O Estado de S. Paulo, n. 47917, 26/12/2024. Política, p. A6

Parente de Tarcísio e apadrinhados de Bolsonaro recebem jetons de São Paulo
Bianca Gomes
Guilherme Caetano

 

 

Gasto mensal do governo com participantes de conselhos, comitês, autarquias e estatais é de R$ 2,3 milhões.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), cuja gestão tem sido marcada por cortes de gastos e privatizações, desembolsa mensalmente R$ 2,3 milhões em remunerações extras para integrantes de conselhos e comitês de fundações, autarquias e empresas estatais. Entre os beneficiados estão o cunhado do governador, egressos do governo Jair Bolsonaro (PL), secretários da atual gestão, apadrinhados políticos e militares.

Primeiro escalão Secretários também turbinam seus salários com gratificações extras

Os dados foram obtidos em outubro pelo Estadão via Lei de Acesso à Informação. Esses pagamentos são conhecidos como “jetons” e não são considerados salários, segundo orientações do Tribunal de Contas de São Paulo (TCESP) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Portanto, a prática não é considerada ilegal.

Procurado, o governo de São Paulo afirmou que os representantes dos conselhos estaduais são eleitos e têm mandatos definidos por assembleias ordinárias e que todas as nomeações são realizadas conforme a legislação vigente (mais informações nesta página).

Cerca de 90% do valor dos jetons é destinado a conselhos e comitês de empresas estatais. Entre elas estão a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), a Empresa Metropolitana de Águas e Energia S.A. (Emae) e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

AGÊNCIA. Cunhado do governador, o militar da reserva Maurício Pozzobon Martins recebe R$ 16,1 mil como integrante do comitê de auditoria da agência de fomento Desenvolve SP. No início do governo, Tarcísio tentou nomear Pozzobon, casado com a irmã da primeira dama, como seu assessor especial no Palácio dos Bandeirantes, mas recuou diante da repercussão negativa.

O jetom de Pozzobon se soma ao salário que ele recebe como funcionário do gabinete do deputado estadual Danilo Campetti (Republicanos), que assumiu uma cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) em junho após articulação direta de Tarcísio. Na Alesp, Pozzobon tem remuneração de R$ 20,5 mil. Procurado, ele afirmou que se trata de “cargo sem vínculo empregatício, que não conflita com as atividades” na Assembleia.

Também recebe jetom o coronel Aleksander Toaldo Lacerda, chefe de batalhões da Polícia Militar que ficou conhecido por convocar “amigos” para ato bolsonarista no 7 de Setembro de 2021 e atacar o STF. Como mostrou o Estadão na época, ele publicou nas redes sociais frases como “Liberdade não se ganha, se toma” e “Nenhum liberal de talco no bumbum (consegue) derrubar a hegemonia esquerdista no Brasil”. Também afirmou: “Precisamos de um tanque, não de um carrinho de sorvete”. Sobre o 7 de Setembro, escreveu que o “caldo vai esquentar”. Em outro momento, declarou sentir “nojo” do STF. O coronel foi desligado do posto por indisciplina.

Lacerda foi nomeado conselheiro titular do conselho fiscal da São Paulo Previdência (SPPREV) em dezembro de 2023, com gratificação mensal de R$ 3,8 mil. O coronel não foi localizado para se manifestar.

A lista dos que recebem jetom no governo Tarcísio inclui também políticos, como o vereador de Piracicaba Laércio Trevisan Júnior (PL). Condenado em 2022 por porte ilegal de arma de fogo, ele ocupa uma vaga no conselho de administração da SPPREV e, este ano, participou de uma agenda do então candidato a prefeito Helinho Zanatta (PSD) ao lado do governador.

Em nota, o vereador disse que foi indicado para o posto pela Federação dos Sindicatos dos Servidores do Estado de

São Paulo e representa servidores de três universidades: USP, Unicamp e Unesp. “Possuo todas as exigências para ser indicado como representante de classe: ser presidente de entidade, ter mais de 20 anos no serviço público, ter pós-graduação e curso de capacitação na área de previdência”, afirmou, acrescentando que houve extinção da punibilidade no caso do porte ilegal de arma após pagamento de multa.

SECRETARIADO. Dez dos 25 integrantes do primeiro escalão do governo paulista turbinam seus salários com R$ 157,9 mil em gratificações extras. Nos 305 postos em estatais e 192 em fundações, há dezenas de servidores ligados diretamente ao secretariado de Tarcísio, incluindo chefes de gabinete, assessores, subsecretários e os próprios titulares das pastas.

Os secretários Arthur Lima (Casa Civil), Samuel Kinoshita (Fazenda), Guilherme Afif Domingos (Projetos Estratégicos) e Andrezza Rosalém (Desenvolvimento Social) recebem as maiores bonificações, de R$ 19,7 mil. Jorge Lima (Desenvolvimento Econômico) vem em seguida, com R$ 16,5 mil. Guilherme Derrite (Segurança Pública) recebe R$ 13,2 mil em gratificações. Ele ocupa funções em três estatais – Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e Metrô –, mas, nesta última, por ser suplente, não há remuneração.

Wagner Rosário (controlador-geral do Estado), assim como Derrite, acumula R$ 13,2 mil em gratificações. Depois dele, recebendo R$ 9,8 mil cada, estão Lais Vita (Comunicação), Marco Antônio Assalve (Transportes Metropolitanos) e Rafael Benini (Parcerias em Investimentos). Marília Marton (Cultura e Economia Criativa) ganha R$ 6,5 mil. Vahan Agopyan (Ciência, Tecnologia e Inovação) integra o comitê de elegibilidade do IPT, que não confere remuneração.

Na Secretaria da Fazenda, além de Kinoshita, recebem jetons que vão de R$ 6,6 mil a R$ 9,8 mil o secretário executivo da pasta, Rogério Campos, o coordenador de Atividades Descentralizadas, Fabio Bernacchi Maia, o subsecretário de Planejamento, Rodrigo Bezerra da Silva, e o coordenador de Tecnologia e Administração, Maurício Barutti de Oliveira.

ACÚMULO. Alguns conselheiros empilham funções. O Estadão identificou quatro pessoas ocupando quatro funções em órgãos diferentes, outras quatro com três funções simultâneas (entre elas Derrite e Rosário) e 52 com posições em dois conselhos distintos.

O cargo de membro de comitês de auditorias é o mais visado, pois confere remuneração de R$ 16.454,48. Conselheiros de administração recebem R$ 9.872,69 e integrantes de conselhos fiscais, R$ 6.581,79. Membros de comitês de elegibilidade e de orientação não são remunerados. •