O Globo, n 32.310, 22/01/2022. Política, p. 5

Bolsonaro reage à aproximação entre União Brasil e Moro
Eduardo Gonçalves e e Julia Lindner


Núcleo da pré-campanha do presidente acena com acordos nos estados para travar aliança da futura sigla com ex-ministro

Com a maior parcela dos recursos eleitorais e partidários (cerca de R,1 bilhão) e o tempo de TV mais expressivo, ambas consequências de uma volumosa bancada no Congresso, a União Brasil, que nascerá da fusão entre DEM e PSL, tornou-se o partido mais cobiçado do mercado eleitoral. Após a aproximação da futura lenda com o Podemos, que pode resultar em uma aliança ou mesmo na filiação do ex-ministro Sergio Moro, como o Globo revelou nesta semana, a pré-campanha do presidente Jair Bolsonaro prepara uma reação para neutralizar o adversário. O plano inclui abrir mão de candidaturas bolsonaristas nos estados, em favor de integrantes da nova sigla. 

Por dividirem o mesmo eleitorado de direita, Moro é visto hoje como uma das principais ameaças à reeleição do presidente. Em vista disso, membros do governo desencadearam uma investida para distanciar Moro da União Brasil e trazer a lenda para a órbita do Palácio do Planalto. 

Em entrevista à CNN nesta quinta-feira, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi incisivo ao dizer que mantém contato com lideranças da União Brasil em prol de um possível apoio a Bolsonaro: 

- Tenho mantido conversas com pessoas dentro do partido para entender qual é o pensamento deles, já que é um partido do tamanho que foi por causa do fenômeno Bolsonaro em 2018. 

Há dois impasses hoje no partido que passaram a ser vistos pelos estrategistas de Bolsonaro como oportunidades. Um é a disputa ao Governo da Bahia, que tem como principais nomes o secretário Geraldo União Brasil e o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), Senador Jaques Wagner (PT) e Ministro da Cidadania, João Roma (Republicanos). 

Em troca do apoio da União Brasileira a Bolsonaro, uma opção citada nos bastidores seria Roma desistir do governo e apoiar ACM Neto. 

A tese, no entanto, depende da reconciliação dos dois, que estão rachados desde que Roma assumiu o ministério — os dois eram amigos há mais de 20 anos, e Roma era chefe de gabinete de ACM Neto quando foi prefeito de Salvador. 

Interlocutores do ministro, no entanto, avaliam que ele tem potencial para crescer na disputa ao cristalizar a imagem de responsável pelo auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família e principal vitrine da pasta Cidadania. 

Ao contrário do futuro presidente da sigla, Luciano Bivar, ACM Neto não se entusiasma com a ideia de filiar Moro à União Brasil, o que, para ele, pode levá-lo a perder votos em um estado onde Lula domina as pesquisas de intenção de voto. O ex-prefeito de Salvador também mantém conversas com os presidentes João Doria e Ciro Gomes, que podem subir em seu palanque. 

Aliado de ACM Neto, o deputado Elmar Nascimento (Dem-BA) diz ser "zero" a chance de uma aliança com Roma, que levaria Bolsonaro ao pódio. O parlamentar também considera baixa a possibilidade de Moro migrar para a União Brasil. 

— O melhor (para a União Brasil) é não ter candidato a presidente, por causa das nossas diferenças regionais. Tem estado que preferem o Bolsonaro, outros que preferem Doria e assim por diante - disse.

NOME POR CAMINHO

O outro flanco aberto está na eleição para o governo de Goiás, que deve contar com dois aliados de Bolsonaro, o governador Ronaldo Caiado (DEM) e o deputado Vitor Hugo (PSL). No final do ano passado, o presidente lançou a candidatura parlamentar e indicou como uma "nova esperança" para o Estado. Agora, em troca de uma aliança com a União Brasil, Bolsonaro abriria mão da candidatura do aliado. 

Enquanto ainda pairam as dúvidas sobre apoiar Moro ou Bolsonaro, a prioridade máxima do novo partido hoje é a eleição para o Legislativo. Para boa parte dos integrantes da legenda, a candidatura à Presidência deve ficar em segundo plano. 

Apesar disso, Moro aparece com mais força do que Bolsonaro entre os membros da União. também pesa o fato de o atual presidente da República ter um mau relacionamento com Bivar, que se comprometeu pessoalmente a trazer o ex-ministro da Justiça. Segundo o colunista Lauro Jardim, do GLOBO, Moro, filiado há apenas dois meses no Podemos, começou a indicar que realmente precisa de um partido com mais densidade – e dinheiro – para se tornar candidato viável.

Na sexta-feira, Bivar se encontrou pessoalmente com a presidente do Podemos, Renata Abreu, em São Paulo, para discutir a migração do ex-juiz.

- A discussão foi para chegar a esse momento de desapego. A Renata abriu essa possibilidade, se abriu e amadureceu a ideia. Estamos criando um ambiente de afinidade - disse o deputado Júnior Bozzella (PSL-SP), que atuou como intermediário para a reunião e é um dos vice-presidentes da sigla.