O Estado de S. Paulo, n. 47997, 16/03/2025. Política, p. A10
Parlamentares empregam parentes de correligionários nos gabinetes
Bianca Gomes
Zeca Ferreira
Com quase 80% dos cargos preenchidos por indicações políticas, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) se transformou em uma rede de favorecimento, onde deputados empregam irmãos, primos e cunhados de aliados. Os parlamentares disseram que respeitam todas as regras da Casa.
“O que pode existir, nesses casos, é um questionamento sob a ótica da moralidade e da impessoalidade, que são princípios da administração pública”, afirmou o advogado Welington Arruda, especialista em Gestão Pública.
Um dos casos identificados é o do deputado André Bueno (PL). Ele assumiu o mandato em abril de 2024, substituindo Valéria Bolsonaro (PL), que se tornou secretária no governo Tarcísio de Freitas (Republicanos). Bueno nomeou Ana Beatriz Ramos Bolsonaro, filha de Valéria, como secretária especial parlamentar. Em janeiro, a remuneração bruta dela chegou a quase R$ 16 mil. Procurada, Valéria disse que a “nomeação é competência do Legislativo”.
Também no gabinete de Bueno trabalha Joyce Garcia Lopes, mulher do ex-vereador de São Bernardo do Campo Paulo Chuchu (PL), que já atuou como assessor do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). No último mês com dados disponíveis, o salário bruto de Joyce ultrapassou R$ 20 mil. Procurado, o ex-vereador disse que “não existem irregularidades nem imoralidades”. Bueno não respondeu.
Situação semelhante ocorre com o deputado Bruno Zambelli (PL), que nomeou em seu gabinete Rubens Fernandes de Santana, irmão da vereadora Sonaira Fernandes (PL), e Bruno Cesar de Pietro, primo de Rodrigo De Pietro (PL), ex-vereador que disputou a prefeitura de Taquaritinga (SP) em 2024 com apoio da família Zambelli. De Pietro afirmou que conheceu o deputado por meio do primo e não teve influência na nomeação. Sonaira e Zambelli não se manifestaram.
A deputada Carla Morando (PSDB) contratou Anacleto Morando Gerbelli, primo de seu marido, Orlando Morando (sem partido), atual secretário de Segurança Urbana de São Paulo. Ele ocupa o cargo de assistente parlamentar VI, com salário bruto de R$ 9,2 mil.
Carla Morando disse que a nomeação de Gerbelli atende a preceitos constitucionais e legais, não havendo qualquer tipo de irregularidade.
O deputado Danilo Campetti (Republicanos), que assumiu o mandato em junho de 2024 após articulação de Tarcísio, contratou Mauricio Pozzobon Martins como assessor especial, ganhando R$ 23,7 mil. Martins é casado com a irmã da primeira-dama de São Paulo, Cristiane Freitas.
Em nota, o governo de São Paulo declarou que “as nomeações no Legislativo estão sujeitas às normas constitucionais específicas e não se inserem na competência do chefe do Executivo estadual”. A Alesp disse que cada parlamentar tem autonomia para fazer as escolhas.
ESTRUTURA. A Alesp completou 190 anos no último mês ampliando gasto com verbas de gabinete. Para este ano, o Legislativo paulista aprovou orçamento de R$ 1,45 bilhão – para se ter ideia, Araçatuba (SP), com 200 mil habitantes, tem menos dinheiro (R$ 1,12 bilhão) do que a Casa para bancar a própria estrutura.
Uma fatia desse orçamento bilionário se destina à manutenção de gabinetes. A 1.ª Secretaria, comandada pelo PT, abriga 70 funcionários, enquanto a 4.ª Vice-Presidência, cargo de pouca relevância prática na Casa, tem oito servidores à disposição.
Somados, os dois anos da atual legislatura geraram gastos de R$ 67,55 milhões, ante R$ 48,89 milhões em valores corrigidos do primeiro biênio (2019 e 2020) da legislatura anterior. Esse recurso é utilizado para despesas do mandato, como assessoria, material de escritório e deslocamentos.
A Alesp não se manifestou. •
“O que pode existir, nesses casos, é um questionamento sob a ótica da moralidade e da impessoalidade, que são princípios da administração pública”
Welington Arruda Advogado especialista em Gestão Públic