O Estado de S. Paulo, n. 48020, 08/04/2025. Economia & Negócios, p. B2
Economistas temem retrocesso do PIB mundial com tarifaço
Luiz Guilherme Gerbelli
O choque tarifário provocado por Donald Trump abalou a corrente de comércio no mundo e aumentou a incerteza na economia global. Na leitura dos analistas, as medidas adotadas pelo presidente dos Estados Unidos aumentam o risco de a economia americana enfrentar uma recessão, um cenário que certamente afetaria o desempenho econômico de todo o mundo.
O tamanho do estrago ainda é difícil de ser mensurado pelos economistas, mas já é possível dizer que os investimentos e a cadeia global de negócios estão abalados e que há uma piora na perspectiva de médio e longo prazos da economia global.
Num relatório publicado na noite de domingo, economistas do Goldman Sachs aumentaram de 35% para 45% a probabilidade de recessão nos EUA nos próximos 12 meses. “Estamos (...) elevando a probabilidade de recessão nos próximos 12 meses de 35% para 45%, após um forte aperto nas condições financeiras, boicotes de consumidores estrangeiros e um aumento contínuo na incerteza em relação à política econômica, fatores que devem reduzir os investimentos de capital mais do que havíamos assumido anteriormente”, escreveram os economistas do banco.
A sacudida de Trump na economia global já era esperada desde a eleição presidencial do ano passado e se consolidou na última quarta-feira, quando ele anunciou uma taxa mínima de 10% sobre produtos de todos os parceiros comerciais, bem como tarifas “recíprocas” de até 49% a 60 outros países.
No desenho apresentado por Trump, o Brasil entrou na tarifa mínima de 10% (em vigor desde sábado). As tarifas recíprocas para a China serão de 34% (além dos 20% já anunciados anteriormente), enquanto os produtos da União Europeia serão taxados em 20%. Para o Japão, Coreia do Sul e Índia, as sobretaxas serão de 24%, 25% e 26%, respectivamente. Essas taxas passam a vigorar amanhã.
“É um cenário agressivo de tarifação, e o mundo está com pouca boa vontade com os Estados Unidos, tendo essa ideia de retaliação”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “O aumento de incerteza acaba afetando a percepção de consumidores e investidores. Quem vai consumir com intensidade? Ou investir com intensidade?”, questiona.
“Os impactos mudam todo dia porque começamos a ver respostas de outros países”, diz Marcela Rocha, economistachefe na Principal Asset Management no Brasil, fazendo referência à decisão da China de retaliar os EUA. “Quando analisamos as direções das tarifas anunciadas e as retaliações, especialmente da China, o que vemos é que o impacto para os Estados Unidos pode ser de uma combinação de estagflação.”
ANTECEDENTE. A guerra comercial detonada por Trump ainda em seu primeiro mandato ajuda a dimensionar qual pode ser o tamanho do atual choque tarifário para a economia global e o Brasil. De 2018 a 2019, as tarifas impostas por Trump levaram o PIB global a desacelerar de 3,6% para 2,9%, lembra Alessandra Ribeiro, sócia e diretora de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria.
“Houve uma queda importante de 0,7 ( ponto porcentual), e isso tirou 0,2 ponto de porcentagem do PIB brasileiro”, afirma Alessandra. “Nos momentos em que a economia global desacelera, o Brasil desacelera junto. É muito correlato.”
Se essa magnitude de redução do PIB se repetir agora, o crescimento econômico global deve cair dos 3,2% para algo próximo de 2,5%, segundo Alessandra. “Já estávamos num cenário de crescimento mais baixo. Um crescimento de 2,5% para a economia é bem ruim.”
Para a economia brasileira, por ora os analistas ainda trabalham com um avanço do PIB próximo de 2% em 2025 – depois de 3,4% no ano passado. A leitura é de que a tarifas de Trump devem prejudicar mais a indústria, mas podem, eventualmente, beneficiar o agronegócio se o País reforçar os seus laços com a China ou se aproximar de outros países. “Num primeiro momento, o País tende a ter uma exportação maior, especialmente de soja e carnes neste ano, por causa desse efeito da guerra comercial aumentada entre China e Estados Unidos”, afirma Vale. “A indústria tende a sofrer mais em termos de produção e exportação. Eu acho que esse caminho está consolidado, infelizmente. As commodities agrícolas tendem a ter um desempenho melhor.”
Há também sempre a dúvida se o governo não vai lançar mão de novas medidas para estimular a economia. “No curto prazo, você segura o impacto negativo, mas a conta vem, porque tudo isso se dá à custa de um fiscal mais complicado” afirma Alessandra. •