O GLOBO,  n 32.311, 23/01/2022. Política, p. 6

Firma que contratou Moro recebeu 77% da receita de alvos da Lava—Jato

Aguirre Talento, Mariana Muniz e Patrik Camporez


Alvarez & Marsal informou dados ao TCU,  que apura a atuação do ex—juiz no setor privado

O escritório que contratou o ex-ministro e ex-juiz da Lava-Jato Sergio Moro, Alvarez & Marsal, recebeu cerca de R$ 65 milhões de honorários de empresas que foram alvos da operação, o equivalente a 77,6% dos seus recebimentos no Brasil.

Os dados foram informados pela empresa ao Tribunal de Contas da União (TCU), em um processo aberto para apurar possíveis irregularidades da atuação de Moro no escritório, pelo fato de ele ter sido juiz da Lava-Jato. A empresa, entretanto, afirmou ao TCU que Moro não atuava em processos envolvendo as empresas alvo da operação. 

Esses pagamentos foram feitos pela Odebrecht, OAS, banco BVA, Galvão Engenharia e grupo Atvos (antiga Odebrecht Agroindustrial) ao contratarem o escritório para atuação em processos de recuperação judicial ou falência. 

Procurado, o ex-ministro disse que seu contrato não era com a parte da empresa responsável por recuperações judiciais, que segundo ele tem outro CNPJ e fontes de receita diferentes.

“Nunca prestei nenhum tipo de trabalho para empresas envolvidas na Lava-Jato. E isso foi deixado claro, a meu pedido, no contrato que assinei com a renomada consultoria norte-americana. Nos meses em que estive na empresa, trabalhei com compliance e investigação corporativa, ou seja, ajudando e orientando empresas a construir políticas para evitar e combater a corrupção”, destacou Moro, por meio de nota. 

O ex-ministro também diz que “jamais trabalhou” para a Odebrecht ou prestou consultoria, direta ou sequer indiretamente, a empresas investigadas na Lava-Jato.

“A empresa de consultoria internacional, para a qual prestei serviço, foi nomeado por um juiz para atuar na recuperação judicial de créditos da Odebrecht, ou seja, para ajudar os credores a receberem dívidas. E eu jamais trabalhei nesse departamento da empresa ", completou o ex-juiz.

RETIRADA DE SIGILO

A Alvarez & Marsal, em petição apresentada ao TCU, afirmou que não existe conflito de interesse na contratação de Sergio Moro e que não houve irregularidades em sua atuação. 

A investigação sobre a ligação de Moro com o escritório foi aberta no início de 2021. No pedido de apuração o procurador junto ao TCU, Lucas Furtado, sustentou que a vinculação do ex-juiz atuando para o escritório após deixar a magistratura deveria ser investigada “considerando o risco de conflito de interesses que pode surgir quando o mesmo agente, em um primeiro momento, atua em processo judicial que interfere no desempenho econômico e financeiro da empresa e, em um segundo momento, aufere renda, ainda que indiretamente com o processo de recuperação judicial para o qual seus atos podem ser contribuído”.

Na última semana, atendendo pedido do Ministério Público, o ministro Bruno Dantas, relator do processo no TCU, retirou o sigilo dos documentos.