Correio Braziliense, n. 22609, 10/02/2025. Economia, p. 7

Pacote fiscal fraco cria riscos para as contas de 2027


Analistas destacam que o pacote fiscal do governo, que foi aprovado pelo Congresso no fim de 2024 e previa cerca de R$ 70 bilhões em cortes de gastos, pouco pode contribuir para a melhora do quadro fiscal, pois o impacto será menor do que o inicialmente previsto pelo governo, com estimativas variando entre R$ 35 bilhões e R$ 60 bilhões.

“O pacote aprovado no ano passado é insuficiente para fazer o governo cumprir a meta de 2025 ou ficaria bem no limite. Em geral, nos nossos cenário de médio e longo prazos, até 2026, o arcabouço fiscal se sustenta, mas o problema vai surgir a partir de 2027, porque as despesas discricionárias (não obrigatórias) estarão mais comprimidas mesmos com os abatimentos”, alerta Alexandre Andrade, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI).

A lista de 25 medidas prioritárias entregue por Haddad ao Congresso também frustrou, pois não prevê corte de despesas, de acordo com os analistas.

O que tem ajudado, em parte, é o atraso na votação do Orçamento deste ano, pois isso limita o governo a gastar apenas 1/12 avos do previsto, até que a Lei Orçamentária Anual seja aprovada.

Contudo, há problemas nas projeções, especialmente as receitas, que estão superdimensionadas em aproximadamente R$ 22 bilhões, segundo Andrade, da IFI.

Ele conta que , apenas quando a peça orçamentária for aprovada pelo Legislativo é que será possível recalcular todas as projeções.

Diante desse quadro de deterioração fiscal e aumento da dívida pública bruta, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ressalta que, independente da metodologia do cálculo, a deterioração fiscal é evidente. “Não está errado usar uma ou outra. Mas o fato é que a dívida vai continuar subindo e, como o governo dá sinais de que não vai fazer nada muito agressivo em cortes de gastos, volta a ideia de que apenas em 2027 poderíamos ter uma mudança mais efetiva novamente”, alerta ele, lembrando que 2026, vai ser um ano bastante turbulento, “tanto para juros quanto para câmbio”.

Sergio Vale ainda admite que o risco de recessão no segundo semestre de 2025 aumentou, especialmente pelo início de uma desaceleração que está em curso ou uma recessão técnica (quando há Produto Interno Bruto (PIB) negativo por dois trimestres seguidos).

“Ainda está muito cedo, mas a probabilidade de duas quedas consecutivas no PIB trimestral no segundo semestre, hoje, está acima de 50%. A dúvida é se essa desaceleração será suficiente para jogar a inflação para a meta”, afirma. Pelas projeções dele, haverá um cenário de estagnação leve, com recessão e baixo crescimento em 2026, com a inflação se mantendo no teto da meta, de 4,5%, devido à pressão cambial que deve persistir até o próximo ano. “A polarização que parece que se manterá em 2026 tende a manter os riscos na economia e será difícil ver um cenário de inflação moderada. Por isso, a taxa básica da economia (Selic) deve começar a ceder ainda esse ano, mas ficar em patamar elevado ainda em 2026, na casa de 14% ao ano”, acrescenta.

Alexandre Espirito Santo, economista chefe da Way Investimentos, também reforça que, independente da metodologia de cálculo da dívida pública bruta, a trajetória não é boa e tem grandes chances de chegar logo a 100% do PIB. “Não é querendo ser chato, porque o governo vem registrando deficit primário desde 2015 e, na hora em que o ministro Haddad fala que, se não fosse o Perse (programa de socorro ao setor de eventos) e as enchentes no Rio Grande do Sul, o governo teria registrado superavit primário em 2024. Agentes racionais vão continuar exigindo prêmio de risco cada vez maior, ou seja, mais juro, porque o governo está caminhando para uma dinâmica ruim para o pagamento da dívida”, diz. “Está na hora de fazer um ajuste mais duro e novas reformas, porque o mercado vai olhar e, como em 2026 será um ano eleitoral, não há perspectiva de desaceleração no segundo semestre, mas uma queda pronunciada do PIB não vai acontecer”, complementa.