O Estado de S. Paulo, n. 47953, 31/01/2025. Metrópole, p. A17
Custo de hospedagem em Belém para COP assusta delegações estrangeiras
Juliana Domingos de Lima
Paula Ferreira
A dez meses do início da Cúpula das Nações Unidas para o Clima (COP-30), entre 10 a 21 de novembro em Belém, a escassez de oferta e a consequente alta dos preços das diárias de hospedagem têm preocupado participantes da conferência. Delegações estrangeiras têm tido dificuldades para efetuar reservas, já que casas para locação e hotéis têm fixado preços exorbitantes, de até R$ 2 milhões por estadia de 11 dias.
A orientação dada pelo governo federal às embaixadas estrangeiras, conforme o Estadão apurou, é de que aguardem a plataforma oficial de gerenciamento de hospedagem que será lançada pelo Brasil. Membros de embaixadas já se reuniram entre si em pelo menos duas ocasiões para tratar da questão. O governo federal anunciou, há 15 dias, o lançamento de uma plataforma para cadastrar casas, apartamentos e hotéis para participantes credenciados para o evento.
Procurada pelo Estadão, a Secretaria Extraordinária da COP-30 (Secop), ligada ao Ministério da Casa Civil, afirmou que tem conduzido as tratativas com as delegações internacionais por meio do Itamaraty. Disse ainda que está finalizando a contratação de plataforma para centralizar as reservas e garantir acomodação para as equipes negociadoras e demais participantes credenciados. Segundo a Secop, em edições anteriores as reservas em plataformas oficiais foram abertas a partir de junho. “A busca antecipada por acomodações fora desses canais pode contribuir para a elevação dos preços”, disse.
O Estadão apurou que funcionários da delegação da Dinamarca chegaram a ir a Belém para prospectar imóveis, mas retornaram sem sucesso. A questão também gerou preocupação na Embaixada do Reino Unido, que abordou o tema com o Brasil. A reportagem entrou em contato com as embaixadas dos países citados, que não se pronunciaram.
LULA E AUTUAÇÕES. Outro risco é para grupos da sociedade civil, como ONGs ou entidades acadêmicas que tradicionalmente participam da conferência climática, que podem ter dificuldade de arcar com os custos de deslocamento e hospedagem para o evento deste ano. Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil realizará a “melhor COP já feita” e comentou sobre a questão das hospedagens. “As pessoas vão dormir onde tiver de dormir. Eu posso dizer que ninguém vai ficar acordado por falta de um lugar para dormir.”
A Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor afirma que, até o momento, não há registro de reclamações formais sobre o tema e diz que nenhum estabelecimento foi autuado até agora. “No entanto, caso sejam identificadas irregularidades, a Senacon e os Procons competentes tomarão as medidas cabíveis, que podem incluir notificações, multas e até a interdição do estabelecimento, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor.”
A Senacon acrescenta que a orientação é que, caso identifiquem práticas abusivas, os consumidores denunciem o caso no site do governo. O Procon do Pará também afirma não ter recebido denúncias formais sobre o preço abusivo de hospedagem. O órgão pode notificar fornecedores por aumento injustificado de preços de produtos ou serviços.
50 MIL LEITOS. Presidente da COP-30, o embaixador André Corrêa do Lago disse anteontem que a questão da hospedagem para a cúpula em Belém está sendo tratada pela Casa Civil. O embaixador afirmou que esteve na capital paraense na semana passada e que ficou impressionado com os avanços já realizados, destacando que a equipe das Nações Unidas também ficou “bem tranquila” após missão na cidade para avaliar os preparativos.
A expectativa do governo federal é ofertar 50 mil leitos. Segundo o levantamento mais recente feito pela prefeitura de Belém, a cidade tem hoje 18 mil. As iniciativas previstas para aumentar a oferta de leitos na capital paraense incluem: navios cruzeiros contratados pelo governo federal; reforma de 17 escolas que serão usadas como alternativa de hospedagem no padrão de hostel; quatro novos empreendimentos hoteleiros de alto padrão.
Um destes vai ocupar três galpões em área próxima do Porto Futuro II; outro será instalado em um antigo prédio da Receita Federal; o terceiro no bairro do Reduto, em Belém; e o quarto em Castanhal, na região metropolitana.
De acordo com o governo do Estado, a estratégia de ampliar a oferta de hospedagem contará ainda com “tendas climatizadas, vilas militares, espaço para comunidades indígenas e construções modulares de alto padrão, que serão transformadas em centro administrativo depois da COP”.
DEMANDA. Em nota, a plataforma de reservas pra hospedagem Airbnb afirmou que os valores das acomodações anunciadas “são definidos pelos próprios anfitriões, que possuem total autonomia para gerenciar e personalizar seus anúncios”. Já a Booking.com disse não interferir nos preços das reservas feitas na plataforma e afirmou que são os parceiros de acomodação “quem definem e controlam preços”.
Segundo o diretor executivo do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), Igor Britto, ainda que os preços sejam livres e sigam as regras de oferta e demanda, o aumento exagerado e desproporcional em situações de alta demanda é considerado ilegal. “Enquanto as plataformas negarem sempre suas responsabilidades, não vai ter controle nenhum.”
Ainda assim, responsabilizar o site pode não ser suficiente, uma vez que os usuários podem levar a oferta para outros serviços. Mesmo no caso dos hotéis e pousadas, segundo o jurista, pode ser complicado chegar a uma interpretação jurídica sobre qual deve ser o limite do aumento de preço da hospedagem durante um evento como a COP.
O que dizem as plataformas Airbnb e Booking.com alegam que anunciantes é que respondem pelos preços praticados