Título: Não serei a válvula presa do PAC
Autor: Gerk, Cristine; Ambrosio, Marcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 24/05/2008, País, p. A3

Ministro do Meio Ambiente promete rapidez nas licenças e terá apoio para criar parques

Da Redação

A agenda apertada ainda inclui um tempinho para uma roda de samba na Gamboa. É a forma de o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, festejar um acordo que, segundo ele, pavimentará a nova política ambiental, e iniciar simbolicamente a mudança para Brasília, para a posse no dia 3 de junho. Ao Jornal do Brasil, no Rio, o ministro conta como deixou claro, no encontro com o presidente Lula e com a ministra Dilma Rousseff, que vai acelerar a emissão das licenças ambientais que travam o Programa de Aceleração do Crescimento. Em troca, selou o pacto com a Casa Civil, que dará à sua pasta, a partir de agora, apoio político e financeiro para suas ações. Apostando no diálogo, o ministro acena até para adversários como o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, acusado de ser o maior desmatador do país, e prega a participação de todos os setores na gestão ambiental e na formulação das políticas públicas.

Como será a relação com o governo de Mato Grosso, já que ali se concentrariam os maiores índices de desmatamento?

¿ Conversei com o secretário de Meio Ambiente de Mato Grosso. Ele quer me encontrar. Os ambientalistas dizem que a secretaria lá é a melhor estruturada da Amazônia e quero partir para uma linha de negociação com os setores avançados do agrobusiness. Nas próximas semanas me reunirei com a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais para tratar da soja e com exportadores de madeira, quero abrir uma linha de crédito no BNDES e para eles se estruturarem. Quem precisa de certificação para exportar (na Europa nada se compra da Amazônia sem auditagem), terá. Quem for na bruta, corte raso, vai ser tratado com a Polícia Federal. Quero mais rigor, mudar a lei de crimes ambientais e levo a equipe da Coordenação Integrada de Combate aos Crimes Ambientais (Cica) do Rio para Brasília. Junto com o pessoal do Tarso Genro vamos iniciar logo a Guarda Nacional Florestal, equivalente à Força Nacional.

Mesmo com a resistência do governador Blairo Maggi (MT) em ceder pessoal?

¿ Isso foi num primeiro momento. A conversa vai evoluir. Tive de fazer algo mais forte no começo, Marina Silva era a defensora da floresta e lá fora a ecologia do Brasil tem uma palavra só, Amazônia. A sinalização era a de que ela jogou a toalha e a floresta ia virar carvão. Se eu não chegasse com tudo, falando grosso, em Exército, não ia dar. Pedi apoio ao presidente para a Guarda Nacional e para a resolução do Banco Central que só dá crédito para quem tem regulamentação fundiária. Ele me deu. Agora vou partir para trazer dinheiro, garantindo para o mundo que teremos mais rigor. Não defendemos bioma só com polícia, e sim com estruturação econômica não predatória.

E o desmatamento? Não subiu apesar de operações como a Arco de Fogo, no Pará?

¿ Há dois índices de desmatamento. Um sai uma vez por ano, em julho e agosto, e é preciso. O outro, o Deter, detecta em tempo real. É mensal, é falho, mas tem a vantagem de orientar uma ação imediata em caso de fortes indícios. O Deter que sairá na sexta-feira vem aumentando desde novembro em relação aos meses anteriores e os mesmos meses do ano passado. Temos um alerta de uma situação perigosa, vamos reunir o time, ver o que falhou e entender por que, apesar das medidas, o Deter subiu. Será o foco das minhas primeiras reuniões. Temos de ver quem está escapando do arco de fogo e repreender.

A negociação com os setores produtivos, com madeireiras e produtores de oleaginosas não bate com o Programa da Amazônia Sustentável, atribuição do ministro Mangabeira Unger?

¿ O PAS foi escrito por cinco ministérios, o Meio Ambiente fez a metade. Há a agenda de controle, monitoramento e repressão e a agenda do Arco Verde, com dinheiro e incentivo para agricultura sustentável, indústria não poluente, biotecnologia e manejo florestal sustentável. Vamos optar por um caminho mais simples, que possibilite a milhares de pessoas se legalizarem. O presidente estipulou que o ministro Mangabeira será aquele que reportará a ele as grandes estratégias, que sinalizará onde precisa reforçar. Não vai gerir, até porque o ministério não tem capilaridade nem estrutura.

O ministro Mangabeira Unger não pensa diferente quanto à exploração da Amazônia? O sr. acredita que ele será um bom gestor para o PAS?

¿ Conheço o Mangabeira, já estive com ele e o acho sério, preparado e respeitado internacionalmente. Vejo que terei bom diálogo com ele e acho que tem boas idéias. Também não creio que a Amazônia deva ser um santuário e sim que tenha práticas sustentáveis. Para isso é preciso verba do BNDES para estruturar as áreas ocupadas, uma agricultura visando áreas já desmatadas, sem avançar pela floresta. É preferível alguém fazendo cadeira numa fábrica que usa madeira sustentável do que outro sem madeira, que entra na mata de correntão. Com a Academia Brasileira de Ciência, quero pesquisa de ponta para biotecnologia, biociência e biogenética, que é o banco do futuro. Hoje, a atividade que mais ataca a Amazônia é o gado, responsável por 70% do desmatamento. Vamos dar licenças mais ágeis e mais rigorosas e ela sabe que derrubar a floresta para o gado não agrega ao PIB, não faz do Brasil um país mais desenvolvido e justo. Consegui um pacto com a Dilma e com o presidente Lula ¿ não vamos permitir que a Amazônia vire um pasto. A relação era um pouco difícil na gestão anterior, já que a Marina a criticava por não liberar crédito para a manutenção e para novos parques. E a ministra reclamava da demora nos licenciamentos do PAC. Com a proposta de agilizá-los, porém com rigor, conquistei a amizade da Dilma. O licenciamento é um instrumento de defesa do ecossistema e da vida, pode ser feito em seis meses e ser rigoroso. Não serei o válvula presa do PAC nem o carimbador de licenças sem critério. Vou à Alemanha no dia 29 para trazer 150 milhões de euros para os parques numa nova estratégia: instalá-los mais perto da linha do desmatamento para serem um anteparo. Os discursos desenvolvimentista e ecológico podem e devem se combinar.

Como lidar com as resistências e com o conflito de interesses nessa área?

¿ Com diálogo. No Rio, abri a Comissão estadual de controle ambiental (Ceca) para universitários, empresários e prefeituras. Consegui emitir 2 mil licenças em um ano, um recorde, mas com rigor. Fiz o mesmo com a Câmara de Compensação Ambiental. Estamos arrecadando milhões para as unidades de conservação. Então estou mostrando que sou bom de diálogo e isso não quer dizer não ter firmeza. Quando um empresário participa de uma discussão sobre licenciamento, ele se compromete. Em Brasília não era assim, vou abrir lá também, fazer o mesmo a nível nacional. A mão é dura e pesada, mas é rápida, sem burocracia. Vamos pedir urgência para regulamentar o artigo 23 da Constituição, que dá funções específicas para cada ente federativo, que tipo de licenciamento é licenciado pela União, pelo Estado e pelo município. Queremos votar isso até julho. Dá para resolver conflitos entre os interessados em energia, água, economia e ambiente.