Valor Econômico, 05/05/2020, Política, p. A6

Braço direito de Ramagem assume PF e troca comando no Rio
Fabio Murakawa
Matheus Schuch


O presidente Jair Bolsonaro empossou ontem o delegado Rolando Alexandre de Souza diretor-geral da Polícia Federal. Pouco depois, em um dos seus primeiros atos, Souza trocou o comando da Superintendência do órgão no Rio, foco de interesse da família Bolsonaro.

A posse, em uma cerimônia fechada no gabinete presidencial, ocorreu cerca de dez minutos após a publicação de uma edição extra do “Diário Oficial da União” (DOU) com a nomeação de Rolando.

Ele era tido como braço direito de Alexandre Ramagem, o preferido do presidente para chefiar a PF, na Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Sua indicação dissipa temores de que Bolsonaro tensionaria ainda mais o ambiente com o Supremo Tribunal Federal (STF), que por liminar expedida pelo ministro Alexandre de Moraes barrou a indicação de Ramagem na semana passada.

Esses temores cresceram no domingo, quando Bolsonaro deu sinais de que não havia desistido de nomear Ramagem, apesar da decisão do Supremo. Na tarde de ontem, interlocutores do governo, da Polícia Federal e do Judiciário ainda se perguntavam se Rolando exercerá um “mandato tampão”.

Alguns acreditavam que Ramagem, que se tornou próximo do clã Bolsonaro durante a campanha presidencial de 2018, será alçado ao comando da PF tão logo seja viável. Isso depende, segundo as fontes, de uma decisão do plenário do Supremo para derrubar a liminar de Moraes. Ou do avanço do inquérito aberto pelo ministro Celso de Mello a pedido da Procuradoria-Geral da República para apurar as denúncias feitas pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, de que Bolsonaro tenta interferir em investigações da PF.

Moro depôs no sábado na PF em Curitiba. Caso não se comprovem as denúncias, estará reaberto o caminho para que Ramagem seja novamente nomeado. Alguns ministros do Supremo, nos bastidores, defendem justamente que é necessário aguardar o resultado das investigações antes de rever a decisão de Alexandre de Moraes.

Porém, na opinião de algumas dessas fontes, o tempo joga a favor de quem está na cadeira, e a liderança de Rolando pode se tornar em breve um fato consumado. Portanto, quanto mais demorarem as investigações, ou uma decisão colegiada do STF, mais firme no posto estará o atual diretor-geral.

O novo comandante-geral da PF era secretário de Gestão e Planejamento da Abin. “Doutor Rolando”, como é conhecido, é bem conceituado entre os colegas. Ele foi superintendente da PF em Alagoas antes de ser levado à Abin por Ramagem, no ano passado. Alguns colegas dizem que ele tem “histórico arrumado” e “melhores qualificações que Ramagem”, apesar de mais jovem e menos experiente.

Na Abin, sua função era meramente administrativa. Mas, segundo fontes no Planalto, é justamente a parte administrativa uma das mais elogiadas da gestão Ramagem na agência, mérito compartilhado com o ex-subordinado.

Ontem, começou a se espalhar entre integrantes da PF a notícia de que Rolando decidiu trocar o superintendente no Rio - algo que Bolsonaro havia tentado fazer à revelia do antecessor, Maurício Valeixo.

O atual superintendente, Carlos Henrique Oliveira, foi convidado para ser o diretor-executivo da PF, o número 2 na hierarquia da corporação, segundo o jornal “O Globo”. A notícia fez disparar uma série de congratulações de colegas em grupos de WhatsApp, sem que Oliveira se manifestasse.

Também ontem, o vice-presidente Hamilton Mourão criticou o que considera uma interferência de Poderes em atribuições do Executivo. Em entrevista à Rádio Gaúcha, Mourão citou a suspensão da posse de Ramagem e a proibição da expulsão de diplomatas venezuelanos do país, ambas determinadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“Eu, é minha opinião, julgo que cada um tem que navegar dentro dos limites da sua responsabilidade. Então, os casos mais recentes, que foi da nomeação do diretor-geral da Polícia Federal, a questão dos diplomatas venezuelanos, eram decisões que são do presidente da República”, argumentou o vice-presidente.