Título: Irã e Síria selam aliança anti EUA
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Fonte: Jornal do Brasil, 17/02/2005, Internacional, p. A7

Casa Branca pressiona Damasco para retirada de tropas do Líbano e Teerã promete abater aviões-espiões em território iraniano

AFP Libaneses carregam o caixão do ex-primeiro-ministro Rafik Hariri, durante o enterro de ontem

TEERÃ e DAMASCO - Em alusão clara à atual política externa americana, os governos do Irã e da Síria anunciaram ontem que agora são parte de uma frente para enfrentar ''desafios e ameaças comuns''.

- Estamos prontos para ajudar a Síria em todos os terrenos - disse o vice-presidente iraniano, Mohammad Reza, em Teerã, depois do encontro com o primeiro-ministro sírio, Naji al Otari.

- O momento é delicado e importante, especialmente porque a Síria e o Irã enfrentam vários desafios e é necessário construir uma frente comum - disse o premier sírio.

A reunião ocorreu em meio às tensões do enterro do ex-primeiro-ministro libanês, Rafik Hariri, assassinado em um atentado em Beirute, na segunda-feira. A oposição libanesa e os Estados Unidos acusam a Síria de estar por trás do ataque. Ao mesmo tempo, Washington também afirma que o regime sírio apóia o terrorismo, em especial a insurgência iraquiana. A embaixadora americana em Damasco, Margaret Scobey, foi chamada de volta na terça-feira ''para consultas''.

A Síria mantém 16 mil soldados no Líbano desde o conflito no país, que durou 15 anos e terminou em 1991, envolvendo também Israel e palestinos. Não só isso, Damasco, segundo especialistas, controla o governo do presidente libanês, Émile Lahoud, e não tem embaixada em Beirute, por considerar o Líbano parte da ''Grande Síria''.

Por outro lado, a Casa Branca afirma que está disposta a impor novas sanções à Síria, caso Damasco não obedeça à decisão da ONU, que exige a retirada das tropas do Líbano.

- O assassinato de Hariri deve ajudar a tornar o país livre e independente, o que inclui a aplicação da resolução 1559 do Conselho de Segurança da ONU - disse ontem o subsecretário de Estado americano, William Burns, após exigir o repatriamento ''total e imediato''.

Em Berlim, o ministro das Relações Exteriores do Irã, Kamal Kharrazi, ficou surpreso ao ser abordado por repórteres sobre o fato de Teerã ter anunciado a aliança com o regime de Bachar al Assad.

- Não estou a par de que o Irã formará uma frente com a Síria. De onde saiu isso? - perguntou Kharrazi a um jornalista. - É certo que Teerã e Damasco têm interesses semelhantes, mas isso não significa que será formada uma frente comum contra ninguém. Os problemas são solucionados por meio do diálogo, entre todos - acrescentou o ministro.

Kharrazi está na Alemanha para se encontrar com o ministro das Relações Exteriores alemão, Joschka Fischer. A reunião é parte das negociações de Teerã com a União Européia sobre o programa nuclear iraniano.

- Vamos continuar até chegar a uma solução satisfatória para todos - afirmou o representante do Irã.

Ontem também, uma forte explosão foi ouvida no Sul do país persa. Várias versões foram divulgadas ao longo do dia e houve quem suspeitasse de um teste nuclear ou de um ataque da bateria antiaérea iraniana contra aviões-espiões americanos, que estariam fotografando instalações atômicas na região. Segundo Israel, o regime iraniano terá à disposição um artefato militar nuclear em seis meses. Teerã nega que esteja desenvolvendo um projeto deste tipo e afirma que o programa é pacífico e atende apenas as necessidades energéticas do país.

O jornal The Washington Post publicou, no domingo, que o Pentágono estaria enviando aviões-espiões não-tripulados ao território iraniano.

- Se algum deles chegar perto, com certeza vai encontrar nossa artilharia pela frente e será abatido. Temos o equipamento necessário para isso - afirmou ontem o chefe da Inteligência iraniana, o ministro Ali Yunesi.

Em meio à tensão, Moscou confirmou que está negociando a venda de mísseis antiaéreos russos à Síria.

De acordo com o ministério da Defesa da Rússia, o sistema é do tipo Strella, e é composto de mísseis terra-ar montados sobre veículos militares, que não podem ser utilizados de forma portátil, ou seja, carregados no ombro.

Ó governo israelense reclamou da negociação. Segundo o premier israelense, Ariel Sharon, o Kremlin garantiu que as armas não cairiam nas mãos de ''terroristas''.