Título: Ofensiva alcança corrupção nos três níveis de governo
Autor: Carneiro, Luiz Orlando
Fonte: Jornal do Brasil, 14/05/2008, País, p. A5

Deflagrada em maio de 2007, depois de um ano de investigação, a Operação Navalha marcou a ofensiva da Polícia Federal contra os esquemas de corrupção infiltrados nos governos federal, estadual e municipal. Seu impacto estremeceu a base aliada do presidente Lula no Congresso Nacional. Centrada da figura de Zuleido Veras, o articuladíssimo empreiteiro com livre trânsito no Congresso, ministérios e órgãos públicos em geral, a operação mostrou que os tentáculos da corrupção alcançavam cinco ministérios, oito governos estaduais e cinco prefeituras, num processo de corrosão dos recursos públicos destinados a programas federais como o "Luz para todos", que acabou derrubando o ex-ministro das Minas e Energia Silas Rondeau.

Acusado de receber propina de R$ 100 mil do dono da Gautama, Roudeau pediu exoneração, mas até ontem, antes de seu nome encabeçar a lista de denunciados, ainda alimentava a esperança de voltar ao governo, embora o cargo já estivesse ocupado pelo senador Edison Lobão (PMDB-MA) na cota mantida ao PMDB governista liderado pelo ex-presidente e senador José Sarney (AP). Lula havia dito a aliados que considerava o ex-assessor injustiçado e deixara no ar promessa de reconduzí-lo ao governo se nada ficasse provado contra ele.

Outros setores

Fragmentos da Operação Navalha espalharam-se também para outros segmentos do mundo político: foi a partir das revelações de suas relações com Zuleido Veras que o ex-presidente do Congresso Renan Calheiros (PMDB-AL), amigo e aliado político do governador Teotônio Vilela Filho, também denunciado ontem, tornou-se alvo de uma série de acusações encabeçadas pela revista Veja e por pouco não acabou cassado. A Navalha levou para a cadeia o ex-governador do Maranhão José Reinaldo Tavares e quase alcançou o atual, Jackson Lago ¿ outro dos denunciados ¿ submetido a uma constrangedora revista quando retirava a bagagem do guarda-volume do Aeroporto de Brasília na véspera da operação. Os federais suspeitavam que na mala houvesse dinheiro de propina e pretendiam prender em flagrante o governador, adversário político do clã Sarney. As suspeitas em torno de Rondeau evitaram comemorações. Meses depois, um dos filhos do ex-presidente, o empresário Fernando Sarney, atualmente sob investigação, entraria na mira da Polícia Federal ao não conseguir comprovar movimentações financeiras supostamente canalizadas para campanhas eleitorais no Maranhão.

Inspirada no filme Navalha na Carne, a operação também cortaria na própria Polícia Federal. Uma semana depois de comemorar a onda de prisões ¿ foram 48 numa só tacada ¿ o segundo homem na hierarquia do DPF, Zulmar Pimentel, seria afastado da poderosa Diretoria Executiva, pela ministra Eliana Calmon, do STF, sob a suspeita de acobertar colegas nas investigações que originariam as ações contra o dono da Gautama, a chamada Operação Octopus, aberta em 2005. Em novembro do ano passado, Pimentel seria denunciado por vazamento de informações sigilosas junto com outros dois delegados federais, Marco Antônio Mendes Cavaleiro, assessor do senador Romeu Tuma (PTB-SP) e o ex-superintendente da PF no Ceará João Batista Santana. Os três eram ligados ao então diretor da PF, delegado Paulo Lacerda, que deixaria o cargo cinco meses depois para assumir o comando da Abin. A versão mais freqüentes nos bastidores aponta que o excesso de liberdade dada por Lacerda à PF assustou a elite política e forçou o governo a substituí-lo por meio de uma bem azeitada operação diplomática.