Valor Econômico, 20/05/2020, Brasil, p. A3

Brasil pede adesão a acordo anticorrupção da OMC

Assis Moreira


O Brasil deu o primeiro passo para abrir seu mercado de compras públicas de US$ 157 bilhões a empresas estrangeiras e, ao mesmo tempo, para suas companhias terem melhor acesso a um mercado externo de US$ 1,7 trilhão.

O embaixador Alexandre Parola apresentou ontem formalmente ao diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo, o pedido brasileiro para aderir ao Acordo de Compras Governamentais (ACG), considerado o “acordo anticorrupção” das trocas globais.

O Brasil tornou-se assim o primeiro país latino-americano a pedir adesão a esse acordo de compras públicas de bens, serviços e obras de construção civil. As negociações sobre as condições de entrada vão poder começar com os 48 participantes.

“É um passo importante no sentido de integração da economia brasileira, respeita o dinheiro do pagador de imposto, licitações transparentes, ampla concorrência e [abre] um mercado de mais de US$ 1 trilhão que as empresas brasileiras podem disputar”, afirmou o embaixador.

Para o secretário de Comércio Exterior, Lucas Ferraz, trata-se de “mais uma quebra de paradigma na política comercial brasileira, representando um enorme salto qualitativo em nosso arcabouço institucional”.

De seu lado, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) alertou que a adesão brasileira “precisa ser pautada pelo equilíbrio entre o que o país irá ofertar e o que será aberto de marcado aos exportadores brasileiros”.

O diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Eduardo Abijaodi, observou que o Brasil é o sexto maior mercado de compras públicas do mundo, com US$ 157 bilhões por ano, o que torna a discussão ainda mais relevante para o país.

Ele mencionou relatório do governo americano, no qual os EUA fazem críticas ao acordo. Segundo a CNI, os EUA incluíram pouco mais de 40% de suas compras totais no ACG da OMC, enquanto a União Europeia incluiu 20%, e o Japão, apenas 7%.

Ao final do processo negociador com os 48 membros do acordo, incluindo UE, Japão e Estados Unidos, “o Brasil permitirá a participação de empresas estrangeiras nos certames públicos, em suas várias esferas governamentais, as quais estarão submetidas às mesmas condições das empresas nacionais”, observou Ferraz.

Ele destacou que com isso “combate-se frontalmente a formação de cartéis em compras públicas, garantindo-se ao governo acesso a bens mais baratos, de maior variedade e melhor qualidade”.

O Brasil tornou-se observador no ACG em outubro de 2017, para acompanhar as discussões mais atuais sobre compras públicas e capacitar seu corpo técnico para as negociações comerciais que incluem capítulos sobre o tema e das quais o Mercosul é parte.

As vantagens em transparência e não discriminação dividem-se em duas frentes, na visão do governo: ao promover maior concorrência, a relação custo-benefício nas compras públicas é otimizada; e, ao servir de instrumento de boa governança, o acordo auxilia no combate a possíveis práticas anticoncorrenciais.

A avaliação no governo é de que os compromissos exigidos dos membros do ACG e suas vantagens coadunam-se com as diretrizes gerais do atual governo, especificamente na liberalização e na reforma administrativa. Ao promoverem maior concorrência nas compras públicas, estão em linha com a consecução de política econômica e seu componente central de equilíbrio fiscal do setor público.

O Brasil deverá apresentar sua primeira oferta de acesso a mercados e responder ao documento inicial para que o comitê da OMC possa avaliar a legislação vigente sobre compras públicas.

A oferta brasileira será objeto de negociações bilaterais com as demais membros do ACG, que a aceitarão ou demandarão eventuais melhorias. O processo de acessão como membro pleno somente é concluído depois que todas as partes do ACG aprovem a oferta brasileira, e pode demorar anos.

Os membros atuais do ACG são Armênia, Aruba-Holanda, Austrália, Canadá, Coreia do Sul, Estados Unidos, Hong Kong-China, Islândia, Israel, Japão, Liechtenstein, Moldova, Montenegro, Nova Zelândia, Noruega, Cingapura, Suíça, Taiwan, Ucrânia, além da UE e de seus Estados-membros. Outros 34 países são observadores. Na América do Sul, além do Brasil, são observadores Argentina, Chile, Colômbia, Equador e Paraguai.