O Estado de S. Paulo, n. 47965, 12/02/2025.  Economia & Negócios, p. B1

Governo indica desejo de negociar com EUA exceção para tarifa do aço
Caio Spechoto
Amanda Pupo
Ivo Ribeiro

 

 

Alexandre Padilha (Relações Institucionais) diz que o Brasil “não entrará em guerra comercial”.

Um dia depois de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, formalizar a imposição de tarifa de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio do país, ministros sinalizaram ontem a disposição do governo brasileiro de evitar a adoção de contramedidas e tentar avançar numa negociação com autoridades americanas. Em 2024, o Brasil foi o segundo maior fornecedor de aço para os EUA, atrás apenas do Canadá. Ainda não houve um pronunciamento oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“O Brasil não estimula e não entrará em nenhuma guerra comercial”

Alexandre Padilha

Ministro de Relações Institucionais

“Guerra comercial não faz bem para ninguém. O Brasil não estimula e não entrará em nenhuma guerra comercial”, disse o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. “Um dos avanços importantes dos últimos anos foi exatamente constituir um instrumento de diálogo entre os países e o reforço do livre comércio.”

A declaração foi dada pela manhã, em Brasília, depois da abertura de encontro de prefeitos. No fim do dia, foi a vez de o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reforçar a indicação de cautela em relação a uma eventual reação mais firme do governo brasileiro.

Haddad disse que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) está organizando as informações sobre o tema para apresentá-las ao presidente Lula a e que é preciso conhecer a “minúcia” do anúncio de taxação. O novo sistema de taxação só entrará em vigor em 12 de março.

O ministro defendeu, contudo, que a linha brasileira é a mesma proposta na presidência do G-20, em que o País defendeu uma “globalização sustentável”. “Nós estamos imaginando voltar para a mesa de negociação com propostas nessa direção”, disse Haddad, ao citar a avaliação de que medidas unilaterais como as tomadas pelos EUA são contraproducentes para a melhoria da economia global.

Ele também mencionou que o tarifaço não atinge só o Brasil e que é preciso acompanhar as reações de países como México, Canadá e China. Ele lembrou ainda que, em 2018, no primeiro mandato de Trump, os EUA recuaram de impor a mesma sobretaxa sobre o aço brasileiro ao aceitarem um sistema de cotas. “Então, por isso, o Mdic está fazendo essa avaliação, para levar para o presidente o quadro geral, e nós vamos avaliar conjuntamente.”

Analistas ouvidos pelo Estadão afirmam que o governo brasileiro deveria privilegiar a abertura de negociação com os EUA. Para Rubens Barbosa, que foi embaixador do Brasil em Londres e Washington, o momento pede movimentos com “pragmatismo” e “sem ideologia” ( mais informações na pág. B4).

ARTICULAÇÃO. Sob o impacto da decisão do presidente americano, a indústria siderúrgica brasileira começou a se articular para buscar formas de enfrentar os efeitos das medidas. Representantes do Instituto Aço Brasil foram ontem a Brasília, onde tiveram reuniões com técnicos da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) e da Câmara de Comércio Exterior (Camex), ambos ligados ao Mdic. Aconteceu também um encontro no Ministério de Relações Exteriores (MRE), conforme apurou o Estadão com uma pessoa ligada ao instituto, que representa as fabricantes de aço no País.

A tarifa de 25% deve atingir, principalmente, as exportações brasileiras de material semiacabado (placas e tarugos), que representam quase 90% das vendas. Esse item é adquirido por empresas locais que não fabricam placas para transformá-las em produtos acabados voltados para diversos setores industriais do país.

Entre as siderúrgicas que atuam no Brasil, as mais atingidas pelas medidas de Trump são as fabricantes de placas ArcelorMittal, com duas unidades fabris no País, e a Ternium, no Rio de Janeiro. O caso da companhia do empresário indiano Lakshmi Mittal é mais crítico: as unidades brasileiras abastecem 100% das necessidades da laminadora que o grupo, com a Nippon Steel, opera no Estado de Alabama. São 5 milhões de toneladas por ano que vão para essa planta, chamada Calvert.

Oficialmente, em nota, o Instituto Aço Brasil afirmou que as empresas do setor estão confiantes na abertura de diálogo entre os governos para restabelecer o fluxo de produtos de aço para o mercado americano nas bases acordadas em 2018. Por esse sistema, o Brasil manteria cota de exportação de 3,5 milhões de toneladas ao ano de placas isentas de impostos. Somando aços acabados, o total chega a 4,2 milhões de toneladas. “Estados Unidos e Brasil detêm parceria comercial de longa data, que vem sendo, historicamente, favorável ao primeiro”, afirmou a entidade. •