O Estado de S. Paulo, n. 47932, 10/01/2025. Política, p. A6
No TJ-MT, até servidores ganham 3 vezes mais que ministros do STF
Pepita Ortega
Fausto Macedo
Funcionários do tribunal receberam mais de R$ 100 mil em dezembro. Corte prometeu investigar.
Servidores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) em cargos de direção ou coordenação ganharam mais de R$ 100 mil por mês em dezembro, ou seja, quase o triplo do que recebem os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A remuneração de um ministro é, oficialmente, R$ 44 mil brutos, teto do funcionalismo, ou cerca de R$ 32 mil, descontado imposto na fonte.
O Estadão mapeou os salários de mais de 5 mil servidores da Corte estadual no segundo semestre de 2024. Nesse período, funcionários administrativos (menos graduados), como analistas e técnicos judiciários, receberam até R$ 70 mil líquidos em um mês. O maior valor registrado em holerites em dezembro bateu em R$ 106 mil.
Levantamento O ‘Estadão’ mapeou o salário de mais de cinco mil servidores do Tribunal de Mato Grosso
Executivos de importantes corporações recebem no topo da carreira entre R$ 41 mil e R$ 84 mil, a depender da área de atuação (finanças e contabilidade, tecnologia, mercado financeiro, marketing, jurídico), segundo dados da consultoria de recrutamento Robert Half.
Depois de ter sido procurado pela reportagem do Estadão para comentar os dados, o tribunal informou que seu presidente, desembargador José Zuquim Nogueira, resolveu instaurar uma comissão especial para “apuração dos fatos relacionados ao tema”.
Em dezembro, a então presidente do TJ de Mato Grosso, desembargadora Clarice Claudino da Silva, mandou pagar auxílio-alimentação de R$ 10 mil a todos os magistrados e de R$ 8 mil aos servidores. O benefício turbinado ficou conhecido como “vale-peru” ( mais informações nesta página). Depois que o Estadão revelou o pagamento, a desembargadora pediu aos colegas e aos servidores a devolução do dinheiro, diante do “momento desafiador” enfrentado pelo Tribunal.
O contracheque dos funcionários do Judiciário de Mato Grosso é dividido em duas partes. Uma chama “folha corrente” e a outra, “folha complementar”, na qual cabem penduricalhos, como adicional por tempo de serviço e abono de permanência. A reportagem levantou os 20 maiores salários “correntes”, pagos em dezembro de 2024, e os 20 maiores contracheques “complementares”.
Um nome desponta em comum na lista de maiores salários correntes e complementares: o da diretora-geral do TJ, Euzeni Paiva de Paula. Sua folha corrente registra R$ 48,1 mil líquidos em dezembro. A folha complementar indica mais R$ 40 mil, somando R$ 88,1 mil. A remuneração-base da diretora é de R$ 23.255,91. A reportagem solicitou manifestação de Euzeni, mas não obteve resposta.
OS MAIORES. Além de Euzeni, 23 servidores registraram, em dezembro, ambos os contracheques – 13 na listagem das maiores folhas complementares e dez na relação das maiores folhas correntes. No “top 3” dos maiores salários estão a coordenadora de Gestão de Pessoas do TJ, Karine Moraes Giacomeli de Lima; a diretora da Secretaria da 3.ª Câmara de Direito Privado, Daniella Del Nery Pereira; e a coordenadora de magistrados, Renata Souza Carvalho
Tirapelle. Respectivamente, em dezembro, elas foram contempladas com R$ 106,8 mil (R$ 39,8 mil da folha corrente e R$ 67 mil da folha complementar); R$ 99,7 mil (R$ 45,2 mil da folha corrente e R$ 54,4 mil da folha principal); e R$ 92,1 mil (R$ 64,7 mil da folha corrente e R$ 27,4 mil da folha principal).
Via e-mail para a assessoria de imprensa do TJ, a reportagem pediu manifestação das três servidoras, mas não obteve resposta.
Analisando somente as fo
lhas de pagamento “corrente”, que expõem as remuneraçõesbase dos servidores, mas não todos os penduricalhos que eles recebem, o Estadão levantou que 37 funcionários do TJMT ganharam mais que os ministros do STF (R$ 44 mil) no último mês de 2024.
FUNÇÕES. Um analista judiciário, por exemplo, faz pesquisas legais e participa da redação de peças processuais – minutas de despachos, decisões e votos. Eles também podem administrar a divisão dos trabalhos nas varas ou gabinetes de desembargadores. Servidores administrativos podem ainda ser os escreventes, que apoiam os juízes em audiências, nos registros e atos cartorários.
Os contracheques dos servidores administrativos, alguns em cargos de confiança, pesquisados pelo Estadão, mostram
que os salários foram encorpados pela concessão de vantagens pessoais. A rubrica corresponde à soma de valores pagos a título de penduricalhos como vantagem pessoal nominalmente identificada (VPNI), adicional por tempo de serviço, quintos, décimos e vantagens decorrentes de sentença judicial ou extensão administrativa, abono de permanência.
HOLERITES. Em dezembro, o Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado tentou acessar o detalhamento dos holerites, após constatar que alguns servidores estavam recebendo mais que o subsídio pago a magistrados do próprio TJMT. Dirigentes do sindicato dizem que não conseguiram os dados. O pedido esbarrou em uma recusa formal da desembargadora Clarice Claudino da Silva, que presidia o tribunal à época. •