O Estado de S. Paulo, n. 47974, 21/02/2025. Política, p. A10

Negócios de ‘concierge’ do PCC envolvem empresas de ônibus, diz PF
Marcelo Godoy
Heitor Mazzoco

 

 

“As principais entradas (de dinheiro na conta de uma empresa que seria usada pelo PCC) são TEDs de empresas de transporte e pessoas físicas, com destaque para a Transwolff Transportes e Turismo Ltda.”

Polícia Federal

A Polícia Federal (PF) e a Receita encontraram transações financeiras entre empresas controladas pelo grupo do empresário Willian Barile Agati, apontado como “concierge” do Primeiro Comando da Capital (PCC), e duas das maiores empresas de ônibus de São Paulo: a Transwolff e a Transunião. Os federais investigam pagamentos que chegam a R$ 10 milhões e envolvem a empresa Jet Class Aviation S.A.

A Transwolff foi alvo da Operação Fim da Linha, em abril de 2024, e, em janeiro deste ano, teve seu contrato com a Prefeitura de São Paulo rescindido por decisão do chefe do Executivo municipal, Ricardo Nunes (MDB). Ela é acusada de lavar dinheiro do PCC ao lado de outra empresa, a UPBus. A Transunião virou alvo do Ministério Público estadual em razão de pagamentos de R$ 70 mil semanais ao PCC.

A Transunião tem 482 ônibus em sua frota, opera em dois lotes do sistema de transporte público de São Paulo e possui dois mil funcionários. Diretores da empresa são suspeitos de extorsão e lavagem de dinheiro no inquérito que apura o assassinato de Adauto Soares Jorge, seu ex-presidente, morto a tiros em 4 de março de 2020, em um estacionamento no Lajeado, na zona leste.

A empresa, que teve entre seus fundadores o vereador Senival Moura (PT), informou ao Estadão ter desligado o conselheiro apontado pelas investigações como envolvido com o crime organizado. Willian Agati nega crimes e questiona a legalidade das provas obtidas pela PF. A Transwolff refutou as informações de vínculo com o crime organizado.

EMPRESAS. Segundo as investigações que deram origem à Operação Mafiusi, da PF, deflagrada em 10 de dezembro de 2024, Agati participou do quadro societário de 12 empresas. Parte dessas firmas, segundo a Receita, “apresentam características de empresas não operacionais”, ou seja, teriam sido constituídas para dissimular operações com o objetivo de “dar lastro e aparência de licitude aos acréscimos patrimoniais ocorridos no período”.

O delegado Eduardo Verza, do Grupo Especial de Investigações Sensíveis (Gise), de Curitiba, da PF, descreveu centenas de operações envolvendo

dezenas de empresas e pessoas físicas que teriam facilitado operações financeiras do império bilionário de Agati. Um dos casos tratados é o da Jet Class Aviation S.A. A empresa está em nome de um laranja, de acordo com a PF.

CRÉDITOS. Para a PF, não há dúvidas de que a Jet Class era usada pela organização criminosa no esquema de tráfico transcontinental de cocaína em aeronaves privadas. Conforme um Relatório de Informação Financeira (RIF), no período de 1.º de dezembro de 2020 até 12 de janeiro de 2021, foram identificados créditos de R$ 1.308.631 na empresa. “As principais entradas são TEDs de empresas de transporte e pessoas físicas, com destaque para a Transwolff Transportes e Turismo Ltda.”

No caso da Transunião, os federais chegaram à empresa por meio da análise das contas do investigado Fábio Fernandes de Souza, o Fábio Jaga, então conselheiro da companhia. Jaga foi identificado por meio de transações financeiras suspeitas com a MJ Augusta Representações Comerciais, de propriedade de Marcos José de Oliveira. Preso, Oliveira delatou o PCC e Agati.

Jaga é sócio na empresa Universo Bus Comércio e Serviço ao lado de Jair Ramos de Freitas, o “Cachorrão”, que foi preso em 2022 sob suspeita de ter executado Adauto Jorge a mando do PCC. A partir da análise de dados bancários de Cachorrão, os federais estabeleceram o vínculo dele com a Transunião, empresa que, “comprovadamente envolvida na lavagem de dinheiro do PCC, transacionou cerca de R$ 8,18 milhões” com Cachorrão.

Procuradas, as defesas de

Cachorrão e dos outros citados não foram localizadas.

DEFESAS. Em nota, a Transwolff refutou as informações de vínculo com o crime organizado e disse que a empresa e seus dirigentes jamais tiveram relações com organizações criminosas. “Todos os esclarecimentos estão demonstrados no procedimento administrativo perante a Secretaria dos Transportes e no processo que corre sob sigilo.”

Diretora da Transunião, Kelly Ribeiro declarou que a companhia adotou política de compliance e criou um departamento de controladoria “para avaliar todos os contratos em uma tentativa de evitar novas transações que possam comprometer a empresa”.

O advogado Anderson Minichillo da Silva Araújo afirmou que as transações envolvendo R$ 8 milhões foram lícitas e destinadas para a compra de ônibus. A direção informou que desligou Fábio Jaga da função de conselheiro quando as investigações apontaram possível transação financeira envolvendo crime organizado