Valor Econômico, 21/05/2020, Política, p. A8
Relator no STF, Barroso vota a favor de limitar efeitos da MP966
Isadora Peron
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou ontem para limitar os efeitos da Medida Provisória 966, que flexibiliza a punição de agentes públicos por decisões tomadas durante a pandemia da covid-19. Após a manifestação do ministro, que é relator das ações que questionam a MP, a sessão do plenário foi suspensa. O julgamento vai ser retomado hoje.
De acordo com o texto da medida provisória, editada pelo governo na semana passada, agentes públicos envolvidos na resposta à pandemia e aos danos por ela causados na economia só poderiam ser punidos se ficar comprovada a intenção de fraude ou “erro grosseiro”.
Barroso não derrubou a MP, mas destacou que o alcance não isenta de punição os servidores que cometerem atos ilícitos ou de improbidade. Ele também fez críticas ao texto, que, segundo ele, “não eleva a segurança dos agente” e “passou a impressão de que se estava querendo proteger coisas erradas”.
Em seu voto, o ministro também definiu que deve ser considerado “erro grosseiro” medidas que contrariem critérios científicos e técnicos estabelecidos por organizações e entidades médicas e sanitárias nacional e internacionalmente reconhecidas, ou que não observem os princípios constitucionais da precaução e da prevenção.
Sem citar o protocolo editado ontem pelo governo, Barroso disse ainda que um dos temas que têm dominado o debate público durante à pandemia “refere-se à utilização de determinados medicamentos, de eficácia ou segurança ainda controvertidas na comunidade científica, para o combate à enfermidade, como é o caso da hidroxicloroquina”.
Durante o voto, o ministro afirmou que procurou dar uma “solução equilibrada” ao caso. Por isso, optou por não anular o ato do governo, mas, ao mesmo tempo, excluiu “da sua interpretação sentidos que poderiam ser violadores dos nossos deveres de proteção à vida e à saúde das pessoas”.
Em meio à críticas pelo fato de ministros do STF terem barrado medidas adotadas pelo presidente Jair Bolsonaro de maneira monocrática, o ministro decidiu não dar uma liminar sobre o caso sozinho e, sim, levá-lo diretamente para ser discutido pelo plenário.
Ele liberou as ações para julgamento anteontem, e o presidente da Corte, Dias Toffoli, mudou a pauta do plenário para incluir a análise da matéria na sessão de ontem.
As sete ações no Supremo contra a MP foram movidas pelos partidos Rede Sustentabilidade, PSL, PCdoB, PDT, PV, Cidadania e pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI).
A maior preocupação é que a MP possa abrir brechas para irregularidades e garantir uma “blindagem” a autoridades públicas, o que poderia implicar em anistia ou o salvo-conduto a toda e qualquer atuação de integrantes do governo.
O presidente Tribunal de Contas da União, José Múcio Monteiro, também fez duras críticas à MP. Segundo ele, a medida é um incentivo para quem quer errar.