Correio Braziliense, n. 22607, 08/02/2025. Cidades, p. 14
Novas regras para celular
Letícia Guedes
Afinal, o celular é um vilão ou uma ferramenta que auxilia na aprendizagem? A Lei nº 15.100/2025, que restringe o uso de aparelhos eletrônicos nas escolas, já está em vigor.
Ontem, a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) divulgou as novas regras quanto ao uso de aparelhos eletrônicos pelos estudantes nas instituições educacionais públicas da educação básica do DF. O documento busca atender às orientações e exigências previstas na legislação.
A partir de agora, fica proibido o uso dos aparelhos portáteis durante as aulas, em sala ou em qualquer espaço pedagógico da unidade escolar, no decorrer das atividades conduzidas por profissionais da educação ou em trabalhos individuais e em grupo e nos intervalos entre as aulas, incluindo o recreio.
Caso haja o descumprimento das regras, os profissionais da educação deverão acionar a equipe gestora da unidade escolar, que poderá adotar medidas educativas e disciplinares de caráter educativo, previstas no regimento escolar.
Para Denise Canal, diretora do Colégio Católica Brasília e mestre em educação e saúde, especialista na dependência tecnológica causada por dispositivos eletrônicos em crianças e adolescentes, a medida é extremamente positiva.
“Há 20 anos luto pela restrição do uso excessivo de recursos eletrônicos por crianças e adolescentes.
Acredito que essa medida poderia ter sido implementada antes, visando proteger as gerações passadas.
No entanto, ainda que tarde, é melhor do que nunca. Nos próximos meses veremos essa nova geração de crianças e adolescentes se tornando infinitamente mais saudáveis”, disse.
A diretora classificou a norma como histórica. “Na pandemia, os estímulos foram intensos e as respostas frente a eles, também. O celular passou a fazer parte da vida como uma extensão do corpo. Pais desconheciam os riscos da exposição excessiva. Quem imaginaria que o perigo caberia na palma da mão, se usado sem limites. Este é um momento único a ser registrado na história. Vem aí uma geração que será resgatada dos estímulos dopamínicos tecnológicos diários.”
Acerto
Para o operador de cremalheira Ivaldo Leandro de Lima, 46 anos, pai do pequeno Itálo de Lima, 6, a decisão do governo federal foi um acerto. Na segunda-feira, o menino, que mora com a família em Arapoanga, iniciará a vida escolar, e a proibição do uso de eletrônicos tem deixado o pai mais seguro. “É muito importante porque além de ter o risco de a criança perder o celular ou ser assaltada, o aparelho tira a atenção.
Ele ainda não usa o celular e não queremos que use antes dos 10 anos. Gostamos da lei”, avaliou.
Tatiana Portela, pedagoga e mestre em psicologia, com experiência em inovação, tecnologias educacionais e neuroaprendizagem, analisa que a lei demonstra duas preocupações essenciais: saúde mental e aprendizagem. De acordo com ela, as motivações estão evidenciadas na permissão com fins pedagógicos ou didáticos, para acessibilidade e inclusão.
“A intencionalidade da lei também é reforçada e ampliada no guia lançado pelo Ministério da Educação, abordando a conscientização para o uso de celulares.
O guia, além de orientar as escolas e fundamentar a opção pela restrição, também provoca a necessária discussão e atuação das escolas em relação à educação midiática e à cidadania digital.”
Por que a lei é necessária?
A promulgação da Lei nº 15.100/2025, que restringe o uso de celulares nas escolas brasileiras, representa uma medida essencial para aprimorar o ambiente educacional e o desenvolvimento integral dos estudantes.
A presença constante de celulares em sala de aula tem sido identificada como uma fonte significativa de distração.
Notificações de redes sociais, jogos e mensagens instantâneas competem pela atenção dos alunos, comprometendo a concentração e a assimilação dos conteúdos ministrados.
Estudos indicam que o uso excessivo de celulares está associado a problemas como ansiedade, estresse e distúrbios do sono entre jovens. A constante exposição a plataformas digitais pode levar a comparações sociais prejudiciais e ao fenômeno do “medo de ficar de fora”(FOMO), afetando negativamente a saúde mental dos alunos.
A interação face a face é fundamental para o desenvolvimento de competências sociais, como empatia, comunicação eficaz e resolução de conflitos. O uso indiscriminado de celulares pode reduzir essas interações, levando ao isolamento social.
O ambiente digital pode ser palco de comportamentos nocivos, como o cyberbullying, que afeta a integridade psicológica de muitos estudantes.
Ao restringir o uso de celulares nas escolas, reduz-se a possibilidade de ocorrências de assédio virtual durante o período escolar, contribuindo para um ambiente mais seguro e acolhedor para todos.
Diversos países têm adotado medidas semelhantes visando aprimorar o ambiente educacional. Na França, por exemplo, desde 2018, o uso de celulares é proibido em escolas para alunos até 15 anos, com o objetivo de reduzir distrações e melhorar a concentração. A implementação dessa política resultou em um ambiente escolar mais disciplinado e focado no aprendizado.
Embora a lei represente um avanço significativo, sua implementação requer a colaboração de educadores, pais e alunos. É fundamental que as escolas desenvolvam políticas claras sobre o uso de tecnologia, promovam a educação digital responsável e ofereçam alternativas pedagógicas que integrem recursos tecnológicos de forma equilibrada.
A restrição do uso de celulares não deve ser vista como uma oposição à tecnologia, mas como uma medida para garantir que seu uso no ambiente escolar seja consciente e direcionado ao enriquecimento do processo educacional.
Em suma, a Lei nº 15.100/2025 é necessária para assegurar um ambiente escolar que priorize o aprendizado, o desenvolvimento saudável e a segurança dos estudantes, preparandoos para os desafios da sociedade contemporânea.
Ana Maria dos Santos, professora de história da Blue Global School