O Estado de S. Paulo, n. 47993, 12/03/2025. Economia & Negócios, p. B2
Negociadores do Brasil tentam manter sistema de cotas para aço
Ivo Ribeiro
De acordo com especialistas, três siderúrgicas brasileiras devem ser mais afetadas com as tarifas impostas pelo governo Trump para as exportações de aço e alumínio para os EUA. São elas: CSN, que embarca produtos laminados de alto valor agregado, e ArcelorMittal e Ternium, fabricantes de placas que exportam a maior parte de sua produção para o mercado americano. A Usiminas faz vendas esporádicas para os EUA. A Casa Branca confirmou ontem que as tarifas de 25% sobre aço e alumínio entram em vigor hoje.
No alumínio, a CBA, controlada pelo grupo Votorantim, é quem mais sofre, pois exporta produtos laminados (folhas), mas o volume não passa de 5% das vendas da empresa, segundo informações. De acordo com dados da Associação Brasileira do Alumínio (Abal), os embarques para os EUA representaram 17% (US$ 267 milhões) do total exportado pelo setor no ano passado – US$ 1,5 bilhão.
À primeira vista, o grupo Gerdau deve se beneficiar com a proteção que Trump busca dar aos produtores locais. Além de não vender nada para os EUA, a companhia tem fabricação de aço (produtos longos comuns e especiais) no país, de onde extrai 40% de sua receita anual. Nos cálculos de analistas, a Gerdau pode obter ganhos expressivos com os aumentos de preços do aço que já acontecem desde fevereiro no mercado americano.
Um especialista que acompanha o setor informou ao Estadão que alguns tipos de produtos siderúrgicos planos já tiveram aumentos de mais de 15% nos preços. A tonelada de aço plano já subiu cerca de US$ 100 (R$ 583) desde o anúncio da tarifa de 25% para todos os aços importados. A alta tem reflexos nos vários elos da cadeia produtiva.
Na semana passada, após algumas tentativas, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin, teve uma conversa de quase uma hora com o secretário de Comércio de Trump, Howard Lutnick, e o representante comercial dos
EUA ( USTR) , J a mi e s o n Greer. Lutnick e Greer ficaram de levar a Trump pedido para adiar a data para a entrada em vigor das tarifas sobre os dois produtos brasileiros – o que acabou não acontecendo. Alckmin defende o sistema de cotas livres de taxas.
Os americanos pedem, em troca, abertura de diálogo, por exemplo, sobre o Imposto de Importação que o Brasil aplica ao etanol comprado dos EUA, considerado muito alto (18%). Segundo pessoas a par do encontro, realizado por teleconferência, Alckmin e os dois assessores de Trump ficaram de se falar de novo nesta semana.
Procuradas, as empresas de aço e de alumínio, o Instituto Aço Brasil e a Abal informaram que preferem não se manifestar sobre a sobretaxa.
MAIOR DO PAÍS. Maior fabricante de aço no País, a ArcelorMittal tem duas siderúrgicas de placas, com produção livre anual para exportação na casa de 6 milhões de toneladas. Desse volume, quase 5 milhões vão abastecer a usina de laminação de bobinas de Calvert, no Alabama (EUA), em embarques diretos ao país via México. A laminadora é uma joint venture da empresa com a Nippon Steel. A diferença vai para outros clientes e para usinas do grupo na Europa.
Uma das siderúrgicas de placas da ArcelorMittal fica em Serra, no Espírito Santo, e a outra no Ceará, no complexo industrial e portuário de Pecém. São duas operações estratégicas do grupo, para atender a operações próprias no Brasil, nos EUA e na Europa.
Por sua vez, a Ternium, controlada pelo grupo ítalo-argentino Techint, tem uma siderúrgica no Rio de Janeiro, a Ternium Brasil, com capacidade para produzir 5 milhões de toneladas de placas por ano e que atualmente supre laminadoras do grupo no México – para plantas mexicanas de laminação da empresa – e um volume pequeno para unidades próprias na Argentina.
Das quase 687 mil toneladas de cotas de produtos acabados, cerca de um terço refere-se a material vendido pela CSN − aços zincados e galvanizados, que somam cerca de 230 mil toneladas. Para folhas metálicas, a cota é de 14 mil toneladas. Pessoas ligadas à empresa comentaram que, mantida a tarifa de 25% sobre esses produtos, a empresa ficará totalmente fora do mercado americano.
BALANÇA. Na cadeia siderúrgica, a balança comercial entre Brasil e Estados Unidos pesa a favor dos americanos, de acordo com informações de Marco Polo de Melo Lopes, presidente executivo do Aço Brasil. O comércio é favorável aos EUA em mais de US$ 3 bilhões. O grosso da exportação do Brasil é de aço semiacabado, de menor valor agregado, enquanto as importações somam mais de US$ 7 bilhões, incluindo US$ 1,4 bilhão de carvão metalúrgico (insumo na fabricação de aço), equipamentos e outros bens de alto valor agregado.
O Brasil é um dos maiores exportadores de aço do mundo, com 9,6 milhões de toneladas despachadas em 2024, o que gerou divisas de US$ 7,66 bilhões, conforme dados oficiais do Mdic, informados nos boletins do Aço Brasil.