Valor Econômico, 13/05/2020, Brasil, p. A5

Mortes batem recorde e Bolsonaro ameaça governadores

Fabio Murakawa
Estevão Taiar
Rafael Bitencourt


O presidente Jair Bolsonaro ameaçou ontem acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Minstério da Justiça contra os governadores que descumprirem os decretos, emitidos por ele, que definem a relação de “serviços essenciais”, que podem ser liberados durante a pandemia da covid-19. A ameaça foi feita no dia em que o registro de mortes pelo coronavírus no Brasil bateu novo recorde, chegando a 881 pessoas em 24 horas.

A fala reflete um conflito entre os governadores, que tentam restringir a circulação para conter o alastramento da doença, e Bolsonaro, que tenta forçar a abertura da economia. Anteontem, o presidente definiu academias esportivas, salões de beleza e barbearias como “serviços essenciais”, o que em tese retira dos prefeitos e governadores a prerrogativa de restringir esses serviços.

“Se porventura o governador falar que não vai cumprir, a AGU e o Ministério da Justiça vão tomar a devida medida”, disse ele a jornalistas no Palácio da Alvorada.

Bolsonaro argumentou que os governadores que decidirem barrar atividades essenciais estariam, na prática, descumprindo uma norma federal.

“Havendo o descumprimento, a AGU vai se empenhar, talvez junto à esfera judicial, para que aquele governador cumpra o decreto.”

Ele disse que pode ampliar ainda mais a lista de serviços essenciais. “Se tiver sugestão de uma nova profissão que seja considerada essencial, a gente estuda e decide. Um decreto é rápido”, afirmou.

Para Bolsonaro, o decreto que classifica salões de beleza, barbearias e academias como essenciais vai ajudar “pessoas muito humildes” a voltarem a trabalhar e outras a “desestressarem” ao praticarem atividades físicas.

Bolsonaro afirmou ontem por duas vezes que há dois caminhos para contestarem esse tipo de decreto: entrar na Justiça ou recorrer ao Congresso Nacional para que se aprove um decreto legislativo que anule a medida.

Bolsonaro minimizou o fato de haver publicado o decreto sem consultar o ministro da Saúde, Nelson Teich. Segundo ele, definir atividades essenciais não é atribuição da pasta, mas dele.

Bolsonaro voltou a demonstrar preocupação com a economia, apesar do recorde de mortes, dizendo que é preciso encontrar “um meio termo” e criticou a possibilidade de algumas cidades entrarem em “lockdown”, uma restrição mais radical da circulação de pessoas. “Lamento cada vida que se vai, mas o desemprego mata”, disse. “Estou vendo ameaça de ‘lockdown’, isso é absurdo, inadmissível. O povo quer trabalhar.”

Com as 881 mortes registradas ontem, o número de óbitos de infectados pela covid-19 no Brasil chegou a 12.400. O total de casos confirmados atingiu 177.589. Pelos números da Universidade Johns Hopkins, o Brasil tem atualmente o sexto maior número de mortos de infectados por covid-19 no mundo. O primeiro lugar é ocupado pelos EUA, com 82.227 óbitos, seguido por Reino Unido, com 32.769, Itália, com 30.911, França, com 26.994, e Espanha, com 26.920.