Valor Econômico, 15/05/2020, Política, p. A9
TCU critica MP que blinda agentes públicos
Edna Simão
Rafael Bitencourt
Juliano Basile
O governo federal publicou ontem no Diário Oficial a Medida Provisória 966, que flexibiliza a responsabilização de agentes públicos por erros cometidos no combate à pandemia de covid-19. O governo alegou que a MP dá mais segurança jurídica para a atuação dos servidores, mas integrantes do Tribunal de Contas da União criticaram a medida.
Pelo texto da MP, os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia.
Segundo técnico da área econômica, a MP quer evitar o famoso “apagão das canetas”, protegendo quem “erra de boa-fé, que tem que agir em circunstâncias de pressão e de poucos recursos de tempo, tecnologia e análise”.
Já o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), José Mucio Monteiro, ressaltou a necessidade de ser promovida uma “ampla discussão” pelo Congresso Nacional para que os objetivos da MP sejam “legitimados pela sociedade”. Em nota divulga à imprensa, José Mucio informou que o órgão já conta um “plano de ação” para avaliar atos do governo, que envolvem gastos emergenciais, durante a pandemia de covid-19.
Para o presidente do TCU, o plano de ação já contempla a necessidade de se avaliar o “momento excepcional” e a “agilidade” em que as decisões precisam ser tomadas. “Todos os processos relacionados à covid-19 serão avaliados a partir dessa premissa”, destaca.
Para Monteiro, o tribunal já toma suas decisões a partir de “dados concretos e com responsabilidade na aplicação de penalidades” na apuração da conduta dos agentes público, “inclusive quanto a existência de erro grosseiro”.
Um técnico da área econômica ressaltou que a MP vai dar segurança jurídica em um momento em que o governo precisa ser rápido na adoção e implementação de medidas para minimizar os efeitos da crise na economia. O governo tem sido criticado por ter demorado demais na adoção de medidas, principalmente, de proteção dos mais vulneráveis.
Ainda de acordo com a MP, o mero nexo de causalidade entre a conduta e um eventual resultado danoso não deve implicar na responsabilização do agente público. Além disso, deve ser considerado o contexto incerteza "acerca das medidas mais adequadas para enfrentamento da pandemia da covid-19 e das suas consequências, inclusive as econômicas".
O Professor da FGV Direito SP, Carlos Ari Sundfeld, afirma que a MP 966 foi imediatamente criticada, mas que apesar disso,é correta. Ela apenas repete, para a pandemia, regras que já estão em outras leis. Ele afirma que a MP responsabiliza gestores que cometem erros grosseiros ou são mal intencionados. Também reconhece que gestores não podem ser punidos por decisões que pareceram acertadas nas circunstâncias do momento, mas depois vêm a ser declaradas como irregulares. “No mundo civilizado é exatamente esse o regime da responsabilidade pública." (colaborou Zínia Baeta, de São Paulo)