Título: Os federais que entram e decidem
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 18/05/2008, País, p. A3

Eles dispensam termos como tropa de choque ou de elite. Em cinco anos, foram 2 mil prisões.

Brasília

Eles representam 0,46% da corporação de 13 mil servidores, são desconhecidos do público, mas encarnam o segredo das operações que resultaram em quase 2 mil prisões nos últimos cinco anos sem que fosse necessário disparar um tiro sequer. O Comando de Operações Táticas (COT), a força especial da Polícia Federal que deverá realizar a retirada dos não-índios da Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima, é a tropa de elite mais bem treinada do país para ações de controle de distúrbios ou em casos de alto risco ¿ assaltos, seqüestros com reféns ou terrorismo.

O COT aguarda em ritmo de treinamento, em Roraima, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para fazer a operação de retirada caso a decisão do ministro Carlos Ayres Britto seja pela área contínua.

¿ A ordem será cumprida. Isso eu garanto ¿ diz o delegado Marcos Ferreira, 43 anos, 20 deles na Polícia Federal e um dos membros mais antigos do COT.

Ele garante que o grupo tem todas as informações sobre possíveis reações e, com armas de verdade ou não letais, está preparado para agir em qualquer cenário que venha a ser provocado pelos grupos que resistirem à ordem judicial. Criado em 1987 para fazer frente a seqüestros e a atos terroristas contra personalidades ou órgãos do governo federal, o grupo se reciclou, aprofundou seu treinamento, se capacitou para agir em qualquer circunstância de risco e é uma corporação recordista no quesito saldo de confronto:

¿ Em 20 anos nunca tivemos uma baixa ¿ diz Ferreira, chefe operacional e coordenador do grupo.

Homens de preto

E não é que faltem ocasiões para agir. O COT realiza anualmente uma média de 110 operações em vários pontos do país. Embora raramente apareçam, seus homens vestidos de preto ou com a tradicional roupa de camuflagem na selva (bege, verde e marrom) ¿ cujo símbolo de identificação é uma águia agarrando um fuzil M-16 lançador de granadas num logotipo de fundo vermelho ¿ estão sempre na linha de frente quando há probabilidade de reação, seja na retirada de índios de área privada ou de garimpeiros, traficantes e contrabandistas de terra indígena.

Também ajudam a prender criminosos engravatados ou traficantes, pistoleiros, policiais corruptos violentos ou na retomada de aviões. Em 2006, a ação do COT para retirar os integrantes das etnias guarani e tupiniquim de uma área da Aracruz Celulose, município de Aracruz, no Espírito Santo, terminou com 13 índios feridos a bala de borracha, escoriações de pancadas ou pelos estilhaços de bombas de efeito moral.

¿ Nós sempre usamos a força na medida do necessário. A negociação já faz parte da nossa doutrina. É claro que o emprego da força pode provocar feridos dos dois lados. Quem reage contra a polícia está sujeito a ser ferido ¿ diz o delegado.

Escala progressiva

Segundo Ferreira, o COT trabalha com uma escala progressiva de prováveis reações e, dependendo das circunstâncias, sempre no calor do enfrentamento, emprega o armamento adequado. Em casos de distúrbios sociais ¿ como a retirada de não-índios ou desocupação de um prédio público federal ¿ todos os equipamentos usados não oferecem risco de morte: bomba de efeito moral (gás lacrimogêneo), spray de pimenta ou a moderna pistola Taser, capaz de imobilizar qualquer brutamontes com uma descarga elétrica a uma distância de sete metros com dardos-eletrodos disparados com mira a laser.

Numa linha oposta, em se tratando de armas pesadas, o COT usa o que há de mais letal: pistola Glock e fuzis HK, Colt ou Remigton, consideradas top de linha no mercado bélico para longas distâncias. Marcos Ferreira não gosta das expressões "derrubou" ou "finalizou", que corporações de elite ou de choque ¿ outras duas palavrinhas que não fazem parte do vocabulário do COT ¿ usam para dizer que mataram um criminoso.

¿ Nossos homens são atiradores de precisão. Eles treinam disparos de longo alcance e estão preparados para acertar duas vezes seguidas o centro de uma moeda de 50 centavos a 100 metros de distância ¿ afirma o delegado.

Ele jura que essa façanha é uma rotina nos treinamentos do COT.

¿ Um atirador nosso não treina para acertar no corpo quando é necessário tirar alguém de combate. Ele aprende a acertar no olho. O segundo tiro tem de ir no mesmo lugar ¿ diz Ferreira.

A decisão extrema de matar só é tomada quando o alvo, armado, reage e representa ameaça real contra policiais ou reféns.