Valor Econômico, 08/05/2020, Política, p. A8

Relator limita alcance de MP de regularização fundiária na Amazônia

Rafael Walendorff



O relator da Medida Provisória 910/2019, deputado Zé Silva (SD-MG), fez alterações no seu parecer para tentar promover um entendimento entre ruralistas e ambientalistas. A construção de um acordo foi um requisito do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para pautar na semana que vem a matéria, que trata da regularização de terras na Amazônia, antes de ela perder validade. O governo pondera que já cedeu bastante e que a MP caducar seria um retrocesso.

A principal mudança no relatório é a retirada do trecho da proposta original que ampliou a data de ocupação das terras passíveis de regularização de 2008 para 2014, o que na prática possibilitava a legalização a quem ocupou áreas públicas ilegalmente nesse intervalo.

O deputado Zé Silva disse que o novo prazo será suprimido e mantido o estipulado na lei em vigor. “A mensagem que a gente passava ao mundo é que aqui pode ocupar porque a cada cinco anos cria-se uma nova lei e regulariza tudo. Agora, não. No Brasil, não vai ter vida fácil para quem quiser grilar terra, por isso mantemos o marco temporal de 2008, mantém a lei que já existe e respeita o Código Florestal”, afirmou ele, que morou em um assentamento por quatro anos.

O ponto de desacordo é a dispensa de vistoria prévia em propriedades com até 15 módulos fiscais (o que pode chegar a 1.650 hectares dependendo da região do país). A ala ambientalista defende que a medida seja aplicada apenas a propriedades com até 4 módulos fiscais, como era antes da publicação da MP, e diz que esse é o ponto de "maior risco de a MP se tornar uma medida de estímulo à grilagem”.

Já a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) quer que propriedades maiores, com até 15 módulos fiscais, sejam dispensadas da vistoria física e que possam ser regularizadas por sensoriamento remoto, como as menores. A bancada alega que isso resolveria 100% do passivo, mas já admite ceder. O relator busca um meio termo e deve aplicar a dispensa para até 8 ou 10 módulos. Ele incluiu no relatório a isenção de despesas e custos cartorários para propriedades de até 15 módulos fiscais.

“Já chegamos a um acordo. A única coisa que está empacando é a quantidade de módulos. O que queremos é incluir aproximadamente 1 milhão de famílias que estão ocupando as áreas há 30 anos e não têm a propriedade, não têm direito a crédito. Temos que atender até 15 módulos porque atende todo mundo”, afirmou o presidente da FPA, deputado Alceu Moreira (MDB-RS).

Para o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Geraldo Melo Filho, o governo “cedeu bastante” no texto e a retirada da dispensa de vistoria prévia para propriedades entre 4 e 15 módulos pode inviabilizar todo o processo de regularização, principalmente na Amazônia, por conta das distâncias e da falta de funcionários para fazer a vistoria in loco. Ele acrescentou que o risco da MP caducar seria um retrocesso, pois voltaria a valer a lei anterior, sem possibilidade de uso do sensoriamento remoto para regularização de nenhuma área e com risco de aumento nos crimes ambientais e fundiários.