O GLOBO, n 32.316, 28/01/2022. Economia, p. 14

Aneel autoriza estudo de hidrelétricas na Amazônia

Gabriel Shinohara


Agência estende prazo para avaliar viabilidade de três usinas na bacia do Rio Tapajós. Análise de dados tem sido prorrogada por anos em razão do impacto em áreas protegidas e terras indígenas. Para Eletronorte, elas atenderiam 5,5 milhões de famílias

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prorrogou, na última segunda-feira, o prazo para que a Eletrobras e a sua subsidiária Eletronorte elaborem estudos de viabilidade técnica e econômica para a construção de três grandes usinas hidrelétricas na bacia do Rio Tapajós, na Amazônia.

A construção desses empreendimentos é criticada por ambientalistas, e a liberação dos estudos ocorre no momento em que o Brasil assumiu compromissos ambientais para viabilizar a entrada na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCE), conhecida como “clube dos ricos”. Em carta enviada à organização, o presidente Jair Bolsonaro reforçou compromissos para combater o aquecimento global e acabar com o desmatamento.

DEPENDE DE LICENCIAMENTO

As empresas agora têm até 31 de dezembro de 2023 para apresentar esses estudos à reguladora. A informação foi publicada pelo Estado de S.Paulo e confirmada pelo GLOBO.

De acordo com os documentos da Aneel, a usina de Jamanxim teria uma potência de 881 mil kW; Cachoeira do Caí, 802 mil kW; e Cachoeira dos Patos, 528 mil kW. Segundo a Eletronorte, elas poderiam gerar energia para atender 5,5 milhões de famílias.

O prazo de apresentação desses estudos vem sendo prorrogado há mais de dez anos por conta de possíveis impactos da construção da usinas em áreas protegidas e terras indígenas. O primeiro pedido de autorização data de 2009 e o último prazo acabou no dia 31 de dezembro de 2021, depois de uma série de prorrogações, sempre de dois anos.

Segundo a Aneel, não há plano para implantar as usinas, que não constam do planejamento do setor elétrico para os próximos dez anos. Em nota, a agência destacou também que só vai avaliar o caso após a conclusão dos estudos, e caso seja obtido licenciamento ambiental.

“Somente após a aprovação do estudo de viabilidade técnica e econômica (EVTE) pela Aneel é que as usinas, por decisão do Ministério de Minas e Energia, poderão ingressar no plano de concessões do setor elétrico”, afirma.

DESMATAMENTO

Suely Araújo, especialista em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, ressaltou que a bacia do Rio Tapajós tem alta relevância ambiental e social e os impactos socioambientais tendem a ser muito grandes.

—São hidrelétricas de tamanho considerável e vão gerar, principalmente consideradas no seu conjunto, desmatamento, perda de biodiversidade, problema com os peixes, outros problemas na fauna, deslocamento populacional e atração de trabalhadores pelas obras, com impactos sociais —afirmou.

Em nota, a Eletronorte disse que todos os projetos são viáveis tecnicamente e trariam ganhos para a população brasileira por gerarem energia “limpa e renovável” com custo “potencialmente inferior” a outras fontes.

“A proposta de implantação sob o conceito de Usina Plataforma traria recursos para adequada proteção das unidades de conservação próximas, transformando os empreendimentos em potenciais âncoras permanentes de conservação ambiental nas áreas onde seriam implantados, contribuindo para o desenvolvimento sustentável da região amazônica”, diz a nota.

RESERVATÓRIO MENOR

Usina-Plataforma é um tipo de hidrelétrica com menor desmatamento, por ter um reservatório menor. Isso não leva em conta, porém, os deslocamentos de trabalhadores e a construção de linhas de transmissão de energia, por exemplo.

A especialista do Observatório do Clima diz ainda que a posição da Eletronorte de que os projetos são viáveis tecnicamente acende um alerta, porque indicaria a disposição pela decisão de construir as hidrelétricas.

— Quando você faz isso numa região com alta relevância ambiental e frágil, essa opção pode ser questionada mesmo na fase dos estudos. Será que essa é mesmo a região adequada para fazer esse tipo de empreendimento? —questionou.