Título: O contribuinte indefeso
Autor: Branco, Rubens
Fonte: Jornal do Brasil, 19/05/2008, Economia, p. A19

Nosso país continua sendo difícil de entender em algumas áreas. Atualmente, tramitam no Congresso Nacional duas iniciativas legislativas, que se aprovadas, colocarão o cidadão contribuinte cada vez mais contra a parede.

Uma delas é a volta da CPMF a ser proposta pelo governo com o objetivo de aprovar a Emenda 29, que amplia em R$ 24 bilhões o orçamento da saúde nos próximos quatro anos.

Segundo divulga a imprensa, a recriação da CPMF ¿ imposto ruim que foi eliminado pelo Congresso Nacional no fim do ano passado ¿ já estaria, inclusive, acertada entre alguns ministros e líderes do governo. Malandramente, a nova CPMF, segundo os autores da proposta, viria com uma alíquota mais baixa, mas sem a garantia de não ser aumentada no futuro ¿ será apresentada em conjunto com o aumento da tributação sobre o fumo e bebidas alcoólicas, tudo sob o discurso de reunir mais recursos para a área da Saúde. Este filme já vimos antes.

Outra medida transitando no Congresso vem da Procuradoria da Fazenda Nacional e visa reformular a lei de execução fiscal e permitir que, ainda na fase de uma discussão administrativa de uma eventual dívida fiscal, possa haver por parte dos procuradores o poder de bloquear bens do contribuinte sem a prévia e necessária análise pelo Poder Judiciário.

É um verdadeiro absurdo admitir que o credor de uma dívida possa bloquear bens do devedor em potencial e só depois de tal bloqueio levar o assunto para a devida análise do Poder Judiciário.

Ainda que se trate da cobrança de impostos não se pode, a priori, admitir que sem a análise prévia do Judiciário ¿ poder independente para analisar com isenção a demanda ¿ possam os procuradores da Fazenda passar a ter o poder de tomar medidas desta gravidade contra o patrimônio do contribuinte.

Caso tal tipo de proposta venha a ser aprovada no Congresso, os procuradores da Fazenda deixariam de ser defensores do patrimônio da União para a situação de acusadores e juízes a um só tempo.

É difícil entender a proposta de tal absurdo quando se sabe que grande número de cobranças de impostos contém erros e em muitos casos a cobrança não procede.

A desculpa para tal absurdo inverte a equação de uma sociedade democrática. Em uma democracia procura-se o bem geral da população dentro de regras que devem ser observadas por todos, mas nunca se esquecendo de que o que se busca, no final das contas, é a garantia dos direitos do cidadãos, nunca os direitos do Estado.

Estamos, aparentemente, perdendo esta perspectiva e entregando a conta da lentidão da Justiça e erros de funcionários para o contribuinte que será, mais uma vez, desrespeitado nos seus direitos fundamentais, ficando sujeito a constrangimentos na maioria das vezes desnecessários.

Tal proposta é, a meu ver, inconstitucional, pois macula o devido processo legal por mais argumentos que utilize a PFN para a defesa deste mecanismo. Fiquemos pois de olho em nossos representantes no Congresso para cobrar deles a defesa daqueles que os elegem e pagam seus salários.

Rubens Branco é advogado tributarista e sócio do escritório Branco Consultores Tributários.