O GLOBO, n 32.313, 25/01/2022. Política, p. 7

BOLSONARO POUPA FUNDÃO EM CORTES NO ORÇAMENTO

Daniel Gullino e Gabriel Shinohara


Verba pública para financiar as eleições deste ano é sancionada em R$ 4,9 bilhões, mas ainda pode ser aumentada

O presidente Jair Bolsonaro sancionou o Orçamento de 2022 com um valor de R$ 4,9 bilhões para o fundo eleitoral, mas esse montante ainda pode chegar a R$ 5,7 bilhões, conforme previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O valor sancionado, publicado ontem no Diário Oficial da União, é quase o triplo do destinado às campanhas nas eleições presidenciais de 2018. O governo decidiu concentrar os cortes nos ministérios do Trabalho e da Educação.

Segundo fontes do Congresso, o aumento no valor do fundão poderá ser incluído posteriormente durante o reajuste da peça orçamentária, a partir de um projeto de lei do Congresso (PLN) enviado pelo governo. O entendimento é que essa reajuste não pode partir de parlamentares, que aprovaram o valor de R$ 4,9 bilhões.

O valor de R$ 4,9 bilhões foi estabelecido pelo Congresso na Lei Orçamentária Anual (LOA),o texto que define o Orçamento de fato. Entretanto, na LDO, que estabelece parâmetros para a elaboração do Orçamento, o fundo eleitoral ficou em R$ 5,7 bilhões. Por isso, há dúvidas se o governo precisa seguir a Lei de Diretrizes Orçamentárias.

EFEITO SANFONA

Bolsonaro também manteve no Orçamento as emendas de relator, que permitem o chamado orçamento secreto, instrumento pelo qual o Executivo destina verbas a pedido de parlamentares, sem que eles sejam identificados.

O presidente vetou R$ 3,1 bilhões em despesas de diversas áreas, mas elas foram retiradas de outras fontes de receitas. Desse montante, R$1,3 bilhão havia sido previsto em um tipo diferente de emenda, a de comissão, e R$ 1,8 bilhão em despesas discricionárias.

No ano passado, Bolsonaro chegou a vetar o artigo da LDO que abria espaço para aumentar o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões —valor das  eleições municipais de 2020— para R$ 5,7 bilhões, após sofrer pressão de apoiadores. Ele se elegeu com discurso contrário ao financiamento público de campanha. Entretanto, o veto foi derrubado pelo Congresso, com ampla maioria, unindo parlamentares de esquerda e de direita. O governo também não se empenhou para manter o veto. Candidato à reeleição, Bolsonaro será beneficiado com um valor maior do fundo eleitoral.

A legislação em vigor estabelece que os presidenciáveis podem usar até R$ 70 milhões em suas campanhas e outros R$ 35 milhões caso passem ao segundo turno. O aumento do bolo total deve permitir um crescimento do que foi gasto pelos presidenciáveis em 2018. Lideranças partidárias acreditam, porém, que os valores extras serão direcionados em sua maior parte para as campanhas de deputados federais.

Durante a votação do Orçamento de fato, houve um acordo entre os parlamentares para abaixar o valor para R$ 4,9 bilhões, com o intuito de reduzir críticas da opinião pública.

Após a derrubada do veto, o partido Novo entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão do aumento. Na semana passada, a Advocacia Geral da União (AGU) defendeu a constitucionalidade do aumento. O relator é o ministro André Mendonça, indicado por Bolsonaro, que ainda não tomou uma decisão.

“Não se apresenta razoável partir da premissa de que a destinação de recursos para campanhas eleitorais, definida por critérios legais, estaria a depender de um sarrafo quantitativo para sabermos se atende ou não ao princípio constitucional da moralidade”, diz a manifestação da AGU, que foi referendada por Bolsonaro.

O fundo eleitoral foi criado pelo Congresso em 2017 na esteira da Operação Lava-Jato. Bancado com recursos públicos, foi uma alternativa para compensar a proibição de doações de pessoas jurídicas a campanhas, determinada em 2015 pelo STF.

Em dezembro de 2019, o Congresso aprovou destinar R$ 2 bilhões para o fundão nas eleições de 2020. Líderes partidários chegaram a sugerir elevar o valor para R$ 3,8 bilhões, mas Bolsonaro sinalizou que vetaria.