Correio Braziliense, n. 22613, 14/02/2025. Política, p. 8
PF mira emenda para hospital
Israel Medeiros
Maria Beatriz Giusti
A Polícia Federal deflagrou, ontem, uma operação de busca e apreensão contra um suposto grupo criminoso que cobrava propina por emendas parlamentares enviadas a um hospital no Rio Grande do Sul.
Os agentes cumpriram 13 mandados em Brasília e em cinco cidades do Rio Grande do Sul, com a autorização do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF). Foram apreendidos R$ 350 mil e aparelhos celulares que estavam escondidos em um escritório.
Um dos alvos foi Lino Rogério da Silva Furtado, secretário parlamentar do deputado federal Afonso Motta (PDT-RS).
O congressista não foi alvo da operação. Segundo a PF, Furtado atuava com um lobista que cobrava propina de 6% sobre as emendas que saíam do gabinete de Motta para o Hospital Ana Nery, em Santa Cruz do Sul (RS).
O lobista era Cliver Andre Fiegenbaun, dono da empresa CAF Representação e Intermediação de Negócios. Ele também era diretor financeiro e administrativo da Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional (Metroplan), ligado ao governo estadual. O ministro Flávio Dino mandou bloquear bens dos investigados no valor de R$ 509 mil.
Com base em provas obtidas do celular de Fiegenbaun, a polícia descobriu que ele emitiu uma série de notas fiscais que variavam de R$ 100 mil a R$ 670 mil, relativas aos seus serviços de captação de emendas, posteriormente enviadas ao Hospital Ana Nery. Também encontrou conversas entre Fiegenbaun e Lino Furtado a respeito do esquema. Ambos foram afastados de seus cargos públicos por ordem de Dino.
O deputado Afonso Motta estava no Rio Grande do Sul quando soube da operação e decidiu retornar a Brasília.
Quando chegou, à tarde, conversou com o presidente da Câmara, Hugo Motta (RepublicanosPB), sobre o caso. O encontro foi a portas fechadas.
Na chegada à Câmara, Hugo Motta havia dito a jornalistas que está acompanhando o caso “para garantir que tudo seja conduzido da forma mais correta possível”. Ele não falou sobre o assunto depois da conversa.
Na saída da reunião, Afonso Motta negou ter conhecimento de qualquer irregularidade. “Eu não apareço como investigado, mas claro que isso não diminui a nossa preocupação com a circunstância, com o nosso trabalho, com a forma de proceder, que sempre tivemos, de fazer os encaminhamentos de emendas com critério, cumprindo as formalidades”, afirmou.
Embora Lino Furtado já esteja afastado, Afonso Motta disse que demitirá o secretário, que ficava com ele no apartamento funcional quando estava em Brasília. Segundo o parlamentar, o funcionário trabalha com ele há 15 anos.
“Estou preocupado e abalado porque é inadmissível uma situação como essa. De certa forma, atinge o meu mandato. Muito mais do que a questão pessoal, é o mandato, que fica limitado.
Recebe uma espécie de uma censura, uma crítica, e isso é muito importante para quem está aqui por princípio, por idealismo, que acredita no processo do Parlamento”, frisou. Impacto político As evidências de um esquema envolvendo as emendas parlamentares poderão mudar a dinâmica de forças em Brasília. Desde o ano passado, o Legislativo e o Judiciário travam uma guerra em torno da transparência desses recursos. O STF exige mais transparência, especialmente no processo de destinação e pagamento das verbas.
Os líderes do Congresso, no entanto, querem manter o atual modelo, argumentando que já existem medidas suficientes para coibir a corrupção. Com uma reunião de conciliação entre o Judiciário e o Legislativo marcada para o fim do mês e uma série de emendas ainda bloqueadas, a operação foi um balde de água fria nos parlamentares.
No caso de Afonso Motta, o fato de não ter sido alvo das operações poderá dar-lhe respiro político. É o que avalia o cientista político Geraldo Tadeu, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Acredito que, no curto prazo, o próprio deputado vai ter o seu nome vinculado, e isso trará um prejuízo político, sem dúvida. Mas não acredito que, em dois anos, nas próximas eleições, isso não vá ser absorvido”, destacou.
Frase
“Eu não apareço como investigado, mas claro que isso não diminui a nossa preocupação com a circunstância, com o nosso trabalho, com a forma de proceder que sempre tivemos, de fazer os encaminhamentos de emendas com critério, cumprindo as formalidades”
Afonso Motta (PDT-RS), deputado federal