Valor
Econômico, 19/05/2020, Brasil, p. A6
Bolsonaro
quer ministro da Saúde alinhado
e que ‘aguente o tranco’
Fabio
Murakawa
O
presidente Jair Bolsonaro não tem pressa para escolher o próximo
ministro da Saúde e procura um nome alinhado a ele na questão da
cloroquina e do isolamento social para ocupar o posto, que em menos
de um mês teve Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich como
titulares.
A recomendação para o uso do medicamento logo
nos estágios iniciais da doença e uma abordagem mais permissiva em
relação circulação de pessoas e ao funcionamento da economia são
bandeiras de Bolsonaro que os dois ministros da Saúde que ele nomeou
não compraram.
Até ontem, ainda não havia definição
quanto a um substituto. Mas pessoas próximas dizem que Bolsonaro
agora está convencido de que não basta ser um bom técnico na área
para ocupar o posto. É preciso também defender abertamente as
ideias do presidente na condução da pandemia de covid-19, a doença
causada pelo coronavírus - sobretudo em relação à cloroquina
e ao isolamento social.
O
candidato deve ser firme e não ter medo das críticas que virão por
abraçar as ideias de Bolsonaro. Nas palavras de um interlocutor do
presidente, tem que “segurar o rojão e aguentar o
tranco”.
Ministros militares também vêm aconselhado
Bolsonaro a escolher um civil para o posto. Um argumento é o de que
é preciso escolher um médico renomado nacionalmente, algo que em
tese não existe dentro das Forças Armadas.
Por trás
desse movimento, há também a preocupação de que, com o ministério
todo “fardado”, os militares podem ter de arcar com a
responsabilidade política pelas mortes por conta da covid-19.
A
saída de Teich na sexta-feira surpreendeu o presidente e seus
auxiliares mais próximos. Embora Bolsonaro e a ala mais ideológica
do governo já tivessem iniciado um processo de fritura de Teich, não
se esperava que o ministro desistisse tão rapidamente.
Antes
de deixar o posto, o então ministro anunciou que estava preparando
diretrizes junto com os secretários estaduais de Saúde sobre em que
situações aplicar medidas que vão do isolamento leva até o
“lockdown”. A partir desse anúncio, que contraria a orientação
do presidente, o bombardeio sobre ele aumentou.
Na versão
de fontes do governo, não foi apenas por causa da cloroquina e do
isolamento social que Teich se demitiu. Segundo essas fontes, ele
“sentiu a pressão” do cargo e andava deprimido nos dias que
antecederam sua saída. Integrantes da ala ideológica do governo - a
que segue os preceitos do filósofo Olavo de Carvalho, outro que
minimiza os efeitos
da pandemia – definiram Teich como ‘fraco”.
O
secretário-executivo da pasta, general Eduardo Pazuello, permanecerá
no cargo de ministro da Saúde como interino por quanto tempo for
necessário. Ainda sob a gestão de Teich, Pazuello fez mais de uma
dezena de nomeações e já comanda praticamente toda a parte
operacional do ministério.
Pazuello também deve assinar
em sua interinidade um novo protocolo do ministério, recomendando o
uso da cloroquina nos estágios iniciais da doença - uma bandeira
política de Bolsonaro. A medida retiraria um “bode da sala” do
próximo ministro da Saúde, que assumirá com esse assunto já
resolvido.
Dentre os nomes especulados estão o de Ítalo Marsili, defendido pela ala olavista. Há também quem acredite que o deputado Osmar Terra (MDB-RS) voltou ao páreo. Ele é um defensor da cloroquina e crítico do isolamento social.