória dos dois anos dos atos golpistas.

Personalizado

Mestre em ciência política pela Universidade de Brasília (UnB), Leandro Gabiati ressaltou que o 8 de janeiro foi um episódio que marcou, de fato, todos os brasilienses. "É algo que fica registrado na memória da população, com toda certeza, pois os cidadãos do DF têm essa particularidade de presenciarem, de forma mais personalizada, todos os acontecimentos de âmbito nacional", comentou.

Além dos recentes ataques aos Três Poderes, o especialista pontuou que a capital federal também foi palco de outros movimentos que são marcantes para a história recente de Brasília. "O fato de estarmos no centro político do Brasil, fisicamente, nos faz vivenciar de forma diferente aos outros brasileiros, tendo uma percepção mais íntima", observou.

André César, cientista político pela Unicamp, acrescentou que a reação os atos de 2023 foi simbólica e que, no momento inicial, todas as lideranças da República se uniram para responder aos ataques. "É difícil, para quem está no comando dos Poderes, dizer que é algo que 'passou' e que não é preciso ficar mais pensando no assunto", avaliou.

De acordo com ele, "golpe é golpe", e é preciso sempre jogar dentro das regras da democracia. "Por isso, acho importante julgar todos os responsáveis por qualquer ato, no rigor da lei, para dar exemplo a quem puder pensar em cometer algo semelhante, no futuro", enfatizou. Murilo Medeiros, cientista político da UnB, com especialização em democracia, direito eleitoral e poder legislativo, considerou que os ataques de 8 de janeiro fortaleceram a democracia brasileira.