Correio Braziliense, n. 22600, 01/02/2025. Política, p. 3
O governo é coadjuvante nestas eleições
Maria Beatriz Giusti
Com os novos presidentes da Câmara e do Senado, o futuro é incerto para as pautas do governo no Congresso. Na avaliação do consultor político João Henrique Hummel, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrentará grandes dificuldades no Parlamento.
“Vamos ter dois anos em que o Legislativo tentará fazer uma pauta e o Executivo terá de ser muito reativo, ou não teremos pauta nenhuma”, disse, em entrevista aos jornalistas Carlos Alexandre de Souza e Denise Rothenburg, no programa CB.Poder, parceria entre o Correio e a TV Brasileira. A seguir, os principais trechos:
O governo e o Congresso
“As eleições no Congresso Nacional são um momento novo para o governo. O governo não é coordenador nem o apoiador dos dois candidatos que hoje são os favoritos, e isso o torna um coadjuvante, e não o protagonista dessas eleições.
Ao olhar para o futuro, todos os acordos que foram firmados há dois anos, terão de ser firmados de uma forma diferente agora.
Tudo isso enquanto o Executivo enfrenta um momento muito fragilizado, principalmente pelos acontecimentos do fim do ano passado.”
Emendas parlamentares
“Os movimentos que o Supremo fez no ano passado, mexendo com as emendas, deixou o baixo clero em uma situação muito raivosa, porque hoje as emendas são uma cláusula pétrea para os parlamentares. Eles não podem perder mais a autonomia que ganharam na aplicação dos recursos e no compromisso que fizeram com a base deles. Então, hoje, os dois candidatos vão ter que olhar muito mais para os seus eleitores dentro do Congresso e para a sua base do que para o Executivo para ter uma boa harmonia de trabalho.”
Desafios do Planalto
“Essa nova configuração na Câmara e no Senado sofre um agravante, porque o presidente (Lula) está querendo condicionar qualquer acordo, qualquer opinião, até a distribuição de ministérios, já pensando nas eleições de 2026. Com isso, cria-se uma dificuldade. Na reunião de ministros, Lula já deu um recado claro da dificuldade que ele vai ter de negociar com o Legislativo.
Ele pega os ministros e dá o seguinte recado: ‘Precisamos entregar o que nós prometemos e já começamos nos dois primeiros anos; não vamos inventar nada de novo’. Quer dizer que tudo que Lula tenta colocar no Congresso existe uma dificuldade e não é levado para a frente. Vai ser pouco provável que o Legislativo aprove qualquer coisa nova que o governo propor. Vamos ter dois anos em que o Legislativo tentará fazer uma pauta, e o Executivo terá de ser muito reativo, ou não teremos pauta nenhuma.”
Parlamento x STF
“Neste momento, temos um Supremo que está desacreditado na sociedade e um Executivo fragilizado.
O Legislativo tem o poder de aprovar ou não o que quiser no Congresso. A decisão que o Legislativo está fazendo é deixar cada dia mais o Supremo se expor para a sociedade, e quanto mais isso acontece, maior o descrédito, maior a desconfiança.
Então, nas eleições majoritárias para o Congresso em 2026, qual será o tema? Qual a pauta? Se eu falar mal do Supremo, eu ganho voto ou perco voto? Qual vai ser a composição de um novo Senado em relação ao Supremo? Acredito que o Legislativo vai dar corda para o Supremo se expor mais ainda para a sociedade.”
Eleições 2026
“Em 2018, tivemos uma eleição em que a população foi antiPT. Em 2024, apesar de uma eleição bem dividida, quem ganhou foi contra Bolsonaro. Mas será que agora, em 2026, nós não vamos ser contra os dois? A sociedade vai ser contra os dois e está esperando um candidato pragmático, que realmente tenha uma articulação política e não ideológica. Se o governo não tem pauta para o Congresso, qual vai ser o debate que a sociedade vai fazer nestes próximos dois anos até chegarem as eleições? Quem é que vai fazer essa pauta?”
Governabilidade de Lula
“Eu já falei isso no primeiro ano de governo do Lula, mas repito: ele tem de se afastar do PT para ter governabilidade e se aproximar do Centrão para discutir uma pauta de consenso.
Nem lá, nem cá, mas aquilo que é viável. Mas ele se aproximou do PT, ao mesmo tempo que se distanciava das pautas do partido, o que não deu certo, porque não deu voto, não deu reverberação, a sociedade também não aceitou. Está no momento de ele usar temas convergentes para negociar, não criar discórdia.”